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Cerâmica Estampilhada Do Abrigo Da Pena D'água (torres Novas): Contexto, Cronologia E Breve Enquadramento Regional

Cerâmica estampilhada do Abrigo da Pena d'Água (Torres Novas): contexto, cronologia e breve enquadramento regional

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   CerâmiCa estampilhada do abrigoda pena d’Água (torres novas):Contexto, Cronologia e breveenquadramento regional  António Faustino Carvalho  ac This paper presents the single Iron Age stamped potsherd recovered during the archaeologicalexcavations that took place in Pena d’Água rock shelter (Torres Novas). This find, added tochronometric evidence recently obtained and field data from systematic survey projects, is used tobriefly discuss some general aspects of the Iron Age settlement in the region.  Em meados da década de 170, Teresa Júdice Gamito escrevia, em colaboraçãocom José Morais Arnaud, um artigo nas páginas d’ O Arqueólogo Português sobreas cerâmicas estampilhadas da Idade do Ferro do sul de Portugal, a propósito dosachados em Cabeça de Vaiamonte (Monforte), que se viria a revelar um trabalhofundamental para a questão (Arnaud e Gamito, 174/77). Com efeito, emboraa própria autora tivesse retomado noutras ocasiões o tratamento deste temaparticular (por exemplo, Gamito, 188, 16b), aquele primeiro artigo constitui-se até hoje como uma referência quase obrigatória, sendo abundantemente citado  10 em obras recentes sobre a Idade do Ferro e a romanização.No artigo referido, são desenvolvidas algumas considerações gerais em tornode este tipo cerâmico particular, assim como uma descrição detalhada das suastecnologias de fabrico e um primeiro inventário tipológico dos temas decorativosobtidos através da impressão de estampilhas. Particular relevância teve tambéma determinação da cronologia destas peças, o levantamento das ocorrênciasentão conhecidas na bibliografia e, consequentemente, das áreas geográficas dedistribuição. É para estes últimos aspectos que o presente texto pretende oferecernovos elementos, partindo dos resultados ainda em grande parte inéditos obtidosna escavação do Abrigo da Pena d’Água, em Torres Novas. 1. o a  p ’Á: c  c  cc  Este sítio arqueológico é um antigo abrigo sob rocha, cuja pala terá caído há cercade dois mil anos, localizado no sítio chamado Pena d’Água (Fig. 1), por se tratar F 1  Abrigo da Pena d’Água: troço do Arrife da Serra d’Aire onde se implanta o sítio arqueológico.  11 de um troço da escarpa de falha que delimita o sopé virado a nascente da Serrad’Aire onde existe, pelo menos, uma exsurgência. Em termos administrativos, aPena d’Água situa-se na freguesia de Chancelaria, junto à povoação de Rexaldia.Tendo sido descoberto casualmente em 12, aquando da tentativa de localizaçãoexacta da referida exsurgência para fins espeleológicos, este sítio viria a serescavado ao longo de oito curtas campanhas de escavação (Fig. 2), que tiveramlugar entre aquele ano e 2000, apenas com uma interrupção em 16. Destasescavações arqueológicas têm vindo a ser publicados diversos trabalhos onde,de forma mais ou menos desenvolvida, se dão conta dos resultados obtidos,sobretudo no que respeita às suas ocupações pré-históricas. Uma análise globaldo registo arqueológico da Pena d’Água foi no entanto já publicada, sendodescrita a estratigrafia, as correspondentes fases de ocupação, e apresentada umacaracterização sumária das mesmas (Carvalho, 18). À data da publicação referida,ainda não havia sido recolhido nenhum fragmento de cerâmica estampilhadanem obtida qualquer datação absoluta consentânea com a Idade do Ferro, razãoque está na base da não identificação explícita de uma ocupação atribuível a este F 2  Abrigo da Pena d’Água: aspecto dos trabalhos de escavação arqueológica.  12 período. Portanto, foi só nas campanhas de escavação subsequentes à publicaçãodaquele estudo que se recolheram elementos que, articulados com as observaçõesanteriores, permitiram a conclusão de se estar, essencialmente na designadacamada B, perante um nível arqueológico da Idade do Ferro.Segundo os dados publicados (Carvalho, 18), a camada B, que está imediatamentesubjacente aos blocos e sedimentos acumulados aquando a após o derrube da palado abrigo (camada A), pode ser descrita como sendo formada por uma cascalheirade blocos de dimensões em torno dos 10-15 cm, embalados numa matriz areno-argilosa solta, de cores acinzentadas (junto à parede do abrigo) e castanho-avermelhadas (na parte exterior). Um aspecto significativo é o facto de, na parteexterior, a camada se apresentar desprovida da sua componente matricial e revelar-se principalmente pelo seu esqueleto, terminando em bisel. Este fenómeno prende-se com o recuo progressivo da pala do abrigo antes do seu colapso definitivo, o quesrcinou o truncamento das camadas superficiais do depósito através da exposiçãoa águas pluviais, e fez-se sentir até às camadas C e Da, subjacentes (Fig. 3). Em termos arqueológicos, a camada B configurara-se desde logo como umpalimpsesto. De acordo com a estruturação tipológica e tecnológica da cerâmica entãoensaiada (Carvalho, 18: 53), foi possível identificar quatro conjuntos distintos: F 3  Abrigo da Pena d’Água: corte estratigráfico, com indicação da proveniência das amostrasde carvões da camada Da submetidas a datação absoluta (para calibrações, ver Quadro): [1] Wk-215(2410 ± 5 BP); [2] Wk-742 (2428 ± 56 BP).  13 > “Conjunto 1”. Composto por peças de pastas avermelhadas e paredes finas,de fabrico manual, de morfologias simples com fundos redondos, por vezescom carenas. Trata-se de testemunhos da última ocupação neolítica do local,na fase final deste período. Não se encontra datada radiometricamente.> “Conjunto 2”. Composto por peças de características muito homogéneas,com pastas castanho-amareladas e paredes de c. 13 mm de espessura,fabricadas a torno e com inúmeros desengordurantes grosseiros. Trata-se deum conjunto muito numeroso, representado sobretudo por fragmentos debojo. Em termos morfológicos, com efeito, identificaram-se algumas basesplanas e colos estrangulados com bordos exvertidos. Ao que tudo indica,este conjunto representa vários vasos de armazenamento, um dos quais teráaliás sido deliberadamente enterrado, perturbando dessa forma os estratosarqueológicos subjacentes.> “Conjunto 3”. Composto por um número muito pequeno de fragmentoscom superfícies de cor castanho-acinzentada, fabricados a torno eincluindo ainda uma base plana. Apresenta sinais de exposição ao fogo e,sintomaticamente, a maior parte das peças encontrava-se no interior de umalareira localizada junto à parede do abrigo, cujos carvões foram datados daépoca romana (ver abaixo), facto que determina a cronologia deste conjunto.> “Conjunto 4”. Composto por peças com superfícies e pastas castanho-enegrecidas, fabricadas à mão, denunciando formas de pequenas dimensõescom colos muito pronunciados. As superfícies exteriores dos fragmentosencontram-se cuidadosamente brunidas. A determinação da cronologia dos conjuntos 1 e 3 não oferece dúvidas. Porém,à falta de outros elementos, o “Conjunto 2” havia sido atribuído à época romanacom base na sua dispersão espacial e o “Conjunto 4”, com base na sua tipologia,foi atribuído à Idade do Bronze final. Os novos elementos desde então reunidospermitem hoje concluir que a interpretação mais parcimoniosa para ambos é ade se tratarem de recipientes cerâmicos da Idade do Ferro. Com efeito:> As características tecnológicas e tipológicas do “Conjunto 4”, se bemque comuns no Bronze final regional, ocorrem também em vários sítiosna Idade do Ferro, nomeadamente no interior do maciço calcário e na