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As Empresas Nacionais E A Política Externa Brasileira Para A América Do Sul Durante O Governo Lula

As Empresas Nacionais e a Política Externa Brasileira para a América do Sul durante o Governo Lula

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  1 As Empresas Nacionais e a Política Externa Brasileira para América do SulDurante o Governo Lula Robson Coelho Cardoch Valdez 1  Resumo Este artigo propõe-se a analisar a relação do empresariado nacional e o Estado brasileiro no âmbito da política externa do Governo Lula. Primeiramente, o trabalho apresentaa construção do aparato institucional de comércio exterior brasileiro  –  cenário principal emque se dá a relação estado/empresas. Após a construção desse pano de fundo, busca-semostrar os esforços de diálogo entre o Estado e setor privado nacional desde a década denoventa até o governo do Presidente Lula; a relação do Estado com empresariado nacional e o papel do BNDES como articulador pragmático dos interesses do Governo Lula e de empresas brasileiras. Por fim, a pesquisa estuda a pertinência da América do Sul como palco dosinteresses brasileiros estatais e empresarias, assim como o desenvolvimento da presença doBNDES na região dentro do processo de internacionalização da economia nacional. Palavras-chave: governo Lula, política externa, BNDES, empresariado nacional.  Introdução 2   Durante o Governo do Presidente Lula, a política externa do país para a América doSul contemplou os interesses de um grupo seleto de grandes empresas nacionais querespondem por grande parte do comércio exterior brasileiro. Essa relação do Estado comgrandes empresas nacionais deu-se, principalmente, por meio do BNDES (Banco Nacional deDesenvolvimento Econômico e Social).Ao iniciar seu governo, a política externa do Brasil já se encontrava, de certa forma,comprometida com projetos de integração política e econômica que vinham sendo trabalhadosanteriormente. O MERCOSUL, apesar de suas crises cíclicas, consolidou-se, ao longo dadécada de noventa e início do novo milênio, como ponta de lança, do ponto-de-vista brasileiro, para a integração com o restante do continente por meio de sua aproximação com a 1 Mestre em Relações Internacionais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul  –  [email protected] 2 Este artigo é extensivamente baseado na dissertação de mestrado do autor, apresentada em 2011 ao Programade pós-graduação em Relações Internacionais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul  –  UFRGS,intitulada  A Internacionalização do BNDES no Governo Lula.    2Comunidade Andina de Nações. Assim, dentro desse contexto de aproximação com ocontinente sul-americano, dentre vários projetos integracionistas em curso, projetos de infra-estrutura na região passaram a ser cogitados como forma de integrar fisicamente umcontinente dividido por grandes barreiras naturais como cordilheiras, florestas e rios. Essaintegração física visava não somente o incremento comercial na região como também ointercambio cultural entre os povos da América do Sul.Esses desdobramentos, que adentraram os anos 2000, inseriram uma nova dinâmicanos processos de integração continental, criando formas de cooperação para o Brasil, como, por exemplo, o envolvimento do BNDES e empresas nacionais no financiamento e execuçãodos projetos de infra-estrutura no âmbito do que ficou conhecido como Iniciativa paraIntegração da Infra-Estrutura Regional Sul-Americana - IIRSA (PECEQUILO, 2009, p. 244).Essa nova dinâmica das relações do Brasil com a América do sul estimulou a relação doEstado e de segmentos do empresariado nacional na busca de uma estratégia comum deinserção internacional que contemplasse interesses mútuos. Assim, a relação Estado/empresasnacionais tem buscado a projeção internacional do país por meio da internacionalização daeconomia nacional a partir da América do Sul.Dessa forma, este artigo busca analisar a relação do empresariado nacional e o Estado brasileiro no âmbito da política externa do Governo Lula para a América do sul. Além dessaintrodução e de sua conclusão, este trabalho desenvolve-se em quatro partes. Na primeira parte, faz-se uma análise da estruturação do aparato institucional docomércio exterior brasileiro como forma de analisar o cenário principal em que se dá a relaçãoentre o Estado e o empresariado nacional no que se refere aos interesses de ambos em temasda política externa. Na segunda parte, busca-se mostrar os esforços de diálogo entre o Estadoe setor privado nacional da década de noventa até o governo do Presidente Lula. Em seguida,na terceira parte, onde o foco da pesquisa concentra-se especificamente no período dogoverno Lula, o trabalho analisa a relação do Estado com empresariado nacional e o papel doBNDES como articulador pragmático dos interesses do Governo Lula e de empresas brasileiras. Por fim, na quarta parte, o trabalho apresenta a pertinência da América do Sulcomo palco dos interesses brasileiros estatais e empresarias, assim como o desenvolvimentoda presença do BNDES na região dentro do processo de internacionalização da economianacional.  3 1. O Distanciamento Estado/Empresas na Consolidação da Estrutura do ComércioExterior Brasileiro Da década de cinqüenta até a década de noventa, a implementação da política decomércio exterior do Brasil era responsabilidade do Banco do Brasil, ficando a seu cargo aelaboração e implementação de tarifas de importação, subsídios e financiamentos para asexportações, assim como a instituição de canais de comunicação entre os atores envolvidos nocomércio exterior   –  Ministério das Relações Exteriores, Ministros da Fazenda, setor privado, presidência da República, etc. Desta forma a CACEX, (Carteira de Comércio Exterior doBanco do Brasil) que em meados da década de noventa ganharia autonomia sob novoacrônimo  –  CAMEX (Câmara de Comércio Exterior) consolidou-se como principal órgãoestatal da política comercial internacional do Brasil. A evolução deste órgão institucional docomércio internacional do Brasil sofreu mudanças na medida em que os governos as viamcomo necessárias aos seus objetivos de política externa e interna.A CACEX- foi criada em 1953 no governo Vargas em substituição à antiga carteira deexportação e importação do Banco do Brasil. Dentre suas atribuições estavam olicenciamento, o financiamento e a produção estatística de dados acerca do comércio exterior  brasileiro. A CACEX manteve-se como carteira do Banco do Brasil e subordinada aoMinistério da Fazenda até 1966 quando foi transformada em secretaria vinculada aoMinistério da Indústria e Comércio.Como instituição pública, a CACEX administrava as medidas de apoio e promoçãodas exportações brasileiras e de restrição às importações dentro do modelo desenvolvimentistada ISI (industrialização por substituição de importações). Desta forma, para executar suasfunções dispunha de recursos próprios e, até mesmo, operava no mercado internacional por meio de sua trading company, a Cobec. A relação desta instituição com o setor exportador sedava por ação setorial.As negociações comerciais, bilaterais ou multilaterais, eram acompanhadas pelossetores interessados. Havia, assim, por meio da CACEX, um elo de comunicação entre o Estado e o setor privado da economia, em que, “através de uma relação tutelar com os interesses privados, a CACEX detinha o poder de arbitrar entre interesses dive rgentes.” (VEIGA; IGLESIAS, 2002, p.6).  4 No governo Collor, funções de promoção do comércio exterior foram destinadas a umsuper ministério (Ministério da Economia Fazenda e Planejamento - que englobava os antigosministérios da Fazenda, Planejamento, Indústria e Comércio). Assim, em meio a medidas deliberalização comercial e após a perda de funções para o Ministério da Economia Fazenda ePlanejamento, a CACEX foi desativada. Porém em 1992, o governo Itamar Franco devolveuas atribuições pertinentes ao comércio exterior ao Ministério da Indústria Comércio e Turismo(MICT), sendo que os antigos Departamentos de Indústria e Comércio (DIC) e de ComércioExterior (DECEX) haviam sido transformados em secretarias. Como forma de centralizar osinstrumentos institucionais de promoção do comércio exterior brasileiro, foi criada em 1995,no governo FHC (1995-2002), a Câmara de Comércio Exterior (CAMEX)  –  órgão consultivointerministerial da Presidência da República.A CAMEX era, srcinalmente, composta pelos Ministros Chefe da Casa Civil(presidente), das Relações Exteriores, da Fazenda, Ministro do Planejamento e Orçamento, daIndústria, do Comércio e do Turismo, da Agricultura, Abastecimento e Reforma Agrária e oPresidente do Banco Central, podendo, ainda, ser convidados a participar das reuniõesrepresentantes de outros órgãos do governo. Atualmente a CAMEX reúne os Ministérios doDesenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior; da Fazenda; do Planejamento, Orçamento eGestão; das Relações Exteriores; da Agricultura, Pecuária e Abastecimento; a Casa Civil daPresidência da República e o Ministério do Desenvolvimento Agrário, que passou a integrá-ladesde 2005. De acordo com o Decreto nº 4.732 de julho de 2003, a CAMEX, do Conselho deGoverno, “ tem por objetivo a formulação, adoção, implementação e coordenação de políticase atividades relativas ao comérc io exterior de bens e serviços, incluindo o turismo” (DECRETO, 2003). Assim, é de responsabilidade da CAMEX a consecução dos objetivos da política de comércio exterior do Brasil. No governo Lula, a CAMEX passou por mudançasem sua legislação para dar agilidade às novas demandas pertinentes aos temas do comércioexterior brasileiro.Percebe-se, então, que no decorrer de mais de quatro décadas, os temas referentes àelaboração da política de comércio exterior do Brasil gravitaram em torno do Ministério doDesenvolvimento Indústria e Comércio (MDIC). Independentemente das mudanças ocorridasneste período, quando por diversas vezes mudaram as siglas denominadoras do campo deação deste ministério, o MDIC consolidou-se como o órgão executor da política comercial brasileira. No entanto, vale ressaltar que o Ministério da Fazenda e, principalmente o das  5Relações Exteriores, contribuem com pessoal qualificado nas funções de negociação e promoção do comércio internacional do país. Esta cooperação se deve, principalmente, àvinculação destes ministérios às secretarias e demais agências do comércio exterior brasileiro,que estão de uma forma ou de outra, relacionadas com o atual MDIC.O MDIC acumulou funções relacionadas ao comércio exterior do Brasil ao longo desua existência. Hoje ele concentra as atividades da Secretaria de Comércio Exterior (SECEX),Agência de Promoção das Exportações do Brasil (APEX) e seu Ministro é o presidente daCAMEX. Além destas secretarias e seus respectivos departamentos, encontram-se vinculadosao MDIC o Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES), principal instituiçãofinanciadora da inserção comercial brasileira nos governos Fernando Henrique Cardoso eLula. Assim, a partir de meados da década de noventa o BNDES passa a gerir instrumentosrecém criados para fomentar as exportações e a inserção comercial do Brasil fazendo uso doaparato institucional de comércio exterior que vinha se consolidando desde o segundomandato do Presidente FHC.A evolução dos organismos oficiais do país obedeceu estritamente às políticascomerciais de cada governo. Dessa forma, dentro deste cenário de reestruturação do comércioexterior do Brasil, é importante ressaltar, porém, que estas instituições mantiveram umvínculo direto com o Ministério do Desenvolvimento Indústria e Comércio e uma baixa permeabilidade desse aparato institucional às tentativas de ações coordenadas do setor empresarial brasileiro em relação aos temas de seu interesse na agenda externa do país. 2. As Estratégias de Diálogo Estado/Empresas Durante os anos noventa, o empresariado nacional experimentou algumas iniciativasque visavam ao estabelecimento do diálogo entre empresários e Estado em temas pertinentesao comércio exterior e à política externa do Brasil. Apesar de pontuais, esses movimentos deaproximação entre ambas as partes contribuíram para uma abertura, ainda que pequena, daestrutura burocrática do Poder Executivo na condução da política externa brasileira àsdemandas do empresariado nacional. Nos governos Collor e Itamar Franco, constatou-se o choque de competitividade nasrelações do setor privado com a economia mundial como conseqüência da abertura daeconomia nacional no início daquela década. Levando-se em consideração a imposição de