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ética Medieval

Ética Medieval

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  Síntese da ética medieval: Agostinho e Tomás Lenilson Oliveira Paula Silva 1  Walisson Rodrigues Freitas 1   1 INTRODUÇÃO Com o fim do Império Helênico, sob o comando de Alexandre Magno, emerge no ocidente outro grande império que colonizaria parte do continente africano e europeu e a Ásia Menor. Este império é o Império Romano, que durou cinco séculos com uma hegemonia impecável.  No ano um desta era, o nascimento de um menino mudaria o rumo do curso histórico da humanidade. Tendo completado os tempos, o menino da promessa, que Deus prometera aos judeus, anunciado pelos profetas antigos, nasce e recebe o nome de Jesus, o filho de Maria e José, o carpinteiro. Ele passou a vida nesta terra fazendo o  bem, mas anunciava um reino, que não era deste mundo, se dizia ser um com Deus,  proclamava a Boa Nova da salvação e o que se falava dele era que ele era o Cordeiro de Deus que redimiria o povo judeu. Os doutores da lei e alguns judeus não acreditaram nas suas palavras e levaram-no para ser julgado, por blasfêmia e crime político, pelas autoridades romanas. Foi julgado e condenado a morte. Crucificou-o com mais dois ladrões, sepultou-o e no terceiro dia ele ressuscitou dentre os mortos e apareceu aos seus discípulos para que eles acreditassem nas promessas feitas por Ele. Os discípulos foram enviados para anunciar essa Boa Nova. Nasce aqui uma nova ética, um novo modo de pensamento, o descolamento do centro gravitacional que se torna agora Jesus, o Cristo, o Messias, Deus. Na ética, a ideia de um Deus que é Pai, Jesus Cristo que é seu Filho Primogênito, e que por sua causa torna o homem  participante da filiação divina, muda a órbita dos valores. Deus se torna próximo do homem, assume sua humanidade. Porque a partir de então todos os homens são irmãos, mesmo os inimigos. Todos caminham por um itinerário para a salvação, o Reino de Deus, que sozinho não irão, mas em comunidade, em comunhão com Deus e com os irmãos. Aqui também a humildade se torna o alicerce para todas as virtudes, porque todos visam o mesmo bem, mas que é inalcançável sozinho. Nisso se percebe que a vida  política terrena não é tão necessária assim, mas a vivência das bem aventuranças em  busca de outro reino, o celeste. A inculturação dessa Palavra se deu de forma esplêndida e muitos se converteram ao cristianismo. Mas os que não aderiram à fé no Cristo tentaram contrapor  com outras ideias, até mesmo os cristãos começaram a interpretar as palavras de Jesus de forma errônea e muitas heresias surgiram nesses primeiros séculos. A necessidade de se fundamentar racionalmente a fé que urge se dá e com isso a tentativa de conciliar a doutrina cristã com outros pensamentos de filósofos pagãos até. Nisso nasce a filosofia cristã, que era uma amálgama de teologia e filosofia. Os primeiros séculos da era cristã se deram com a fundamentação racional da fé por meio da filosofia. Tendo como grande expoente Agostinho de Hipona, que será abordado de forma mais longa posteriormente. Com a queda do Império Romano e a aceitação do cristianismo como religião do império, outras formas de espiritualidade surge em resposta a modernização que acontecera na Igreja. E com essas novas formas de espiritualidade também surgem novas formas de viver, novas éticas. Vale destacar neste período a vida monástica,  principalmente a regra de São Bento. Com o mosteiro, novos valores morais se acentuam como: a obediência ao abade, que traz a vontade de Deus para o monge; o silêncio, como meio de conhecimento de si; a humildade, ainda como base de todos os outros valores morais; e a ascese, para o autodomínio. Além dos mosteiros as ordens mendicantes surgem com Francisco e Domingos. Elas pretendem dar uma resposta à situação da Igreja, e além dos valores trazidas pelos mosteiros agora incluem a pobreza absoluta, viver plenamente a mercê da providência divina. Com isso, surgem as ordens franciscanas e dominicanas. Dessas ordens destacam-se Boaventura e Tomás de Aquino, este que será tratado a seguir. Os séculos XII e XIII são os mais proeminentes na produção filosófica, ética, cultural cristã, e esse período é considerado o auge do período medieval. Já no século XIV, inicia o seu declínio, porque outras formas de pensamentos emergem e a dúvida, a descrença, o ceticismo, tornam-se ascendentes. E nesse espírito que se entra na Idade Média. Dado o exposto, o presente artigo tem por objetivo explanar de forma breve a ética de dois pilares da filosofia medieval: Agostinho de Hipona e Tomás de Aquino. 2 ÉTICA DE AGOSTINHO DE HIPONA  Na passagem do mundo antigo para o período medievo, tem-se o exponencial da filosofia medieval, Santo Agostinho de Hipona. Agostinho viveu entre os anos de 354 e 430, tem um processo de conversão ao cristianismo conturbada, sendo com mais de 32 anos sua adesão declarada ao cristianismo por influência de Santo Ambrósio. Após sua  adesão ao cristianismo, elaborou diversas obras, sendo um grande pensador trazendo importantes contribuições à doutrina cristã. O grande sistema de pensamento que orienta as obras agostinianas é a sua tentativa de conciliar as verdades da fé com a reflexão racional. Até hoje seus escritos são estudados e dados como muito importantes para a formação do homem atual. 1  A exposição da ética agostiniana, um marco para a elaboração de conceitos cristãos como um marco para um éthos 2  cristão de bem viver, não foi uma questão elaborada sistematicamente por Santo Agostinho, mas, porém, muito bem discorrida e elaborada por seus comentadores. 3  O s escritos agostinianos estão no limiar da “estreita  platônica, a título de exemplo, relemos nos textos agostinianos os dualismos representados entre o mundo inteligível e o sensível, o ser e o não ser, o corpo e a alma, o bem e o mal, o espírito e a matéria, entre outros.” 4  A máxima teórica que compõe toda a ética de Santo Agostinho é que o homem  precisa “crer para entender”, porque é neste conceito de fé e razão interligad as que a atividade filosófica se torna um itinerário para levar o homem à beatitude, isto significa que, o fim último da razão é a felicidade. 5  Cumpre agora elucidar por linhas gerais a ideia de beatitude, que podemos entender como o fim último do homem, ou seja, a felicidade. Deste modo, para que o homem ser inteiramente feliz, precisa que o homem   procure um bem permanente, livre de variações da sorte e das vicissitudes da vida. Ora, não podemos adquirir à nossa vontade, tampouco conservar para sempre, aquilo que é perecível e passageiro. (...), por conseguinte, aquele que ama e possui [bens sujeitos à mudança] não pode ser feliz de modo absoluto. 6   Portanto, para que o homem esteja no caminho para a beatitude e prestes a encontrar a verdadeira felicidade, deve o homem, no mundo escolher os bens que não passam e ficam para a eternidade e rejeitar os bens que estão e no mundo e, assim, sujeitos a mudanças. Deste modo, a ética agostiniana só possui sentido quando levada à dimensão de criatura e Criador, isto é, Deus e o homem. A dependência do homem ao seu criador 1  SGANZERLA, Arnor; FALABRETTI, Ericson e; BOCCA, Francisco Verardi. Ética em movimento: contribuições dos grandes mestres da filosofia. Editora Paulus, São Paulo, 2009. p. 43. 2  Do grego, éthos significa o caráter de alguém ou um conjunto de costumes instituídos por uma sociedade para manter seus membros regulados. Disto decorre-se que ser ético significa seguir o costume da cultura que se vive. 3  MATTOS, José Roberto Abreu de. Ética Agostiniana. In: Revista de Cultura Teológica, v. 19, n. 73, 2011. Disponível em: <https://revistas.pucsp.br>download> Acesso em: 6 de junho de 2017. p. 117. 4  SGANZERLA, et. al. op.cit.  2009, p. 44. 5    Idem, Ibidem. 6  MATTOS, José Roberto Abreu de. Ética Agostiniana apud   Santo Agostinho, De beata vita, II, 11. p. 124.  estabelece-se na intrínseca relação do homem que só encontra em Deus a suprema felicidade, devendo direcionar seu agir conforma os mandamentos divinos, donde  prescreve total obediência. 7  Dado que a ética agostiniana, outrora considerada neoplatônica, possui um fim último e que a conduta do homem deve ser pautada para alcançar este fim último que é a suprema felicidade que só se encontra em Deus. Faz-se necessário uma análise do amor como princípio ético em Santo Agostinho, levando em consideração que a máxima ética agostiniana passa pelo amor, sendo o amor a própria via coerente de legitimidade da beatitude. A ética agostiniana não poderia ter outro princípio se não fosse à união da criatura ao seu Criador, neste sentido que entra o amor como princípio ético, pois é  pelas ações guiadas pelo amor a Deus e ao próximo que o homem alcançará a beatitude e assim, unirá ao seu Criador. Por isso que a ética do Santo Agostinho girará em torno da ideia de que a felicidade do homem consiste em unir-se ao seu Criador, pois somente amando verdadeiramente a Deus é possível amar a si mesmo e ao próximo, tendo em vista que só desta maneira é verdadeiramente livre. 8   O amor neste caso pode ser considerado como o motor mais íntimo da vontade humana, donde se decorre a afirmação que, o ser humano é movido pelo amo. Sendo o amor uma atividade própria do ser humano, pode-se dizer que o amor tende-se a certo  bem, ou seja, do amor procede a certo bem que resulta na máxi ma agostiniana: “Ama e faze o que quisere s.” 9  No homem há uma característica que é própria de Deus que é o amor, ou seja, Deus é amor e sendo amor cria o homem para amar. Nessa ação que o homem se encontra, se realiza e se torna feliz. Porque a mesma força que o leva para o amor é a que o leva para o  bem. Assim, “o homem deve se deixar orientar pela Verdade divina e direcionar as suas motivações para o Bem, abrindo-se para a graça divina, que impulsiona e dirige a ação histórica.” 10  Sendo o amor toda a moção de ordem moral e ética do homem, tendo a vontade por motor, possuindo uma reta escolha do seres 7  MATTOS, José Roberto Abreu de. Ética Agostiniana, 2011, p. 120. 8  CAPITANIO, Caryne Abbade; COSTA, Larissa Camargo; ALVIM, Rafael da Silva e; HOGEMANN, Edna Raquel. Ética e moral em Santo Agostinho: uma análise da deontologia agostiniana com fulcro em três célebres obras do autor  –   Confissões, Livre-arbítrio e Cidade de Deus. Revista Quaestio Iuris, v. 5, n. 1. Disponível em: <https//www.e-publicacoes.uerj.br>download> Acesso em: 6 de junho de 2017. p. 132. 9  ALMEIRA, Frederico Soares de. O amor como elemento fundamental na ética de Santo Agostinho. Pensar-Revista Eletrônica da FAJE, v. 5, n. 1, 2014. Disponível em: <https//www.faje.edu.br>article>download> Acesso em: 6 de junho de 2017. p. 57.   10   SGANZERLA, Arnor; FALABRETTI, Ericson e; BOCCA, Francisco Verardi, 2009, p. 46.