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Libras - Sinais Biblicos

A Interpretação da Bíblia para a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) – Uma Reflexão Bible’s Interpreting into Brazilian Sign Language (BSL) – A Reflection Ester Correia Trancoso Barbosa Centro de Comunicação e Letras – Universidade Presbiteriana Mackenzie Rua Piauí, 143 – 01241-001 – São Paulo – SP [email protected] Resumo. Este trabalho visa incentivar a reflexão sobre a interpretação do texto bíblico para língua de sinais, considerando a importância de teorias de tradução, analisa

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    A Interpretação da Bíblia para a Língua Brasileira deSinais (LIBRAS) – Uma ReflexãoBible’s Interpreting into Brazilian Sign Language (BSL) – AReflection Ester Correia Trancoso Barbosa Centro de Comunicação e Letras – Universidade Presbiteriana MackenzieRua Piauí, 143 – 01241-001 – São Paulo – SP [email protected]  Resumo. E  ste trabalho visa incentivar a reflexão sobre a interpretação dotexto bíblico para língua de sinais, considerando a importância de teorias detradução, analisando em que medida elas podem ser aplicadas à realidadedo intérprete de língua de sinais em geral e, mais especificamente, aresponsabilidade do intérprete de LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais) natransmissão da mensagem bíblica para um público diferenciado, que deoutra maneira seria excluído devido as suas especificidades comunicativas.Para tanto, analisamos a interpretação de Marília Moraes Manhães da cartade Paulo aos Colossenses para LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais), suasescolhas de interpretação em função de seus receptores, baseando-nos nosestudos sobre língua de sinais, na formação de palavras em LIBRAS, juntamente com a teoria de Karl Simms sobre o texto Sensível, acomparação de Nida e Taber entre Correspondência Formal e EquivalênciaDinâmica e a visão Desconstrutivista de Derrida.  Palavras-Chave:  Bíblia. Interpretação. LIBRAS (Língua Brasileira de sinais).  Abstract. T  his paper aims at the reflection about interpreting the biblical text into sign languages, considering the importance of theories on translation,analyzing to what extent they can be applied to the reality of the interpreter of sign languages in general and more specifically the LIBRAS (Brazilian SignLanguage) interpreter’s responsibility in the transmission of the biblical message to a differentiated audience, which otherwise would be excluded due to their communicative specificities. Therefore, we analyze MaríliaMoraes Manhães’ interpreting of Paul’s letter to the Colossians into LIBRAS,her choices of interpreting in terms of her receptors, based ourselves on thestudies of the sign languages, the formation of words in LIBRAS, together with Karl Simms's theory on the Sensitive text, Nida and Taber’s comparisonbetween Formal Correspondence and Dynamic Equivalence and Derrida’sDesconstructive vision.  Key-Words:  Bible. Interpreting. BSL (Brasilian Sing Language)    1. A tradução bíblica no fortalecimento das línguas nacionais A comunidade surda tem alcançado, ao longo dos anos, seu espaço na sociedade.Um dos marcos dessa conquista, no Brasil, por exemplo, foi a oficialização da LIBRAS 1  como meio legal de comunicação e expressão. A partir desse momento histórico na vidados surdos 2 , muitos passos foram dados em prol de sua interação social, efetivamente,como cidadãos. A língua portuguesa, por exemplo, não tem valor superior à LIBRAS noBrasil (apesar de não poder substituir a modalidade escrita da língua portuguesa), pois jáse reconheceu que a língua brasileira de sinais, bem como as outras línguas de sinaisexistentes, é genuína e tão complexa como qualquer outra língua.Essa constatação evoca, em parte, os primórdios da prática tradutória. Sabe-secomo a disseminação do Evangelho influenciou no desenvolvimento de comunidadesque, por vezes, não possuíam sequer a própria língua registrada ortograficamente, comoé o caso de algumas tribos indígenas. Enfim, foi a tradução da Bíblia para as línguasvernáculas, que possibilitou o acesso ao conhecimento por parte das comunidadesmenos abastadas e que não dominavam as línguas “consagradas” por uma elite erudita.Em “Os tradutores na história” de Jean Delisle e Judith Woodsworth (2003), háum capítulo específico que trata justamente do trabalho do tradutor no desenvolvimentodas línguas nacionais.Entre outros exemplos que embasam esse fato, destacam-se as contribuições deMartinho Lutero que, além de seu papel eclesiástico, promoveu a formação de umalíngua literária alemã. Na África, a associação entre língua e religião contribuiu muito para a promoção das línguas locais, graças ao trabalho dos missionários envolvidos nadifusão do Evangelho, além de outros casos em que a circulação da Bíblia na línguafalada pelo povo, incentivou até a alfabetização, fortalecendo assim, o idioma nacional.Diante desses acontecimentos, nos lembramos da importância de figuras como ado abade l’Epée que preocupado com a salvação das almas dos surdos parisienses,acompanha-os na formalização de uma língua de sinais.A Bíblia em LIBRAS é um trabalho pioneiro que reforça esse protagonismo dotexto bíblico em projetos que procuram alcançar os mais diversos grupos sociais. Noentanto, a interpretação da Bíblia para uma língua de sinais, envolve processos que nemsempre se enquadram totalmente dentro das teorias desenvolvidas com base no textoescrito de uma língua de modalidade oral-auditiva 3 .  Isso ocorre pelo simples fato de que enquanto a interpretação é uma situação deconcomitância ou simultaneidade da transmissão da mensagem de uma língua de partida para uma língua de chegada, a tradução é um processo que dispõe de tempo e recursos 1 LIBRAS é uma das siglas para referir a língua de sinais: Língua Brasileira de Sinais. Esta sigla édifundida pela Federação Nacional de Educação e Integração de Surdos – FENEIS. LSB é outra sigla parareferir-se à língua brasileira de sinais: L íngua de S inais B rasileira. Esta sigla segue os padrõesinternacionais de denominação das línguas de sinais. 2 Surdos são as pessoas que se identificam enquanto surdas. 3 língua de modalidade oral-auditiva - As línguas apresentam diferentes modalidades. Uma língua falada éoral-auditiva, ou seja, utiliza a audição e a articulação através do aparelho vocal para compreender e produzir os sons que formam as palavras dessas línguas. (Quadros, 2001, p. 9).   tais como dicionários e revisor. Além disso, a diferença de modalidades entre umalíngua oral-auditiva e uma língua de modalidade visual-espacial 4 , implica, por exemplo,que um ouvinte, mesmo sem olhar para o transmissor de uma mensagem, entenda o queele diz, enquanto que a pessoa surda não.Essas são apenas algumas das questões que levantamos em nossa análise dainterpretação realizada por Marília Moraes Manhães da carta de Paulo aos Colossenses para LIBRAS, gravada em DVD no ano de 2005, questionando, basicamente, até que ponto sua preocupação em “facilitar” o entendimento das mensagens religiosas pelossurdos, não fazendo uso dos sinais adotados nas igrejas evangélicas, é positiva, já queesses sinais expressam termos “típicos” de contextos religiosos, como, “graça”,“apóstolo”, além dos nomes dos livros da Bíblia e de seus personagens que muitas vezescarregam significado mais profundo do que aqueles sinais utilizados pela intérprete. 2. LIBRAS - uma língua de verdade Baseamos nossa análise, primeiramente, nos estudos de Lucinda Brito (1995?)sobre a gramática da LIBRAS. Os estudos lingüísticos sobre as línguas de sinaisconsideram que sua gramática particular é intrinsecamente a mesma das línguas oraissendo os princípios básicos respeitados em ambas as modalidades. Um desses princípios, seguindo a linha saussuriana 5 , é o da dupla articulação, que pressupõe aexistência de unidades mínimas formadoras de unidades complexas (são as unidadesmínimas distintivas e de morfemas ou unidades mínimas de significado). Podemos dizer que as palavras da LIBRAS e do português se estruturam a partir de unidades mínimasespaciais e sonoras, respectivamente. Essas unidades são distintivas porque, quandosubstituídas por outra, geram uma nova forma lingüística com um significado distinto.Observemos os exemplos: APRENDER e SÁBADO  Temos acima duas palavras ou sinais distintos com significados tambémdistintos somente pelo fato de o primeiro sinal - APRENDER - ser articulado na testa ede o segundo - SÁBADO – ser articulado na boca, ou seja, é o ponto de articulação queos distingue. Em português, essas unidades mínimas equivalem aos fonemas /p/ e /b/ das palavras pata e bata, pois eles também distinguem as formas lingüísticas e seussignificados. Assim, por terem formas idênticas exceto por uma característica espacial(ponto de articulação) na LIBRAS e fonética (sonoridade) no português, APRENDER eSÁBADO; pata e bata; podem ser considerados pares mínimos. 4 língua de modalidade visual-espacial – Ao longo do trabalho, essa nomenclatura apresenta variações deacordo com a ênfase que se deseja dar e o contexto em que está inserida: espaço-visual  , mais utilizada para referir à língua de sinais propriamente dita, que se articula no espaço e é percebida visualmente; visual-espacial  , usada para designar, principalmente, a modalidade da língua de sinais, enfatizando seuaspecto visual;  gestual-visual  mais ligada ao canal ou meio de comunicação, enfocando os movimentosgestuais e expressões faciais que são percebidos pela visão. 5 linha saussuriana – Refere-se à teoria lingüística de Saussure.   Outro ponto importante a ser considerado sobre a língua de sinais é que não existeuma língua universal com a qual surdos de todo o mundo podem se comunicar entre si.Pelo contrário, além de existirem línguas diferentes, inclusive dentro de um mesmo país(como é o caso da língua de sinais da comunidade indígena da floresta amazônica,Urubu-Kaapor, e a LIBRAS no Brasil), pode-se observar registros diversos (por categoria profissional, status social, idade, nível escolar etc.), além de dialetos regionais.É importante ressaltar, portanto, que apesar de a iconicidade ser mais evidente nasestruturas das línguas de sinais do que nas orais pelo fato de o espaço parecer ser maisconcreto e palpável do que o tempo utilizado pelas línguas orais-auditivas queconstituem suas estruturas através de seqüências sonoras que basicamente se transmitemtemporalmente, as formas icônicas das línguas de sinais não são universais ou retrato darealidade. [...] cada língua de sinais representa seus referentes, ainda que de formaicônica, convencionalmente, porque cada uma vê os objetos, seres e eventosrepresentados em seus sinais ou palavras sob uma determinada ótica ou perspectiva. (Brito, [1995?]). O exemplo que Ferreira Brito usa é o sinal ÁRVORE que em LIBRASrepresenta o tronco da árvore por meio do antebraço e os galhos e as folhas por meio damão aberta e do movimento interno dos seus dedos enquanto que, o sinal para o mesmoconceito em LSC (língua de sinais chinesa) representa apenas o tronco com as duasmãos semi-abertas e os dedos dobrados de forma circular. ÁRVORE (LIBRAS) ÁRVORE (LCS)   2.1. A criação de novos sinais na LIBRAS Valendo-nos também da reflexão feita por Vilmar Silva e Fábio Irineu da Silva(2002?) sobre a criação de novos sinais para a disciplina de informática do curso dedesenho técnico ministrado no Centro Federal de Educação Tecnológica de SantaCatarina para jovens e adultos surdos. Basicamente, em todas as línguas humanas, oraisou visuais-espaciais, as palavras/sinais pertencem a uma categoria lexical. Assim, tantoas línguas de sinais, quanto as línguas faladas, possuem um léxico e um sistema decriação de novos sinais em que as unidades mínimas – morfemas – são combinadas.Alguns desses processos, entretanto, diferem das línguas orais: [...] nas línguas orais a criação de palavras morfologicamente complexas sãomuitas vezes formadas pela junção de um prefixo ou sufixo a uma raiz.Enquanto, nas línguas de sinais os processos para criação de sinais resultamde processos não-concatenados em que uma raiz é enriquecida commovimentos e contornos no espaço de sinalização” (BELLUGI; KLIMA,1979).