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Direito E Economia Robert Cooter-2.docx

DIREITO E ECONOMIA, Robert Cooter & Thomas Ulen, Ed. Bookman Capítulo 1 – Introdução a Direito e Economia Para o estudo racional do direito, o homem da letra gótica pode ser o homem do presente, mas o homemdo futuro é o homem da estatística e o mestre da economia. [...] Aprendemos que para termos qualquercoisa temos de abrir mão de alguma outra coisa e aprendemos a contrapor a vantagem que ganhamos àoutra vantagem que perdemos, e a saber o que estamos fazendo quando seleci

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  1 DIREITO E ECONOMIA, Robert Cooter & Thomas Ulen, Ed. Bookman Capítulo 1  –  Introdução a Direito e Economia Para o estudo racional do direito, o homem da letra gótica pode ser o homem do  presente, mas o homemdo futuro é o homem da estatística e o mestre da economia. [...]  Aprendemos que para termos qualquercoisa temos de abrir mão de alguma outra coisa e aprendemos a contrapor a vantagem que ganhamos àoutra vantagem que perdemos, e a saber o que estamos fazendo quando selecionamos. Oliver Wendell Holmes, The Path of the Law  10 HARV. L. REV. 457, 469, 474 (1897) 1 . Para mim, o aspecto mais interessante do movimento da associação entre direito e economia tem sidosua aspiração de colocar o estudo do direito sobre uma base científica, com uma teoria coerente,hipóteses precisas deduzidas da teoria e testes empíricos das hipóteses. O direito é uma instituiçãosocial de enorme antiguidade e importância, e não vejo razão por que ele não devesse ser acessível aoestudo científico.  A economia é a mais avançada das ciências sociais, e o sistema judiciário contémmuitos  paralelos com os sistemas que os economistas têm estudado com êxito e se sobrepõe a eles. Juiz Richard A. Posner, IN: MICHAEL FAURE &ROGER VAN DEN BERG, EDS.,ESSAYS IN LAW AND ECONOMICS (1989).  Até recentemente, o direito restringia o uso da economia às áreas das leis antitruste, dossetores regulamentados, dos impostos e da determinação de indenizações monetárias.O direito precisava da economia nessas áreas para responder perguntas como estas:“Qual é a fatia de mercado do acusado?”, “O controle de preços do seguro de automóveisvai reduzir sua disponibilidade?”, “Quem arca realmente com o ônus do imposto sobre osganhos de capital?”, “Quanta renda futura os filhos perderam por causa da morte da mãe?”.  Essa interação limitada mudou drasticamente a partir do início da década de 1960,quando a análise econômica do direito se expandiu, entrando em áreas mais tradicionaisdo direito, como propriedade, contratos, delitos civis, direito e processo penal e direitoconstitucional 2 . Esse novo uso da economia no direito fazia perguntas como estas:  “Apropriedade privada do espect ro eletromagnético vai incentivar seu uso eficiente?”, “Querecurso jurídico para a infração contratual vai causar uma formação eficiente de promessase a confiança nelas?”, “As empresas adotam precauções excessivas ou insuficientesquando a lei as torna estritamente responsáveis por danos causados aos consumidores?”,“Penas mais duras vão prevenir crimes violentos?”, “Dividir o legislativo em duas casasvai aumentar ou diminuir o poder discricionário dos tribunais?”.   1 Nosso estilo de citação é uma variante do estilo de citações jurídicas de uso mais comum nos Estados Unidos. O sentido da citação é o seguinte: o autor do artigo do qual foi tirada a citação é Oliver Wendell Holmes; o título do artigo é The Path of the Law  ; e o artigo pode ser encontrado no volume 10 da Harvard Law Review, publicado em 1897, com início na página 457. O material citado está nas páginas 469 e 474 desse artigo. 2 Diz-se que o campo moderno teve início com a publicação de dois artigos que são tidos como marcos: Ronald H. Coase, The Problem of Social Cost  , 3 J. L. & ECON. 1 (1960) e Guido Calabresi, Some Thoughts on Risk Distribution and the Law of Torts , 70 YALE L. J. 499 (1961).  2  A economia mudou a natureza da ciência jurídica, a compreensão comum de regrase instituições jurídicas e até a prática do direito. Como prova disso, veja os seguintesindicadores do impacto da economia sobre o direito. Em 1990, menos um economistafazia parte do corpo docente de cada uma das principais faculdades de direito na Américado Norte e de algumas da Europa ocidental. Programas de pós-graduação em conjunto(Ph.D. em economia e J.D. em direito) existem em muitas universidades proeminentes.As revistas de direito publicam muitos artigos que usam a abordagem econômica e hádiversas revistas científicas dedicadas exclusivamente a esse campo 3 . Recentemente, umestudo exaustivo constatou que os artigos que usam a abordagem econômica são maiscitados nas principais revistas científicas norte-americanas do que os artigos que usamqualquer outra abordagem 4 . A maioria dos cursos de direito nos Estados Unidos têm agoraao menos um breve resumo da análise econômica do direito na maioria das cadeiras dasáreas substantivas. Algumas faculdades têm um breve curso especial para todos os alunosdo primeiro ano com uma introdução ao direito e à economia; e muitas áreas substantivasdo direito, como o direito das sociedades por ações, são agora ensinadas principalmente apartir de uma perspectiva da associação entre direito e economia 5 . No final da década de 1990, havia organizações profissionais de direito e economia naÁsia, na Europa, no Canadá, nos Estados Unidos, na América Latina e na Austrália. Estecampo recebeu o mais alto nível de reconhecimento em 1991 e 1992, quando PrêmiosNobel de Economia 6  sucessivos foram dados a economistas que ajudaram a fundar a análiseeconômica do direito  –  Ronald Coase e Gary Becker. Resumindo, o professor BruceAckerman, da Faculdade de Direito de Yale, descreveu a abordagem econômica do direitocomo “o mais importante desenvolvimento na ciência jurídica do século 20”.  O impacto do novo campo vai além das universidades, estendendo-se à prática dodireito e à implementação de políticas públicas. A economia ofereceu os fundamentosintelectuais para o movimento de desregulamentação na década de 1970, que resultou emmudanças drásticas nos Estados Unidos, como, p. ex., a dissolução de entidades regulatóriasque estabeleciam os preços e as rotas para aviões, caminhões e ferrovias, e agora estáajudando a examinar a desregulamentação  –  anteriormente inconcebível  –  da geração deenergia elétrica. A economia também constituiu a força intelectual por trás da revoluçãoocorrida no direito antitruste dos Estados Unidos nos anos 1970 e 1980, e atualmente estádesempenhando uma função semelhante na revolução antitruste que está apenas começandona União Europeia. Numa outra área de políticas públicas, uma comissão criadapelo Congresso norte-americano em 1984 para reformar as sentenças penais nos tribunais federais usou explicitamente os resultados do direito e da economia para alcançar algunsde seus resultados.  Além disso, vários pesquisadores proeminentes da área do direito e da economia setornaram juízes federais e usam a análise econômica em seus pareceres  –  ministro 3 Por exemplo, a Journal of Law and Economics teve início em 1958; a Journal of Legal Studies em 1972; a Research inLaw and Economics , International Review of Law and Economics e Journal of Law  , Economics , and Organization nadécada de 1980; e a Journal of Empirical Legal Studies na de 2000. 4 William M. Landes & Richard A. Posner, The Influence of Economics on Law  :  A Quantitative Study, 36 J. L. & ECON. 385(1993). 5 Veja, p. ex., STEPHEN M. BAINBRIDGE, CORPORATION LAW AND ECONOMICS (2002). 6 O nome completo do Prêmio Nobel de Economia é Prêmio do Banco da Suécia em Ciências Econômicas em Memória deAlfred Nobel. O Banco Real da Suécia criou o Prêmio em 1968 para comemorar o 300º aniversário do Banco. Veja nosso site , www.cooter-ulen.com , que contém uma lista completa dos ganhadores do Prêmio Nobel e uma breve descrição de sua obra.  3 StephenBreyer, da Suprema Corte dos Estados Unidos; juiz-presidente Richard A. Posner ejuiz Frank Easterbrook, do Tribunal de Apelação da Sétima Vara; juiz Guido Calabresi,do Tribunal de Apelação da Segunda Vara; juiz Douglas Ginsburg e ex-juiz Robert Bork,do Tribunal de Apelação da Vara do Distrito Federal; e juiz Alex Kozinski, do Tribunal deApelação da Nona Vara. I. O QUE É A ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO? Por que a análise econômica do direito teve um sucesso tão espetacular, especialmentenos Estados Unidos, mas em grau crescente também em outros países? Como os coelhosna Austrália, a ciência econômica encontrou um nicho vago na “ecologia intelectual” dodireito e o preencheu rapidamente. Para explicar o nicho, tomemos esta definição clássicada l ei: “Uma lei é uma obrigação apoiada por uma sanção estatal.”   Os legisladores muitas vezes perguntam: “Como uma sanção vai afetar o comportamento?”Por exemplo, se indenizações punitivas são impostas ao fabricante de um produtodefeituoso, o que acontecerá com a segurança e o preço do produto no futuro? Ou a criminalidadevai diminuir se os delinquentes que violam a lei pela terceira vez forem presosautomaticamente? Os juristas responderam essas perguntas em 1960 mais ou menos damesma maneira que o tinham feito 2 mil anos antes  –  consultando a intuição e quaisquerfatos que estivessem disponíveis.  A economia proporcionou uma teoria científica para prever os efeitos das sanções legais sobre o comportamento. Para os economistas, as sanções se assemelham aos preços,e, presumivelmente, as pessoas reagem às sanções, em grande parte, da mesma maneira que reagem aos preços. As pessoas reagem a preços mais altos consumindo menos do produto mais caro; assim, supostamente, elas reagem a sanções legais mais duras praticando menos da atividade sancionada. A economia tem teorias matematicamente precisas (teoriado preço e teoria dos jogos) e métodos empiricamente sólidos (estatística e econometria)de análise dos efeitos dos preços sobre o comportamento. Vejamos um exemplo. Suponhamos que um fabricante saiba que seu produto irá, àsvezes, ferir os consumidores. Até que ponto esse fabricante tornará o produto seguro?Para uma empresa que queira maximizar os lucros, a resposta depende de dois custos:primeiro, dos custos efetivos para tornar o produto mais seguro, que, por sua vez, dependemde fatos relativos ao projeto e à fabricação do produto e dos custos da emissão deadvertências aos usuários; e do “preço implícito” de ferimentos causados aos consumidorespor meio da responsabilidade jurídica do fabricante. A responsabilidade é uma sançãoimposta por danos causados a outros. O produtor precisará da ajuda de advogados parafazer uma estimativa desse preço implícito. Depois de obter as informações necessárias,ele irá comparar o custo da segurança e o custo implícito de acidentes. Para maximizar oslucros, o produtor irá ajustar a segurança até que o custo efetivo da segurança adicionalseja igual ao preço implícito de acidentes adicionais. Generalizando, podemos dizer que a economia fornece uma teoria comportamental para prever como as pessoas reagem às leis. Essa teoria, baseada em como as pessoas reagem a incentivos, suplanta a intuição da mesma maneira como a ciência suplanta o bom senso. Um dos mais famosos ensaios sobre direito e economia tem o subtítulo “Uma  v ista da catedral” 7 . A metáfora retrata a análise econômica como uma vista para 7 Guido Calabresi & Douglas Melamed, Property Rules , Liability Rules , and Inalienability  : One View of the Cathedral  , 85 HARV. L. REV. 1089 (1972).  4 olhar umobjeto grande, antigo, complexo, belo, misterioso, sacro. Oferecemos outra metáfora. Asprevisões sempre orientam o direito, de modo que a ciência comportamental se assemelhaà argamassa que se encontra entre as pedras da catedral, estando em toda parte, assimcomo as pedras, e dando sustentação a cada uma delas. Neste ponto da história da ciênciasocial, a economia é a parte da ciência comportamental mais útil para o direito.  Além de uma teoria científica do comportamento, a economia fornece um padrão normativoútil para avaliar o direito e as políticas públicas. As leis não são apenas argumentosarcanos, técnicos; elas são instrumentos para atingir objetivos sociais importantes. Paraconhecer os efeitos das leis sobre esses objetivos, os juízes e outros legisladores precisamter um método para avaliar os efeitos das leis sobre valores sociais importantes. Aeconomia prevê os efeitos das políticas públicas sobre a eficiência 8 . A eficiência sempreé relevante para a definição de políticas já que é melhor atingir qualquer política dada aum custo menor do que a um custo mais alto. As autoridades públicas nunca defendem odesperdício de dinheiro. Em vez de falar de eficiência, as pessoas nas empresas geralmente falam sobre lucros.Os advogados ajudam as empresas a maximizar seus lucros. Os corpos de leis quevisam facilitar a lucratividade incluem a propriedade e os contratos, discutidos aqui, bemcomo assuntos que este livro não aborda (principalmente sociedades por ações, títulose valores mobiliários e falência). Quando uma transação comercial maximiza os lucrosde suas partes interessadas, nenhuma transação alternativa poderia aumentar os lucrosde uma parte sem diminuir os lucros de outra parte. Em termos técnicos, a transação é“Pareto eficiente” para as partes. A maximização dos lucros e a eficiência de Pareto estãoestreitamente relacionadas. Os princípios da eficiência contidos nos capítulos sobrepropriedade e contratos se aplicam diretamente à lucratividade em transações comerciais.Os advogados podem usar esses princípios da eficiência para ajudar as empresas a fazertransações mais lucrativas e para ajudar os legisladores a fazer melhores leis, de modo queas empresas prosperem.  Além de facilitar transações comerciais, o direito também restringe atividades de negócios.Os corpos de leis que restringem as atividades das empresas incluem os delitoscivis e crimes, de que este livro trata, bem como assuntos que não abordamos aqui (principalmenteregulamentação e tributação). As restrições jurídicas são necessárias para assegurarque as transações sejam voluntárias. O furto precisa ser desestimulado, assim comoo intercâmbio precisa ser incentivado. As restrições jurídicas também são necessárias paraproteger pessoas afetadas por transações que não são partes envolvidas nelas. Assim, navenda de um carro, as partes raramente levam em consideração o congestionamento oupoluição do ar adicional que essa transação fará outras sofrerem. A “eficiência social” deuma transação comercial diz respeito a todos os afetados por ela, e não apenas a suas partes.Um bom sistema jurídico mantém a lucratividade das empresas e o bem-estar do povoalinhados, de modo que as pessoas que buscam lucros também beneficiem o público.(MÃO IMVISÍVEL) Neste tocante, todos os sistemas jurídicos reais têm deficiências graves que os princípioscontidos neste livro podem identificar e corrigir.  A prática nos grandes escritórios de advocacia se divide em transações, regulamentaçãoe litígio. As “transações” designam os negócios, e a “regulamentação” se referea restrições jurídicas. O litígio ou processo judicial resolve disputas por meio de  julgamentos,que custam muito. As transações realizadas com cuidado e o cumprimento 8 Essa noção de eficiência é exposta no Capítulo 2.