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Sarlo Beatriz Tempo Passado P 45 129

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\, L/

Universidade Federal de Minas Gerais Reitor Ronaldo Tâdêu Pena
Vice-Reitora

Heloisa Maria Murgel Starling

Editora UFMG Diretor
Wander Melo Miranda

Vice-Diretoffi
Silvana Cóser

BEATRTZ SARLO

Conselho Editorial Wander Melo Miranda (presidente)
Carlos Antônio Leite Brandão
José Francisco Soares

)uarez Rocha Guimarães

Maria das Graças Santa BárbaraMaria Helena Damasceno e Silva Megale
Paulo Sérgio Lacerda Beirão Silvana Cóser

Tempc passado
Cultura da memória e guinada subjetiva

Tiadução

Rosa Freire

d'Aguiar

Editora UFÀ4G
6627 AJa direita da Biblioteca Cerltrel _ Térreo Carnpus Parrpuiha Belo HorizontelMG -,trz7o-9or Tel.: (3r) 3$9-4650 Fax: (3r) 3499-r,768 E-rnail: editora@uÍing.br wi,r'w. editora. uÍ?ng.br

Av Antônio CarJos,

*@b_
CoNrpa NrÌlrA Das

trrals

Copyright

@

2005 by Beatriz Sarlo
h

Tiempo pasado

a sido

cada mediante acuerdo con siglo

publicado oiginalmente en espafiol en zoo5. Estatraducción espublíxxl Edinres Argentina [Tempo passado foi pubÌicado ori-

Sumário

ginalrnente em espanhol em zoo5. Esta traduFo épubÌicada mediante acordo com sigÌo xxr
Editores Árgentinal.

Título original Tiempo pasado
Capa
Rar:I

-

Cultura de Ia memoria y giro subjetivo. Una discusión

Loureiro

, lmagemdampa
Fanfare (1974), de George Dannatt, guache e lápis sobre acrílico. @ Coleção particulari The Bridgeman Art Library
Prepataçã.o

Marcos Luiz Fernandes
Revisão

Carmen S. da Costa Isabel jorge Cury

1.
Dados Internacionais de CatalogaFo na Pubüação (Câmara Brasileira do Livro, sp, Brasil) Sallo, Beâtriz Tcmpo pasado : cultura da

Tempo passado,9

(crr)

2. Crítica do testemunho : suj eito e experiência, 23
/ Bãïiiï Sarlo
;

mmória

c guinada subjetiva

tradução Rosa Frcirc d'Aguiar Horizonte, : UFMG, 2007,

-

São Paulo

: Compaúia dâs Letrasi Belo

A retórica testemunhal, 45 4. Experiência e argumentação, 69 5. Pós-memória, reconstituições, 9o
3. 6.

TÍtuJo original: Ticmpo pasado,
jsBN 978-85-359-0981-4
rsBN

978-85-7041-583-7

(Companhia das Lctras) (Ed. UFMG)

Além da experiência, rr4

l. ÁÌgentina - Condições sociais - 1945-1983 2.,Argentina - Condiçôo

- 1983 - 3. MçmóÌia - Aspectos sociais - Ar8eDtina 4. Terrorismo de Estado - ÁÌgentina - Historiografia 5. Vítim4 dc terorismo de fstado Argentina . Hisroriografia.
sociais 07-1046 cDD.982

Notas, rzr

Índicc para crtálogo sistemáticoi
1. I

História

social

982

^rgcDtina

lzoozl
Todos os direitos desta edição reservados à
EDITOM SCHWARCZ ÌJIDÁ. Rua Bandeira Pauüsta 7oz cj. 3z

o4532-ooz-São Paulo
Telefone (rr) 3707,35oo Fax (n) 37o7-35or

-

sp

www.companhiadasletras. corn.br

Mundial até o presente, a memória ganhou um estatuto ilrcfutável. É certo que a memória pode seÍ ì-rm impulso moral da iristória e também urna de suas fontes, mas esses dois traços não srrportam a exigência de uma verdade mais indiscutível que aquelas clue é possível construir com e a partir de outros discur- uma epistemologia ingênua sos. Não se deve basear na memória cujas pretensões seriam rejeitadas em qualquer outro caso.tt Não Iii'r ccluivaiência entre o direíto de lembrar e a afirmação de uma vcrclacìe da lernbrança;tampouco o dever de memória obriga a rrccitar esszr equivalência. Ao contrário, grandes linhas do pensallrcnto clo século xx se permitiram desconfiar de um discurso da
memória exercido como construção
de

( ìuerra

3"

A retóríca testemunhal

verdade do sujeito. E a arte,

quando não procura mimetizar os discursos sobre memória ela-

lrorados na academia, coÍÌo acontece com certas estéticas da nlonumentalização limites contramonumentalização do Holocâusto,Ìe cleilonstrou que a exploração não está contida apenas dentro dos
e da mernóriar rnas que outras operaçÕes, de

distanciamento

ou recuperação estética da dimensão biográfica, são possíveis.

ditaduras do sul da América Latina, lembrar foi uma atividade de restauração dos laços sociais e comunitários perdidos no exílio ou destruídos peÌa violência de Estado. Tornaram a paiavra as vítimas e seus ïepresentantes (quer dizer, Quando acabaram
as seus narradores: desde o início, nos anos 1970, os antropólogos ou

ideólogos que representaíam histórias como as de Rigoberta Menctrú ou de Domitila;rnais tarde, os jornaiistas). Em meados da déca<ia de 1980, na cena européia, especialmente alemã, começou a se escrever um novo capítulo, clecisivo, sobre o Hoiocausto. De um lado, o debate dos historiadores alemães sobre a solução füral e o papel ativo do Estaclo alemão nas políticas de reparaçãa e na monumentalização do Holocausto; de outÍo, a grande difusão dos textos luminosos de Primo Levi, em que seria difíciÌ encontrar alguma afirrnação do saber do sujeito no Lager; rnais tarde, as ieituras de Giorgio Agamben, em qlre tampouco é possívei encontÍar uma positividade otimista; o Íìlme Shoahde Claude l-attzmann, que plopôs um novo tratamento do testemunho e renunciou, ao lTlesmo tempo, à imagem dos cam44
45

sl:

Í
Ì
I

poï outro, forçando o discurso dos sobreviventes. A menção a
acontecimentos poderia prosseguir.' Todos acompanharam pro_ cessos nem sempre surpreendentes do ponto de vista intelectual, mas de grande repercussão na esfera pública; o tema ocupou um

pos de concentração, privando-se, por um lado, de iconografia e,

impulso das transições democráticas, que na Argentina
o signo do Nunca mais.*

se

fez sob

o choque da violência de Estado jamais pareceu um obstáculo para construir e escutar a narração da experiência sofrida. A
novidade dessa experiência, tão forte como a novidade dos fatos da Primeira Guerra Mundial a que se referia Benjamin, não impediu

iugar muito visível e, na prática, produziu uma nova esfera de debate. Num desses acasos que potenci arizamfatos significativos
e

não podem ser ignorados, as transições democráticas no sul da

América coincidiram com um novo impulso da produção inte_ lectual e da discussão ideológica européia., os dois debates se entrelaçaram de modo inevitável, em especial porque o Holose oferece como modelo de outros crimes e isso é aceito por quem está mais preocupado em denunciar a enormidade do ter_ rorismo de Estado do que ãm definir seus traços nacionais espe_

causto

desponcondições da transição, os discursos começaram a circular e demonstraram ser indispensáveis para arestauraçã"o de uma esfera pública de direitos. taram
as

proliferação de discursos. As ditaduras representaram, no senti_ do mais forte, uma ruptuïa de épocas (como a Grande Guerra); mas as transições democráticas não emudecerarn por causa da enormidade desse rompimento. pelo contrário, quando
a

cíficos.

os crimes das ditaduras foram exibidos em meio a um florescimento de discursos testemunhais, sobrçtudo porque os julgamentos dos responsáveis (como no caso a-rgentino) exigiram que muitasvítimas dessem seutestemunho comoprovado quetinham

se disse no política. Aiém da aceitação dessas características, é bem crifïcil estaberecer uma perspectiva que se proponha examinar de modo crítico a narração das vítimas. se o núcieo de sua'erdade derre sel inquestionáver,

A memória

é

um bem comum, urn dever (como

caso europeu) e uma necessidade

jurídica,moral

e

sofrido e do que sabiam que outros sofreru- até morrer. No âmbito judicial e nos meios de comunic acão,aindispensáveÌ narração dos fatos não foi recebida com desconfiançasobre as possibilidades de reconstruir o passado, salvo pelos crirninosos e seus repre_
sentantes, que atacaram o valor probatório das narrações testemunhais, quando não as acusaram de ser falsas e encobrir os crimes da

tarnbém seu discurso deveria ser proiegido do ceiicismo e da críti ca' A confiança nos testemunhos das vítimas é necessária para a instalação de regimes democráticos e o enraizamento de um princípio de reparação e justiça. pois bem, esses discursos

testemunhais,

sejam quais forem, são discursos e não deveriam ficar confinados

nurna cristalização inabordáver. sobretudo porque, ern pararero construindo sentidos com os testemunhos

e

sobre os crimes das dita-

guerrilha'

ninguém (fora da esfe ra judiciária) pensou em submeter a escrutínio metodológico o testernu_

se se excluem os culpados,

nho em primeira pessoa das vítimas. Sem dúvld a, teriaalgo de monstruoso aplicar a esses discursos os princípios de dúvida
metodológica que expusemos mais acima: as vítirnas falavam pela primeira vez e o que contavam não só lhes dizia respeito, rnas se

duras, emergem outros fios de narracões que não estão protegidas pela mesma intangibilidade nem peio direito dos que sofreram. Em outras palavras: durante cefto tempo (hoje não sabemos
1983-4, no governo do presidente Raúl Alfo'sín, foi criada a comissão Nacional sobre o Desaparecimento de pessoas, presidida peÌo escritor Ernesto Sabato. Os resultados da comissão, publicados no livro Nnnca más,levaram ao julgamento dos miÌitares da ditadura. (N. f.)

*E*

transformava em "matéria-prima', da indignação e também em
+6

A7

r'ar-se das premissas impostas pela atualidade à enunciação. O presente da enunciação é o "tempo de base do discurso". que não escapa da memória nem pode iir. religiosos ou sindicalistas das décarl. do passado com a subjetividade que rememora no presente. que trhes foram conternporâneos. Não é rnenos A rememoração do passado (que Benjamin propunha como írnica perspectiva de uma história que não reificassse seu objeto) não é urna escolha. corno observava Halbwachs. As narrações da memória também insinuam outros probleRiceur assinala que é errado confial na idéia de que a narra- ção possa preencher o vazio da explicação/compreensão: "Criou-se IJMA uropla: t{Ão ESeUECER N. ordem da erlperiêna cia e se apóia. na mernória e na subjetivida- positivista. em +8 primeira está apoiada a num e efei'co de "coesão". se não submetemos todas as narrações sobre os criines das ditaduras ao escrutínio ideoiógico. qLra'to)' pelo fato de denunciar o horror. narrações sobre os anos que as corno Benjamin desejava. porque têm como condição um narrador tôrn as [Ìesmas prerrogativas e) na tarefa de reconstìtuir a época crrclausurada pelas ditaduras. que se inscrevem num tempo runterior ao dos crirnes (no caso argentino. no estuctro qrie dedica às diferenças já clássicas entre história e dlscurso. en' que presente se narra. Cs relatos testemunhais são "discurso" nesse sentido. seja porque provêrn do mesmo narrador. o passado se distorce para introduzir-se coerência. E. É inevitável a rnarca do presente no ato de narrar o passado. E só uma caracterização ingênua da experiência exigiria para ela uma verda- noções de Ricoeur. inclusive os testemunhos conlcr. se as narrações testemunhais são a fonte principai rl. o discurso sobre os crimes tcm preïrogativas. E.(no sentido em que Ben. os testeffÌunhos dos miii- lrr'tes.porâneos aos fatos dos anos tr960 e 1970. mas.jrr rrrìrr usou essa paiavra para cayacterizar os "fatos") a intangibiliclrcle da experiência vivicla na nawaçãa testeinunhal do que a de luür relato feito a partir de outras fontes. no discurso. justamente porque.{D. inclusive as pronunciadas pelas vítimas ou por seus representantes. seus músicos".â tima alternativa faisa quefazda narratividade tanto um obstáculo como uiïì substituto d aexplicação'i'Há riois tipos de inteligibilidade: a narrativ ae aexplicativa (causal). políticos. "O presente dirige o passado assim como um maestro. Além disso. E. mais que uma liber-taçao dos "fatos" coisificados. ctras clc mais alta. diz Riceur). não inscreve numa retórica da persuasão (o discurso pertence ao modo persuasivo. outras narrações. justamente por comportar um víncuÌo entre horror e humanidade. o presente tem uÍna hegernonia reconhecida como inevitável e os tempos verbais do passado não ficam livres de uma "experiência fenomenológica" do tempo presente da enunciação. pode-se dizer que a hegernoé da nia do presente sobre o passado no discurso de. intelectuais. que provém da coesão atribuída urna rrida ao 49 . o final dos anos 1960 e o início dos 1970) e costumam p areceÍ entrelaçadas. podem ser submetidas a crítica.saber sobre os crimes das ditaduras. é uma ligação. que não persegue uma verdade externa no momeitto em que ela é enunciada. só urna confiança implicado nos fatos. A Paul Riccur se irergunta.. mas uma condição para o discurso.rs anteriores não são a única fonte de conhecimento.ação da verdade testemunhal poderia outorgar-lhes um peso riul)()l'ior ao de outros documentos.iiliHll"..' Estendendo as ingônua na plimeira pessoa e na lembrança do vivido preten{eria estabelecer uma ordem presidida peio testemunhal. nãohárazãa rnorai para ignorar esse exarne quando se trata precederam ou sobre fatos alheios aos da repressão. porque é presente o momento de se começar anarraÍ e esse momento fica inscrito na narração. provavelmente inevitável. escreveu Italo Svevo. no caso do testernunho. seja porque se que presente se rememora e qual é o passado que se recupera. só uma fetir lr iz. Isso implica o narrador em sua história e a sucedem umas às outras.

ao mesmo inteligibiÌidade forte e. a e da veracidade de sua na rração. mas também instala o relato num horizonte em que a dispersão do sentido. O primado do detalhe é um modo realista-romântico de fortalecimento da credi- um único princípio de história renuncia.0 C específico hisé o que pode compor a intriga.. a a uma teleologia simples. Da perspectiva da disciplina histórica. não apropriado à intervenção na esfera pública. em compensação. rnas como traço signifìcativo. mas o específico. nìas. o d. a elipse é uma das iógicas de sentido de um relato. Sobre essa questão.rÍarrações em primeira pessoa se movem disciplina histórica localiza longe da utopia pelo impulso de bloquear os sentidos que escapam. Justamente o bilidade do narrador Ao contrário.não é uma expansão des- partir do singular. fundando assim Ìima comunidade ali onde ela foi destruída.uú&. tem ambição da autodefesa. a estilização unifica etraçauma linha argumental forte. Riceur estabeleceu uma diferença entre "individual" e "específìco" (que lembra a defìnição lukacsiana de tipo):"paui Veyne desenvolve o aparente paradoxo de que a história não tem como objeto o indide que sua narração pode motivos rrretodológicos ficou é capturado no discurso. governa o específico porque.iscurso creto e con- víduo. confrontado com a idéia ingênua de que todo o narrável é importante. Muito mais que a história.6 Naturalmente. como apontouArendt. como acontece na literatura. Vezzetti assinalou que a memória Íecorre preponderantemente ou sempre a formas narrativas. ao a O discurso da memória. esse laço estabelece tambérn uma cena para o luto. como acontece no caso da história. justamente por isso também é tem raízes um efeito reparador da subjetividade. Incluir um elemen- pormenorizado. específico:'Tüdo o que se pode enunciar sobre um indivíduo possui uma espécie de generaliclade"'.sujeito que a enuncia como sua. a contrapartida. Quando o testemunlao narra a morte ou a vexação extrema.A noção de intriga nos afasta de toda defesa da história como urna ciência do concreto. do qual nada reste do lado de fora. quer persuadir o interlocutor presente a e assegurar-se uma posição no futuro. em se crê obrigado a atribuir sentidos nem a explicar as ausências. não como simples detalhe verossímil.*.' 5o 51 . mas também lutam por um significado que unifique a interpretação. critiva da intriga. tanto a atribuição de um sentido único à rdnunciar tempo. É indivisível de sua presença no cíarecuperada local do fato e tórico tem a opacidade de uma história pessoal "afundada é em outras histórias". Opera com elipses. se discurso da memória e as. em que os velhos dis- cursos de uma história com argumentos nítidos prevalecem sobre as perspectivas monográfìcas da história acadêmica. . que ver com a esfera jurídica e com um laço social de confiança. história como a acumulação de detalhes produzem um moclo realista-romântico em que o sujeito que narra atribui sentidos a todo detalhe pelo próprio fato de que eie o incluiu em seu relato. jár não se pretende reconduzir os acontecimentos a uma origem. No limite está a utopia de um relatõacompleto". e. O testemunho é insepar âvelda autodesignação do sujeito que testemunha porque ele esteve ali onde os fatos (lhe) aconteceram. A tendência ao detaJhe e ao-acúmulo de precisões cria a ilusão de que o concreto da experiência passada incluir tudo. o testemunho tem a é uma instituição da sociedade. transformado em testemunho. âo mesmo tempo. O princípio da elipse. cujas representações "ficam necessariamente estilizadas e simplificadas". sobretudo. É esse aspecto que salientam as apologias do testemunho como "cura" de identia ele atribuído ilusão de evitar dades em perigo.'Por isso admissível a desconfiança. por e expositivos. não só eles se articulam contïa o esquecimento. por causa de sua ancoragem na experiêna to em uma intriga irnplica enunciar algo inteligível e. mas urn elemento constitutirro submetido à sua Ìógica. por conseguinte. De fato.

o detalhe insignificante repetido se adapta melhor que a proliferação ao que ela relata. corresponde à de Annette Wieviorka. por seu aspecto verossírnil mas não necessariamente verdadeiro.ts opcrarções intelectuais.] uma época em que. que) para dar alguma inteligibilidade Se esse é o I)oucoírnportaquãoproblernática fatosreconstituídos. o relato indivitltral c a opinião pessoal ocupam muitas vezes o lugar da análise'. a presa_desaparecida. nem forçá-Ìo. isto é. sem ter de mostrar sua necessidade. to sempre fica incompleto e que devem continuar a construí_lo. i verdade cstri no detalhe. The linle school começa com o relato da captura de um compÍomisso com o específico da situação e não simplesmen_ te com o que ela tem de individuaÌ. Mas. porque e pertencem a uma experiência mutilada pela imobilidade perma_ nente e pela oclusão do visíver.] identifica. porque o efeito de verdade depende rlc'les. de modo geral. h4as há alguns textos em que o detaihe é história que se deseja reconstituir controlado pela idéia de uma representação restrita da situação carcerária e. os detalhes de The tittle school se negam a criar um conjunto de representação. pois o que narra forrnou um desvão pessoal de suavida. a seqüestradores" No primeiro capítulo. Isso tem uma dimensão dramática e jurídica que expressa a minu_ ciosa destruição dos vestígios levada a cabo peros responsáveis por Em outros casos. Sua advertência de que diante tios rcstos da história é preciso confiar menos na memória e mais tanto ou mais que lemlrrrr'. partnoy completo e consistente porque o detJ[e o certifica.. Não por as pretensões da narracão ultr. chegam os tom da época. E.. o detarhe afetaa recém-transferida para "a Escolinha. A proliferação do deta- não ser a decisão de registrar tudo (olhando de soslaio. são rlcvc rnanter um controle sobre o detalhe. importa salientar a potencialìdade cxplicativa da intriga. clue ele e os arïuma sabendo que são muito poucos e muito pobres. i'dividual fecha ilusoriamente as fendas da intriga e a apresenta como se ela pudesse ou devesse representar um todo. pela fenda do purro q* rupu a marido' Nada mais. quanclo o que se busca entender não é tanto o lugar ou as circunstâncias da morte e o des- )) . o detaheãforça o tom de verdade íntima do relato: o narrador que lernbra de modo exaustivo seria incapaz de passar por alto o importante. e de seus farniliares. pâra o chão.t' rr. de modo que a identificação seja mediada por um princípio de distância. se não é submetido à crítica.apassam a busca de uma lesposta à uergunta sobre as condições em que se tino do corpo. quase na metade acaso. Sem dúvida. da argentina Alicia Fartnoy. por baixo das ven_ das que a impedem de ver. compreender do livro. os firhos de desaparecidos dizern isso de diversas maneiras: senteüì que o rera- lhes devem parecer falsos. quando a bern claro no caso dos desaparecidos argentiiros. até proÌír'èrativos e alheios a qualquer pr-incípio cornpositivo. uma manch a azul egotas de sangue: as caiças de seu ntriga por sua abundânciã realista. outro terto em teïceira pessoa vale como uma espécie de corte no movimento de identificação autobiográfica.Num testemunho. a terceira pessoa é partnoy contado em terceira pessoa. Penso err' Th.e little school. são fatos os deta- viu cam os próprias olhos. quando afirma que vivcrnos "[.rÌ À4uitos relatos testemunhais são ercessivamente detalhadas. jamais Nenhuma soma de detalhes consegue evitar que uma história Íìque restrita às interrogações que rhe deram origem. inclusive de sua acumulação e repetição. isso é desaparecimentos. chilenos e uruguaios. A primeira frase "Naquere é: meio-dia ela estava calçando os chinelos do marido'Ì Esse mundo familiar concreto se quebra com as batidas à porta. Álérn disso.por conseguinte. algo lhe seus olhos)' " Pela repetição do insignifi cante.EALISTA-ROMÂNTICO ( )itci Susan Sontag no começo.( } M ()I)0 I].. bem rnais limitada às suas condições. quando não é só a do pai ou da mãe assassinados.

é o fato de centrar-se na primeira pessoa. que. defeitos menores e fraquezas de uma memória que lembra uma profusão de detalhes manias dos personagens não significativos. A tiva ou estética que sustente sua trama.uté *. justamente por estarem respaldadas por uma subjetividade que narra sua experiência. as crianças. que. Zuker escreve um capítulo dado demográfico (a metade dos mortos e desaparecidos argenti- final em que. política anterior às intervenções militares. seÍn esses esclarecimentos finais terem uma razão compositiva que os ligue à história central. como em Dickens. assim. E. sua infância. em sua expressão efusiva de uma subjetividade e. i. espe- foi se bifurcando em um testernunho da autora e cialmente as Mães e mais tarde Avós.rl Entre detalhe individual e relato ieleológico há uma rclação óbvia. as preferências cotidianas. se sustenta numa dimensão afetiva de rememoração. então. Se a história tern um sentido 54 t fixando numa palavra de ordem um argumento poderoso: sacrificados ern plena juventude. evidentemente. dão a impressão de colocá-la além do exame.exerceu a violência de Estado e visam incluir a paisagem cultural e estabelecido de antemão. peculiaridades. iminente as c1a juventude. O modo a que chamei de realista-român- tui. Não se trata de r. Os traços. tudo isso conlo-um preâmbulo que se primeira.t*o nesses anos. justamente porque correspondiam a uma imagem da juventude que coincide com o senso comulïì - 55 . Desde os anos da ditadura argentina. as organizações de direitos humanos. falaram de "nossos fìlhos".lm simpies detalhes da vida farniÌiar. os detalhes se acomodam nessa direção. os conflLtos psicológicos de urna família. gtsK-. de toda maneira. O subtítulo Una saga familiar ê especialmente apropriado à missão reconstitutiva. desaparecido na fracassada contra-ofensiva iniciada em 1979. ficam bem evidentes as mesmo quando os próprios protagonistas custam a percebê-la. ora entende e ora não entende do testemunho acabam se organizando em algum tipo de necessidade inscrita além deles. mas antes da crença em que certa etapa de uma gigantesca mobilização revolucionária se desenvolveu sob o signo inaugural e sonagens) em alguns casos até a morte. que começa com os avós maternos e paternos dos dois irmãos. embora nem sempÍe visível. a proliferação multiplica os fios de um relato testemunhal sem encontrar arazão argumenta- A qualidade romântica tem a ver com duas características. com e fre- sentimental. apresentada como emble- mâlrcado que sofreram em vida. Restrita à idéia realista do romance. . e. çujo motivo é apenas o fato de ter acontecido com o narrador ou com o sujeito que ele evoca. algumas formas do non fiction olr os maus romances (sou consciente de que o adjetivo mattsdesperta certa inquietação rela- imagina necessário (como se se tratasse de um romance Íea- lista) antes de entrar nos anos 1970. os textos <ie inspiração memorialística produzidos sobre as décadas de 1960 e1970 se referem àjuventude de seus protagonistas e narradores. que confere ao narrador a perspectiva de uma primeira pessoa. mas gostaria que se admitisse a existência de rornances a que se pode aplicar o adjetivo). o destino dos filhos de desa- parecidos ou combatentes ocupam posições importantes no relato. É nesse aquilo mesmo que ela reconstimomento que a ilusão de uma representação comple- tico se adapta bem a essas características da narração testemunhal ta produz disquisições narrativas e descritivas. a relação entre os pais. Esse é o caso do livro de Cristina Zuker) que tem como objeto a vida de seu irmão Ricardo. militante montonero. que rernete a um horizonte narrativo identificável com o "toque de cor" do jornalis- mo. Em segundo lugar. ou numa terceira pessoa apresentada pelo discurso indireto livre. digressões e desvios que. se acompanha o destino dos per- nos tinha menos de 25 anos). sobre a relação com seu irmão muitas outras coisas. como não podia deixar de ser. uma memória qÌre. O narrador confia na representação qüência. os tivista. a relação com os pais.

trata_se de uma memória é exigida além do que próprio passado. impelidos a ir mais longe do que lembrariam se entregues apenas a uma rememoração espontânea.lt'sP'c'dinreÌrto. a lembrança como processo subjetivo abre uma expioração necessária ao sujeito que Ìembra (e ao mesmo tempo o separa de quem resiste a lembrar). e anarraçãonão consiga responder às perguntas que a gerarair. idearismo. o que o presente em que estão respondendo.. dos sobreviventes. lespondem sobre uina época qìre se v-êem forçad as aitazer até _)o lembrar. a reconstituição dos fatos no modo rearista-romântico tem. o mesmo acontece com os dessa incompreendida do passado. montar um capítulo na busca de uma verdade que. Lanzmann força os aldeões poÌoneses que viveram perto dos locais dos campos a lembrar o que esqueceram. 'ão narrativa é um direito e.um revelador do presente. a memória do Holocausto se descentra.ia espontânea daquele Á mernória nea. de toda rnarneira. A qualidade realista sustenta que a acumulação de-pcripécias produz o saber procurado e que esse saber poderia ter um Significado geral. mas poïque vai a ela apesar d. Nos dois casos. no imprilso messiânico peÌo qual presente o E- . ele não conhecia totalmente ou só conhecia ern fì agmentos escamoteados. embora subsista vítimas ou seus familiares. A rneinória não é invariaveÌmente é bérn tenham esquecido ou procui-ado o esquecimento. inevitavelmen_ te.Assim./. invariavelmente' condições de restaurar. para as é orte. aproxime de uma O QUE FOI O PRESENTE? sempre anacrônica:.ì( l. congerada nas fotograÍìas e na É evidente que.. o sujeito da memória srrs r'Ìt atuades- décadas é a juventude essencial. A quaridade juveniÌ é enfati.Ì (rra'do os fìlhos desses militantes mortos ou desaparecidos rlrrPlic:irr' o efeito de juventude. Cs aldeoes ou as vítimas falam no presente e. redimindo-o num ato presente de memória. sobre a qual se exerce a pressão de um conhecimento poderia ser e além de seus interesses e vontades. destacando que eres são.e quem dá seu testemunho. escreveu F{albwacrrs. não por_ que abandone a cena do massacre. a quem Lanzmann a espontâ- obriga violênciat. os aÌdeões poioneses. a quempersegue com sua câmera até que alguns deleslhepeçam que não querem lembrar. embora de modos distintos. ao exercê-lo. e pressionando a lembrança habitual. sabem rnais do que sabiam no momento dos fatos. embora tam passado e sua codifirlaÇao numa " narração convencional. O conhecimento que Lanzmann tem dos campos empllrïa a memória das vítimas ou dos testemunhos a ponto de fazê_los dizer mais do que diriam se entregues à própria espontaneidade. através de testemunhos de fortà inflexao autobiográfica. construído no pre_ sente. A prática r rrrra história dê a entrevista maís lembranças do que as "espontâneas.. irrrplica que o sujeito que n arra (porquenarra) se verdade que. e um de seus probÌemas justamente é reconhecê_lo e traçar seus limites.. Tanto nos aldeões como nos sobreviven_ tes. Reconstituir o passado de um sujeito ou reconstituir o a parte imposição da memória. No frLme Slrcah. Todo ato cle discorrer sobre o passado tem urna dirnensão anacrônlca. ímpeto. com Essa discordância dos terïpos é inevitáveJ nas narrações tes_ iernunhais' A discipiina histórica também é perseguida pero anactronismc. quando Benjamin se inclina por uma histó_ ria que liberte o passado de sua reificação. até o próprio momento da narração. mais velhos que os pais no momento em que estes foram irssussinados' Entre as Mães e os Filhos. a os sujeitos pensaram que ela por encerrada. suas próprias misérias e indfnidades diante dos trens que passavam com as vítimas. A intervenção é um jeito de forçar memá.erbal e acuando_os com a câme_ ra. e também consegue obter sobreviventes dos campos de concentração. na ' litlrrrle.

daquilo que seus instrumentos culturais lhe permitem captar do passado. outro gênero de história.jl&rtirÌ* . no momento em que a história pensa em construir uma se posto daquilo que um sujeito se permite ou pode lembrar. mas que também é seu dever fazê-lo.leo do testemunho possibilita sua difusão. que suas idéias lo que ele construção do passado. ou seja. transfere de um tom ou gênero a outro. etc. uma peÍspectiva da qual se descobre nos fatos pretéritos "uma assemblagede anacronismos sutis.iro-me ao que Georges Didi-Huberman chama de "tiivial".rar'1tu btresse sentido. uma dimen- são ética e. Se no testemunho as de qualquer outro discurso.assim como o passado é aquelamatériatemporal que se quer recaptuÍaÍ. o anacronismo nunca poderia ser totalmente eiiminado.o*o se viu. a crítica da qualidade objetiva atribuída à reconstituição dos fatos não esgota o problema da dupla inscríção temporal da história. . por um lado. como tarnbém mostram de que substância ternporal heterogênea são tecidos os as (ô !:. quando não sua é a memória. sente. para poder ali captar o sofrimento e as ruínas. jâqueé com. mas também requer que seu viés não seja esquecido em face do impacto da prirneira pessoa que fala por si e estarnpa seu nome como uma reafirmação de suaverdade' Tânto quanto do testemunho são isto: uma exigência de prerrogativas. e que se confunde. Peio contrário: é é pleciso lernbrar a qualidade anactônicaporque . o mesmo não Quando falo de anacronismo. textuïas temporais que não apenas aïmam o discurso damemória e da história.impurezado testemunho é uma fonte inesgotável de vitalidade polêmica. seria um instrumento para dissolvê-lo.r.la que conhece por experiência e documental da história científica do começo do século xx. A exortação seria. diante da triviaiidade de remeter qualquer passado ao presente. social. daquilo pelos meios de comunicação..visão dominada pela generalização abstra- poderia dizer da história (afirrnar que é precis a fazer história O testernunho pode se perrnitir o anacronism o. As narrações testemunhais sentemse confortáveis no presente porque é aattalidade (política. A indicação de Benjamin também poderia ser lida como uma lição para historiadores: olhar para o passado com os olhos de quem o viveu. faz parte da polêmica contra o fetichismo política ou moral no presente. Simplesmente. em vez de fortalecer o anacronismo. está sempre pre- impossível elirniná-la. com espanto. atacar ou defender-se. metodológicae. atuais lhe indicam que deve ser enfatizadoem função de uma ação Ó anacronismo benjaminiano tem. ele está indicando não só que o presente opera sobre a esquece. inventa. Contudo. de toda maneira.'' ref. cala intencionalmente. daquilo que ele tttfizacomo dispositivo retórico para argumentar. O núc.. fibra. biográfìca) se emergência.responsablízariapor uma dívida de sofrimento com o passado. em que o presente da enunciação é a própria condição da remernor ação: é suamatériatemporal. pois se trata de uma contingência que a golpeia sern interrupções e é sustentada por um processo de enunciação q. com sua experiência etc. as pretensões de verdade ria não pode cultivar o anacronismo por esçolha. â histó- A. ness-dcaso. mas mostra os lirnites que a distância impõe para sua compreensão. e só uma.Isso a distingue das narrações testemunhais. queuJizegaesquecê-1o justarnente porque não é possível elimináo anacronismo é mais inevitávetr que em qualquer io. campo aÍqueolÓgico a decif. depois de um tempo. isso não obriga a aceitar o inevitável como ínexistente.s de tempo entremeaàas. q. por outro . Mas acontece que a disciplina histórica sabe que não deve se instalar comodamente nessa dupla temporalidade de sua escrita e de seu objeto. No entanto. o anio de Klee. modifica. Didi-F{ubeíÌ-nan reconhece. persjstirá. Essas questões de perspectiva se colocam para encarar um problema que. que não ilumina o passaclo.B I ia seria capaz deconseguir aplainar como sese recordasse apenas abre uma hipótese). daqui- paisagem do passado diferente da que percorre.ue cultural.

Corno disse uma vez Althus- afirmar que as rnemórias se colocam deliberadamente no cenário dos conflitos atuais e pretendem atuar nele' Por último' sobre as décadas de 1960 e 1 970 existe uma massa de material escrito. Mas para pensar o passado também é insuficiente a tendência a colocar aí as formas ser. sem reivindicar uma diferen- pretensão ça que agora eles têm de como eram e agiam. além disso.ortes no pïesente (vejam-se as poiêmicas soÌ--re os projetos de urn rruseu da memória). pelo contrário. uma ordem para Evidentemente.Isso indicaria apenas um desejo de simplicidade que não é suficiente para recuperar o passado num impossível "estado puro". as tornem compreensíveis. Qualquer é porânea. pelo menos. em contrapartida. documene programas.-'tremas. cartas. jor- não partidários o correr dos acontecimentos. Significa. muito menos) a suas operações táticas. contemporâneo aos fatos tos de reuniões nais partidários e congressos. E. reportagens. suporta a tensão e as tentações do anacronismo. eles são o núcleo de um conhecimento sobre a repressão. os testemunhos de quem foi vítima das ditaduras. -. pois é freqüente que digam muito mais que as lembranças dos protagonistas ou. A memória. Não é. tanto os limites afetam. se é que se coirseguirá reclrperar os que estão primeiro escondidos. Sem dúvida. têrn fortes par deÌa 6a e e legítimas razóesparapartici- reiato da experiência interpretável. como se se tratasse da trama de um tecido. esses humanos."fatos'1 Reconhecer isso. já que acïescentam a moldura de um espírito de época' Saber crânio deVoltaire menino. não é um ideal de conhecimento renunciar à densidade de temporalidades diferentes. testemunhos permaneçam subtraídos da análise. não implica que todo relato do passado se entÍegue a essa heterogeneidade como a um destino náo fazmuito tempo. está dando uma forma inteiramente nova aos objetos reconstituídos. que as disponha para mostrar da melhor maneira o desenho pretendido. na verdade. não é uma reificante da sub'jetividade nem um plano para expulsá-la da história. São fontes ricas. esse caráter. N4as o aten- tado das ditaduras coiltra o carâter sagrado da vida não transfere esse disso. se é que outros vestígios não foram destruídos). que a "verdade" não resulta da submissão a "crânio de Voltaire menino" quando. excepcionais. interpela uma responsabilidade rnoral coletiva que não prescreve. em respeito aos rnilitares. o de vítimas. como os prociuzidos por técnicas etnográficas que utilizarn uma terceira pessoa muito próxima da primeira (o que em literatura se denomina discurso indireto lívre). ou seja: que saiba com que fibras está construída e. porém. que seria insensato que seguiam ou antecipavam deixar de lado. Ì'trão ção para é preciso recorrer à idéia de manipuÌa- fatal. os que iernbram não estão afasl:ados da iuta política contem- caráter ao discurso testernuirhal sobre aqueles fatos. apenas. trsso acontece nos testernunhos sobre os anos 1960 e i970. tal como ternos argumentado. se é impossível (e indèïejável)_extirpá-la do presente. não existe o como pensavam os militantes em 1970. têm a por isso. imagina encontíar o uma perspectiva memorialística que tem limites nem. Para dar um exemplo: nas décadas de 1960 e l97A não existia nos movimentos revolucionários a idéia de direitos ça. luga5 que o passado recordado está perto demais textura do vivido em condições e. manifestos e folhetos. Até que outïos <iocumentos apaleçam (se é que aparecerão os que dizem qLre selÌs oriundos dos protagonistas e escritos em prirneira pessoa. tampouco é possível projetá-ia intacta pafa apassado. como não poderia deixar de ser'. Diante dessa tendência discursiva seria preciso ter ern conta. investir no presente suas opiniões sobre o que aconteceu 6t . e não limitar-se àlembran- presentes de uma subjetividade que. Âlém e. ainda desempentrra funções poiíticas f. Por isso são insubstituíveis na reconstituição desses anos. mas que trabalhe com ela para alcançar uma reconstrução inteligível.

que era necessário conhecer. Vietnã. doutrinário a muitas intervenções políticas. o que resta nos relatos testemunhais? Acreditava-se quë as velhas lealdades políticas tradicionais poderiam dissolver-se ou modificar-se. um relato de ori- larìzadas. O irnaginário da revolução era livresco e se manifestava na insistência sobre a formação teórica dos militantes. em que o escrito ainda desempenhava papel importante na discussão política. deu caráter singularmente A pergunta tem importância porque aquele período foi fortemente ideológico. as discussões entre organizações se alimentavarrì de citaçÕes (obviamente.e bispos da AméricaLatina. O mílenarismo foi profético que. Cl-rina). No início dos anos 1970. num rnomento de r adicalização do sindicalismo. a vontade revolucionária tinha em sua origem um livro.oviinentos cristãos raciicais. numa hemeroteca. e seria um erío pensar que isso só acontecia no espaço universitário ou só era protagonizado pelapequena burguesia. tanto na esquerda como na direita (o pragma- tismo ainda não atravessara nenhuma das duas). como tinha também um país socialista (Cr-rba.AS IDÉIAS E OS FATOS Das idéias que mobilizaram os anos 1960 e 197A. A importância da "teoria" (uma versão simplificada para usos práticos). quem. Basta ler as centenas de páginas dos m. a maioria da militância e do ativismo era jovem e reforçava a carâtet ilustrado de franjas importantes dos movirnentos" Át produziu uma Íìassa de textos cla libertação" e. O clima da época não se definia apenas por afinidades pragmáticas ou identificações afetivas. consumiam-se na rnais jornais à consuka dos "{. tnesciando-se e conta- rninando-se com gem cristã as rlersões rnarxistas. Essas operações não podiam setrealízadas sem um forte contingente letrado entre os quadros dirigentes e nos setores intermediários. tanto quanto quem verificar que os Diários de Ernesto Guevara foram publicados em série na revista mais sensacionalista do fim dos anos 1960. tratava-se da prática de classes médias. jétque a nova sociedade seria precedida por ìrma eiapa de destruição reparadora.com dirigentes oriundos da universidade ou de organi- sindical-políticas onde a batalha de idéias era fundamental. .rgentina por habitante do que atualmente q o noticiário televisivo ainda não havia substituído o diário popular vespertino. por dois motivos: zaçóes d. de outro. e que as tradições políticas deviam ser reivindicadas porque sua transformação ídeológica as integraria em novos marcos programáticos. sobretudo no campo rrrarxista. longe de declinar. Foram décadas ideológicas. e até mesmo na base das organizaçóes. com diferenças de periodização segundo as nações do sul daAmérica. esco- listas. girava tanto em torno de um texto sagrado. ern qLle as interpretações das encícÌicas e dos Evangelhos forarn verdadeiros exercícios de secul aúzação dateologia. A televisão não tinha estabelecido uma hegemonia completa. nufiì extrerno. como da vontade revolucionária. a teoria da lutaatmada. até os popuiismos revolucionários baseavam sua ação nnm imaginário cujas fouies eram escritas. uma qualidade que revela o tom da época e que se descobre muito depressa quando se lêem não só os textos francamente políticos. A política desses anos. influenres irão só nas orgatizações poiíticas. As ideologias. depenclentistas e naciona- um lado. Esse é um traço diferencial. o iniienarismo integïava a "teologia 63 d9{&+". dedicar duas horas jornais populares argentinos desse período provavelmente ficarâ surpreso. e na confluência." Cruzando-se. mas também os jornais e revistas da indústria cultural. cortadas e repetidas) de alguns textos fundadores. corn o peronisrno radical. antes. coir-lo tarnbém entre apareciam como sistemas fortes que organizavam experiências e muitos subjetividades. Ou. que oferecia a seu público váriaspâgínas de informação sindical. em outro. na qual dividiram as páginas corn as notícias policiais *as vedetes do teatro direvista. a imprensa escrita continuava a ser o principal meio de informação. o que é óbvio.

tão forte como a que opu'ha a naçãoao imperiaiismo. por urn lado se reivindicava uma identidade históri- incluíairr nas orga_ nizações.a pol i. Pois bem. se os caminhos da revolução "vias"). no caso argentino. sobrétudo nas facçÕes marxistas do movimento radìcal. uffÌ antiintelectualisrno hisio'icista e uma formacão livres64 ria ta e num debate que já tinha atravessado boa parte do século >it. as etapas. Na América Latina. textuais. Mas essa indicação em si mesma era um elemento atirõ'ãa reaiidade e incidia na con- figuração das identidades políticas: à utopia-ãe uma teoria revolucionária que animasse e guiasse a experiência pressionav a apráti- 'am tradição no movimento comunista e socialista. A profecia chega ao pïesen_ te vinda do passado. maior penetração desse discurso. de longa mas como indicação do que devia acontecer. hierarquias. intelectuais aliavam ou e o e debate sobre a natureza dcr peronismo foi claramente ideológico acadêmicas. Mo'imento dos sacerdotes para o Terceiro cristianismo y Revornción.e. movimento. em novas formas de vida e as classes médias.ilhares de jovens que encontravam em alguns autores "nacionais" e na teoria da depen- 'o gio prático". como foi o peronisrno revolucionário na Argentina. formações. A afirmação daprimazìaintelectual não deve'ia ser tomaAs idéias da como descrição do que efetivamente acontecia com os sujeitos. comunicação e compartimentação) também eram capítulos doutrinários fundamentais e objeto debate não só na imprensa partidária.longe de se confìgurar contra o erudito. lirrrescas. marca também um processo de difusão pare ca diária dos movimentos. o vazamento de temas da teoria revolucioná riapara a imprensa de informação geral. necessidades e cïenças. a direção. que não necessariarnente se irientifìcação com uin iíder carismático e se via a uira linha divisória da história nacio'ai. inas assinaXou um ideal. ensaística. à disposição de. que não se vilreu apenas "estáé Tlrdo isso dência cle Cardoso e Faletto as chaves para exeïcet:) ao mesmo iefiìIro. recoruma cultura ilustrada para articular impulsos. a começar pela palavra de Cristo. Leu-se a Bíbiia na cÌave terceiro-munciista e se dimlgaram versões secuiarizadas d. por outro. se o mito revoÌucionário se sustentou nurna história escri_ a sabido.' Mundo. a revista as forças sociais que s€l opunham em seu trajeto (as frentes. A emergência da guerrilha motivou. segundo o vocabulário da época) e o tipo de or ganização (partido.Asmudanças culturais e nos costumes foram impulsionadas porumageÍação que deixou suafiÌarcatambém no jornalismo. através de seus profetas. as tarefas. t escrita. Isso não transformou em eruditos todos os militantes. se c imaginário potrítico. o cristianismo revolucionário dqs arros i960 e 1970 marcou o rnomento mais compacto e de movimento deviam aprender neles. As vanguardas políticas desse período participaram de um movimento mais amplo de renovação cultural qlle acompanhou os processos de modernização socioeconômica da década de l970. se o período foi ce'ário de urna irnportante guinada nas idéias.'e (as marcado por intervençõer. céluÌas. mas que os recém-chegados ac. autorizando a mudanca anunciada nos textos ca natradição de lutas nacionais que os velhos setores popuiares não tinham aprendido nos livros. Ì{as facções populistas. O) o . liria e apre'dici. os documentos do sagrados.a mensagem evangélica. revistas e semanários do mercado a colocarem essa discussão. exército revolucionário. mas sob formas discursivas.2o cle era'r defendidas corno núcieo constitutivo da identidade política. a teologia da libertação do padre peruano Gustavo Gutiérrez prepararam o solo ideo_ lógico em que o milenarismo cristão se encontrou com a radicalização revolucionária.. seus leitores.que se verifica quando se examijornais da época. e suas respectivas. suas legiões se reconhecem e se organizam. difundia-se essa mesma história ern versão oposição entre eiites letradas e ìrovo coíno ca baseada 'a nas vanguardas estéticas.

ocoÍra numa esfera pública separada da subjetividade. se se trata de discutir os direitos da expressão da subjetivi- memória tenha direitos morais. memória parecem oferecer uma autenticidade da qual estamos acostumados a desconfiar radicalmente.] A memória. vive sob a blante intelectual ideológico do movimento político-social se impõe na narração em primeira pessoa de uma subjetividade da época? Quanto subsiste desse teor ideológico da vida política nas narrações da subjetividade?" Ou. Seja como for. mas não outros. Uma utopia revolucionária carregada de idéias recebe um tratamento injusto se é apresentada só ou fundamentalmente como dÍama pós-moderno dos seus partidários. caso se prefira. a essas prerrogativas talvez a histórico mais afim com a reconstituição de uma época como aquela? Não e. então. se solta de seu imediatismo identitário. mas de modo distinto. todos os proa crise da insufìciente e pede-se não só jr.. como assinalouArendt. mas também (e se deveria a base Mas quem está comprometido nurna luta pelo esclarecimen- de uma coerência imaginária. O que quero dízer emais simples: a subjetividade é histórica disciplina histórica) a um controle que acreditamos possível tornar a captá-la em uma narração.d" Rouìieau. to dos desaparecirnentos. A nartação dá sentido ao passado. depois. mas só se. Mas. mas que se distingue conceitual e metodologicamente de suas narrações. ou melhor. assassinatos e torturas difìcilmente vai limitar-se. é seu diferencial que vale. não se submetem. concebido como sempÍe'reconstituíão'e organizado sobre problema não só para a psicologia. como os da dade. C Nunca mais parece. As organizações cle direitos humanos politizaram o discurso porque foi inevitável que procurassern um sentido substancial nas ações dos militantes qrÌe sofreram o terrorismo de Estado. "o passado será mundo das vítimas. como assinala Rossi. . a suspensão dessa desconfiança teve causas morais. mas tarnbém um reconheci- blemas da experiência (se se admite que há experiência) abrem-se mento positivo das ações das vítimas. mas conseguir a condenação dos culpados. de modo extremor o que Benjamin solicitara como refutação do positivismo reificante) que reclama as prerrogativas de proximidade e perspectiva. Quando 6Z numa atualidade que oscila entre sustentar subjetivida- de em um mundo midiatizado e a persistên cia da subjetividade como uma espécie de artesanato de resistência. a estabelecer o sentido jurídico de sua prática.I que se pergunta é: quanto do peso e e da reverberação das idéias res- t te-se a possibilidade de uma reconstituição do passado. como isso se transforma numa interpretação da história (e deixa de ser apenas um fato de memória). se não se pratica um ceticismo radical e admi66 . que sacriftcio do sem- vias da subjetividade rememorativa e de umahistória sensível a ela. quando já se exerceu até as últimas conseqüências a crítica da idéia de verdade. Os discursos da memória. a ima- ginaçãoviaja. Mesmo nesses anos. A memória tem tanto interesse no presente quanto a história ou a arte. custa admitir que ela se tnantenha alheia ao princípio crítico que se exerce sobre a história. tão impregnados de ideologias como os da história. abrem-se as tou nas narrações testemunhais. Entende-se o sentido moral dessa reivindicação. Essa história. No caso das as narrações de CONTRA UM MITO DA MEMóRIA * :i- memórias da repressão. jurídicas e políticas. emoções do presente'l" A citação vai ao cerne de meu argurnento.rstiça. O passado imaginado torna-se um dizer sobretudo) pata a historiografia [. como 'coloniza'o passado e o organizana base das concepções e se disse. qual é o gênero pressão de uma memória (realizando. O importante não era compreender o Paolo Rossi escreve que. depois de duas décadas de transição democrática.

Contra a idéia ó8 69 . São textos raros e me refìro a dois: "La bemba". do que fiquei sabendo que aconteceu com meu amigo. e desconfiam da sinceridade e da verdade da primeira pes- produto direto de um relato. meu irmão"). de Emilio de Ípoia. numa espécie de limbo interpretativo. Fressupõem autorils que não pensam que a experiência confere diretamente uila intc- lecção dos elernentos que a compõem. Alguns textos partilham com a literatura e as ciências sociais as precauçÕes diante de uma empiria que não tenha sido construída como problema. ela se coloca. pelo exercício de uma imaginária autenticidade testemunhal. nem na identificação. nem no impacto moral das condições que colocaram alguém na situação de ser testemunha ou vítirna. Recorrem a uma modalida de argumentativa porque não acreditam de todo no fato de que c soa como torne simplesrnente visível. ' Eies pressupõem leitores que buscam explicações não apoi:rdas apenas no pedido de verdade do testemunho. Existem outras maneiras de trabalhar a experiência. e vivido se Poder y fls5sparición: Los campos de concentración en Argentina. àe Piiar Calveiro. como se se tratasse de uirra espécie de dolorosa compensação do sofrimento."1* I uma narração memorialística concorre com a história e apóia sua 1 exigência nos privilégios de uma subjetividade que seria sua garantia (como se pudéssemos voltar a crer em alguém que simplesmente diz:"Falo a 4" Experiência e argurnentação verdade do que aconteceu comigo ou do que vi que acontecia. como se pudesse fluir de urna nanação que acumula detalhes no modo realista-romântico.

antes lidades adquiridas numa época anterior à repressão. que é possí- Arendt difundidos. ele procurou provaï que o um cientista social. a penso o fato de terem sido vítimas em termos diretos modéstia de um autor que preferiria evital as objeções dis- repressão. Por isso. a experiênõìa é submetida a um controle epistemológico que. A condescendência com que. A perspectiva é fortemente intelectual e define te)iÍos que buscam um conhecimento. é claro. d anarração de forte linha argumental. de outro lado. Em segundo lugar. de que sobre certos fatos extremos só vel uma reconstituição narrativa. . mas.exposta porArendt. em 1983' Ípola julga seu artigo pode expiicar-se de duas maneiras: há' de urn lado. também fez seu. num esquema ideal anterior à narração. mas também porque exigiram autores previamente exercitados (Emilio de Ípola) ou decididos a se inclui "La bemba".Tâmbémporisso não são 70 textos mais captatil benevolentiaprocura antecipar críticas). tanto Ípola como Calveiro se separam do discurso memorialístico ao e posição de quem analisa seus materiais. da anedota. não simplesmente emtermos de qualidade intelectual. Ípola quis recuperar um passado universitário e empïegaÍ suas capacidades. reservam-se o direito. chama atenção que o estudo seja caraçtetizado "simptresmente corno um testemunho e tambérn se munhar como vítima ou denunciador. Afastam-se de uma reconstituiçao só narrativa e da simples noção consoladora de que a experiência por sisó produz conhecimento. não privilegiam aprimeirapessoa do relato nem dão umaposição especial à subjetividade daquele que o enuncia. tambérn é possível aceitar essa modéstia como própria de um primeiro rnoção convencional de uma introdução. ten- ciplinares que seu afiígo poderia evocaÍ em futuros leitores (fun- tando se ater às condições metodológicas desse saber.' Como pudessem pôr provisoriamente em suspessoais da como ufiìa espécie de matéria-prima para elaborações ulteriores (nossas ou de outros)". TEORIA DO RUMOR CARCERÁRIO Aprimeiraversão de "Labemba"'foi escrita em maio de 1978. um texto hiperteórico. .'Foi um desafio. ao passo que o artigo de Ípola está esquecido. não surge dela. o livro de Calveiro foi amplamente discutido. Ípola escreve da de um testemunho. ambos escrevem com conhecimento disciplinar. Em primeiro lugar. com grande afinidade com os que Ípoia escreveu no início dos anos 1980. mas das regras da arte praticadas pela história e pelas ciências sociais. da invectiva dos tropos. na imaginação sociológica ou histórica. demonstrando que a prisão não havia conseguido anular as habiautor continuava a ser Calveiro e Ípola escolheram procedimentos expositivos que implicam um distanciarnento dos "fatos". O texto pÕe em cena um drama da identidade só na medida em que é produto da reapropriação de um capital intelectual ctjautilização não se limita à defesa de uma primeira pessoa narrativa. trata-se de textos excepcionais. De toda maneira. quando Emilio de Ípola praticamente saía da prisão onde estivera preso quase dois anos. não de quem quer teste- aceitar restrições no uso da primeira pesioa. em que a 7I . a as remissões teóricas as ea perspectiva exterior ao material são tão importantes quanto refe- rências empíricas. do sentimentalismo. como que escondido em outra dobra do tempo. Na "Introdução" do volume em que exercitar para a escrita se e parc as funções que esta cumpriria e (Pilar Calveiro). de buscar princípios explicativos além da experiência. alguém que não perdera seus conhecimentos e podia continuar a exercê-los. Diferentes em quase todos os aspectos. visualização da experiência se sustenta num momento analítico. |ustamente à experiência de os por isso mantêm uma distânciaexataem relação seuspróprios sofrimentos.

No crrtanto. muito próximo ao testemunho é.discursos fragmentários. para salienta. C "objeto teórico" (pro73 . têm a impressão contrária: trata-se de um texto fortemente inspirado em teorias. "cumprindo o papel próprio aos'intelectuais'na prisiìo [. dei- xando de lado outÍas perspectivas sobre os fatos. citados na os construindo um rela- bibliografia.iobembas. uma sofisticada análise em que o eu da testemunha nunca aparece. o de se constituírem em analistas e comentadores. clentro do espaço teórico. mas. na..os aparentes ('duas mil liberda- um quadro deniro do qual noções vindas do campo da comuni- cação se crúzam com as do marxismo estruturalista. a rntrocÌução de 1983 valta a"La marxista) não simplesmente para reconstituir as fontes teóricas de "La bemba". Do mesmo nrodo que o paciente.) 11 dimensão cornunicativa da virla cotidiana. preenchendo os brancos e Emboraincorpore outras influências.. comparado com qualqueïtestemunho realmente existente. rrrrris que em l Ípola considera. A origem da palavra seriam as rad. de Foucault (embora o a apagar seu ÍumoÍ seja uma fissura no controle absoluto). iresmo como lugar importante de enunciação. nem produto se res de bembas'1o Nessa divisão entre produe o l c analista apóia todo o trabalho tambérn minha leitura. quando ainda não se podia saber que o testemunho ia ser hegemônico. * a psicanalítica. julgando insuficiente perspectiva teôríca inicial. trabalhos sobre semiologia as e ideologia são também to contínuo e coeïente. O rumor é um tema característico da semiologia e da teoria Na "Introdução'] Ípola examina não só as noções de verossirrr da comunicação. mas para assinalar de que modo o texto corresponde a um espír'ito de época inarxista-estruturaLista e semiológico.onho. interessa eirl especial a Ípola.]. em que a experiência da prisão é construída como objeto (teórico. como espelho da prisão) ..rerclade. a uma versão aceitável: verossímil". por esse caminho. O que e e das condições carce- ir lìteratura testemunhal apresentaria sua "matéria-prima". de Goffman. tende aParente absurdo.r. ir dando forma. o trabaÌho das bentbas consiste em elimirìar pïogïessivarnente os absurd. a"Introdução" deixa supor que o sustentam suaverossimilhan- ter-to comecoua ser escri- to na cadeia. Esse era unl dos núcleos de uinanova semiologia. e Vigiar e punir. quando escreveu "La bemba" ele não podia conhecer os textos futuros nem ter idéia de quais seriam o tom e a retórica com que bemba" com a desculpa de que é um texto preso demais a um momento descritivo da experiência. os boatos que circularram de boca em boca antes da Revoiução Cubana. cujo denso aparelho teórico opera coino defesa diante de qualquer versão ingênua e "realista" da experiência. Ípola analis a só unt aspecto cìa (N. desenvolve "algo que [. Os leitores. daquela época e de hoje. Dessa exper iêncía carcerâria. que o artigo não foi suficientemente teórico Menciono cr esses nomes e a que era então a Teoria (Althusser dominava espaço ou que. não acentuou uffra dimensão que. com outravertente que chegava da antropologia estrutural de Lévi-Strauss. Ern srima. disciplinas de vanguarda nos anos i 960 e 1970. Bentba.rja'. por conseguinte..] é apenas insinuado: o processo de produção-circulação das bembastern ulr-Ìa clara analogia cono que a psicanálise chama de'elaboração secundá. às ilhança do rumor (bemba) com aquelas ern que o artigo trabalha a quais Ípola chegava a partir de uma formação filosófica e social. Ípola diz que seu texto (como Levi afirma do dele) é uma "matéria-prima I Naturalrrìer1te. Ípola exige mais dele. i'umores. na n arração de um s."Labemba"se apóia em dois textos característicos da época: Internados.mento dos textos sobre a repressão e avioiência de Estado. A "Introdução" cles!') de uma pré-rrersão inicial. cxplicitamente. Mas. isto é. em 1983. no momento de publicá-lo ein livro. sobïe o sanatório psiquiátrico como instituição total (e. como se diria nos anos 1980) que permite o estudo do rumor rárias que possibilitam sua difusão ça.

nada está mais distante cle sua perspectiva do que uma reconstituição que coloque no centro os sujeitos. isto é. Seria possível ler nessa citação de Marx uma perspectiva irônica se ela não estivesse em experiência de prisão erfi notas de pé de página. O rumor carcerârío é uma instância de prova das possibilidades dateoria porque é diferente de todas as outras mensagens. a relação entre os três momentos está distorcida peia escassez de informação confiável. . chegando às raias do desmedido. mas mostrada em corpo rrrnor.riuçao e recepção do rumor carcerário. se transferência) que.*o Ípola descreve aspectos da produção. nota de pé de página as análises e as hipóteses. circulação e recepção das mensagens porque não é uma produção e. que esse trabalho se O que mais chama atenção em sua estratégia expositiva _ algo que não se repete em nenhumdos textos escritos nas últimas décadas manifesta como'a continuação de um pïocesso deprodução dentro do processo de circulação epara este"'. mas justamente aquele para o qual pensa estar preparado e que é interessante em termos teóricos. Antes. por isso. por conseguinte. Ípola não toma o carninho clo estudo etnográfico da inventiva dos presos. por conseguinte. alguns semiólogos tradu_ ziam o modelo clássico de Roman Jakobson. Para considerar essa excepcionalidade. . mas a analisa como se sse à . uma árvore de onde se não da experiência.duto de uma constÌ:ução. Não se fecha em sua experiência.2) afirma sobre o transporte de mercadorias. caberia dizer do'trabalho' das bembasalgo muito parecido com o que Marx (O capitalvol.Ípola analisa a partir desses rnodelos fortes e. Ípola tinha os instrumentos analíticos para escutar "cientifìcarnente" a bemba. fo a exp e_ produção: "Em certo sentido. o circuito comunicacional da bembaapresenta anomalias no vínculo entre produção. anterior em que a produção (como na produção de mercadorias) define a difusão e a recepção.colocando-se no extremo oposto do testemunho. mas ao mesmo tempo é descrito naquilo que corresponde e naquiio que se clesvia de suas regras. letra miúda é uma base empírica indispen_ sável. Não estuda os presos escutando ou espalhando rumoÍes) mas as condiçÕes em que estes conseguem O caráter excepcional do meio onde se produz a comunicação aÀ 75 t-. e A experiência em lariado na produção de mercadorias.irJ. É isso justamente que permite descobrir em que consiste sua excepcionalidade. exposta conceitualmente. não escolhe um aspecto qualquer de sua expe_ riência. no centlo eie coloca uma estrutura de relações anuncia mudanças. a bembalhe apresenta problemas a resolver. verossímil ouverdadeira. Por sua excepcionalidacle. Em síntese. pode entorpecer ou des_ truir as próprias condições de circulação das mensagens. a bemba não corresponde ao modelo que. a persistência da comunicação num espaço de proibições quase totais. comparando esies três momentos com o esquema analógico da produção e circuÌação de mercadorias mediante o qual. impiica levar em conta uma fo rçaçãa. em fins dos anos 1960. pelas dificuldades materiais da comunicação e pela forte pressão de um tema (o da liberdade ou a coinunicativa em condições normais. porque esta não é pode arrancar um fruto) vem de um saber e confere às mensagens traços que não se atêm ao modelo tripartite prisão: Ípola conhecia os estudos semiológic os antes de ser preso e. ostensivamente fora do coÍpo principaÌ do texto em que ocorrem as operaçÕes - é que ele divide a matéria do artigo registrando sua total sintonia com os esforços realizados então por semiólogos e marxistas que sublinhavam a subordinação de todo processo social sob o capitalismo às condições definidas pelo trabalho assa- sócio-semiológicas. embora sua matéria-prima seja testemunhal. Ípola força (exagera) o caráter analógico do modelo comunicacional inspirado no modelo econômico. numa conjuntura teórica de modelos fortes. como ao citar O capitalpara definir o processo de circulação dabembacomo parte de seu processo de riência de outro. ou seja.

e sim que a bemba altera as seqüências normais da circulação de mensagens de um Naturalmente.re condições "ilOrmais".porqlre sua difusão só é possível entre pessoas muito conhecidas. o vivido de uma experiência se faz presente só nurrÌa confìguração descritiva que corresponde a normas disciplinares. os e as transferências. não simples_ mente de uma experiência comunicativa. ção de trma bentba que comunica uma transferência em massa exige explica. significar alguma coisa. e. quando. para dar lugar a outra promessa idêntica. o caráa essa regra da moderação. Em seu estudo.seespalha a bemba ctra do-poderosas e. uma promessa de futuro que enveihece e Ípola caract eriza aprisão como um espaço em que . A diferença das rnensagens "normals".rumor éa respos- libertação de 2 rnil presos. anterior. e a escassez de mensagens que podem se produzir dentro. uma pequena sociedade consegue alcancar um pequeno mas significativo objetivo. que lhe parece a ta à escassez e à indefinição das condiçÕes cornunicativas. Por exemplo. com sua análise ele não quer provar que sempre. Fora deste. cliiereiateilente do que accntece en: de i'emória. ltentba'ão existe. e.ção diferente: assim como se desconfia das bembas otimisias demais. basicamente. A qualquer momento pode acontecer qualquer coisa por doiímotivos: a fragmentação dainformação que chega de fora. essa própria impossibilidade garante que os temas da bemba (mas não as mensagens) possam se repe_ tir sem que se esgote seu interesse.a qualquer rnomento pode acontecer qualquer coisa". Ípola se interroga sobre as condições de verossimilhança e as bases da crença. to_ moïre no mesmo dia. Portanto. agravada por um regime de proibiçõ-es fortes mas oscilanteS. A observação faz pensar que o informativa. Mas a iejei- fiìorre. mas fraseada com variações argumentais obrigatórias.esgaste da novidade ções de produção comunicativa. assim como não pode ser guardada como conteúrcio de rnemória. o grande tema da bembasão indultos nunca se as liberdades. instaveis. E. Ípola obsen'a aigo mais importante: uma trans- ferência em rnassa destruiria as próprias condições de circulação de qualquer beml:a. que excluem qualquer esperança. em qr-le a r epetiçãa afeta o interesse por d.. Trata-se do estudo de uma exceção comunicacional. Sem esse círculo em que o novo apaga o modo que a teoria será obrigada a considerar. e_. como eies podem guardar as lrensagens subtraídas dc circuito comunicativo. E interessam-lhe particularmente os pÍessupostos da verossimiihança do rumor. em agosto de I97 6. ao fazê. Na "Introdução'l ele volta caracterìza llor seu "nomadismc'1 A rnensagem não se estabiliza era lugar nenhum nem pocle ser armazenada ein nenhurn registro uma chave para explicar verossimilhança do rumor. como as bembas concretizam. por_ qr-re não hâ bembas guardadas pelos sujeitos. abembase ter "imoderado" desse Íumor impediu que se acreditasse nele. desde o início o rumor estaria marcado pelo descrédito. Nessa recusa. Lbembaé.-lq processa de modo analítico e interpretativo a circulação de rumores que ele enfrentou como preso. O espaço carcerârto de sua produção define cruaÍnente o elenco de argumentos. Essa indetermina_ ção do esperado eryì termos cornunicativos é urna marca imposta pelo poder carcerário para que os sujeitos vivam num regime semiológico de escassez. não se acredita naquelas de negatividade exage- rada. a resistência em aceitar um lumor de transferência vem clo fato de que ele ameaça o circuito e as condicirqr. a. ao mesmo tempo. distorcida por redes de difusão fracas ou amea_ cadas. o caráter desses aïgumentos faz com que a todas as mensagens com os mesmos temas devam ser esquecidas para dar lugar novas mensagens com os mesmos temas.-!. cuito comunicativo se preserva além do desejo dos sujeitos 77 Z6 . abembasenlpre sobrepõe a produção e a difusão. em todas as condições. que mais uma vez serão esquecidas. Se não circutrar-. Ípola analisa como o exagero. Como resposta a uma proibição sa uma escassez.

citadas com uma abundância conceitual. membros do governo um conherio da informação. especialmente em sintonia na antropologia estrudo pela teoria no marxismo estruturalista' de apoio tural. Ípola afirma que a recepção dabembadepende das categorias de presos que a escutam e difundem. ele procura imprimir-lhe as categorias e a rctôríca expositiva de uma disciplina que permita pensá-ia em termos gerais. a distância que pela teoria que pode expiiescreve sobre ele. E a primeira analítica"'La bemba" ganha pela sofìsticação de sua capacidade como o que se inverte arelaçãoque cal acter izalanto o testemunho Ípola quer manter da lembrança de sua experiência. geralmente político. uma condensação da prisão. extraindo-a da esfera do imediatismo e da sensibilidade para pô-la na esfera inte- ra) como outros recursos do texto. Mais que revivê-la. ao menos em princípi o. porque nunca estão livres da falsidade intervenção apoiada contarrrinação só pode ser dissipada poÏ Lrma faz parte do no conhecimento' Por isso a experiência pessoalnáo de pé de pagina' corpo do texto. simpatizantes distantes.aexperiência não é rememorada' mas parece estranho Examinando o artigo de Emilio de ipola' não a experiência que tenha sido esquecido como texto que apresenta são singularmente carcerâriadurante a ditadura' Suas qualiciades lectual. A cïença no ïumor está ligada às qualidades e habilidades intelectuais de seus receptores. completamente descartáveis. para ÍpoÌa. que Ípola define. recorrendo a uma tipologia sociológica orgamizadacom incisóíidentificado s de aa fr: membros orgânicos de partidos de esquerda ou revolucionários. na medida em que não podem. Nesse grau zero. porque ali também alcançam carLcaracletïzação das relações entre setores da populaçáo por que Ípola pode cerârrae seus guardas expÌica de algum modo se submeter a ela' Os fazer esse trabalho sobre a experiência sem um conhecimencarcereiros reconhecem que o preso político tem extrair (ao contráto. mas corrobo- da ideologia' cuja confiável.'(essas pobres miga- lhas de informação" devem estaÍ sempre inscritas na lógica de seu processo de produção e circulação. A experiência se mede analisada' câ-la. em que as crenças não são umabase rnbado. sem a mesma tragicidade. que eies não conseguem um grau deverossimilhança que evita suatransformação em mensagens frustradas. lrtas está onde lhe cabe' nas notas da página aPresenta como "matéria-prima" da análise' O espaço ao conhecigrafìcamente a hierarquia que subordina a experiência que pessoa não tem outro privilégio além do L"nto. profìssionais e intelectuais de esquerda sem militância. No papel de sociólogo da prisão. A tipologia da sociedad e carcerâria não só exibe seu pretendido efeito de cientificidade. o garrón é. sindicalistas de alto nível e delegados sindicais médios. na estrutura da sociedade carcerâria. e garrones. que não se perde se considera um funda sua identidade ao sair da prisão' Livre' não esteve preso' "La ex-preso da ditadura' mas um intelectual que nas fontes teóricas bemba" apresenta os fundamentos desse saber que remete não só à e sociolóiicas. na semiologia. que pode ser extraídasob tortura)' e sobre o qual Ípola cimento aprendido nos livros. mas também a essa definição identitásua necessidade de seus carcereiros' ria: lembram as armas do preso político diante se constrói A teoria ilumina a experiência' O ensaio de Ípola peronistdder- com o lugar ocupacom essa convicção. que ele descreve como reveladores da verdade do sofrimento carcerário. alheiasàmassatestemunhaleàshistóriaspessoaisecoletivassobre 79 l8 .dar razãonem expli- caï em termos políticos o que lhes coube sofrer. a figura do "muçulmano" nos testemunhos de Plimo Levi). na medida em que contradizem tanto as expectativas da recepção como as condições e em que devern ser produzidas difundidas.nele intervêm. e ele dedica uma extensa nota a suas diversas categorias e procedências (digamos que o garrón evoca. Abembaé o "grau zero" daresistência ao processo de desinformação carcerâria.

For um lado. pelo menos em païte. na ex-casa de Massera etn Panamericana (esu.le os goipes de Estado rnicas e Forças Armadas foi"am o produto de segr-licios enconiros de interesses. porque a originalidade do regime do campo. Diante das Forças Armadas. elítes socioeconôdemonstrariam qr. líder do Eru. colusão de facções. por ísso. pouco antes rÍe sua morte. com o estilo da disciplina. e é Calveiro aftttnaque o "campo de concentração" (cle tortura desaparecimento) 8o "uma críaçâo periférica e inodular ao rnesmo . O ensaio quer ser algo mais e algo menos que isso. as duas principais organizaçoes seu interior. vítima sern responsabilidade nas intervenções railitares. C alcance interpretaiiiro do iivro tambérn slla iese so-bre a ciitadura em i. a obediência e a burocratização implícita na rotina miiitar. ao tipificar uma reiteração histórica. é discutível. na delegacia de Castelar. Caiveiro avalia de forma diferenciada os Montoneros e o Exército Revolucionário do Fovo (snp) quando assinala que Roberto Santucho. primeiro.+.na À4ansão Seré. a guerrilha era a fotma principal dapaliticarerroiucionária no corneço da década de l97A e. afilmou que o principal equívoco dessa formação armada foi "não ter lecuado" e ter menosprezaclo seu isolamento do "movimento de rrrassas".A descrição analítica de Calveiro serve para provar isso. Também sugere a presença de uma matriz concentracionária na sociedade argentina. as formações guerrilheiras são "quase a condição sine qua non dos movimentos radicais cla épocd'. mais tarde". justarnente demonstrada por Calveiro. singular pela perspic âcia anaLitica. As hipóteses apresentam uma chave irìstórica conhecida: a primeira intervencão do Exército em 1930 as sucessivas alianças entre e tempo". partindo. rejeita a hipótese de uma reiteração comvariantes. em1977.fezprevalecer "uma Lógica revolucionária contra todo sentido de realidade. Poder y desaparición: Los campos de concentración en Argentina. possibilitada pela forma de poder inerente às Forças Armadas. A EXPERÏÊNCIA DE OUTROS Publicado em 1998. em julh o de 1976. a estratégia montonera. como premissa inqr-restionár'el. uma espécie de constante que supera as diferenças.o períoclo. fìcou invisível. por excesso ou falta. Marcado pela teoria do começo dos anos 1970. O excesso seria "a verdadeira noïrna de um poder desaparecedor". porque se opõem a um modelo de reconstituição e denúncia que se impôs nas últimas duas décadas.97 6. o poder 81 partidos políticos. Aqui n ão há nada que se afaste de uma cla Ìeitura da história que cleixori para tr'ás a idéia existência de uma se estende à sociedacie lnocente.ntre repressão e desaparecimento. de Pìiar Calveiro. não poderia ser avaliada siinplesmente coirlo uirr aterque deloucura coletiva. parapolicial. entre regime carcerário e regime concentracionário há distinçÕes que impedem pensar a persistência de urna matriz. Se Calveiro temrazão. da certeza absoÌuta do triunfo". eirÌ corrÌpensação.n Pilar Caiveiro foi uma prisioneira que fìcou desaparecida durante um ano e meio. poï outro. "La bemba" não pode ser recuperado pelo movimento de reme-. a rnoração que coloca no centro subjetividade confrontada com o terrorismo de Estado. impulsos inírtuos e . F. a guerrilha começou a "reproduzir em autoritário que tentava questionar". mas como "a expressão máxima da política. idéia que.o campo é uma invenção tão nova corno a figura do desaparecido que deriva de sua existência. e Thames) e na EscqJa de Mecânica da Mãrinha O livro corìeça com uma caracterização da violência de Estado. e a própria política. parapolítica e guerrilheira durante o goveÍno peronista derrubaclo em 1976. Reconhecida por muitos não como uma opção equivocada.). éa síntese de uma tese de doutorado apresentáda no México.

A leitura é iivre porque Calveiro não se apresenta como prova do que foi dito. sua experiência como prisioneira torna possívei o rnanejo de outros testemunhos. que ela retoma como fonte e. Trata-se de uma negativa explícita. na as ditadura aindahoje deve medida em que. Em contraparti- da. Como a primeira pessoâ se apaga.a obra de Calveiro proclrra legitimidade não na persuasão nem em motivos biográfìcos. por motivos queveremos em seguida. o livro não teria sido escrito se não tivessem existido razões biográficas. de que o destino que coube aos desaparecidos se num lugar excepcional entre os que sofreram a repressão e se propuseïam a representá-la. mas não exige que ninguém acredite neles só pela carga de sofrimento humano que (lhe) produziram.. portanto. por não estalem apoiadas unicamente em sua experiência de tormento. 8t . as hipóteses de Calveiro.guerrilheiras mantiveram com sua prática uma relação que Calveiro (ex-militante montonera) acredita necessário diferenciar. Calando a primeira pessoa para trabalhar sobre testemunhos alheios. o texto não exerce uma pressão vidos periféricos. provavelmente. mas sobre aqueie de quem não se exige uma crença baseada em sua própria história. Essas teses críticas não são. ao se afir- mar que o acaso era lei geral. Mas sua inclusão fortalecia a idéia de que consolidava o regime de terror. Ali. vizinhos e testemunhas não fazem parte da lei geral do sistema desaparecedor. o que é singularmente original no iivro de Calveiro é a decisão de prescindir de uma narração da experiência pessoal como prova de seu argumento. ciosamente presente (o leitor sabe) e ao mesmo tempo elidida. ou das entradas e saídas ostensivas de uma delegacia. Assim. mas essa simples comprovação vale para muitos livros de teinas bastante diferentes. A verdade do texto se Calveiro se situa deu de modo casual. persistente até hoje. a partft de uma distância descritiva e interpretativa. Quanto à guerrilha e a suas organizações de superfície. mas não no modo expositivo. O que seu livro ttaz coma interpretação central não é o que está sintetizado até aqui. É claro que. é claro. podem ser discutidas. Por outro lado. e sim nas histórias de outïos. A análise de Õílveiro é mais complexa: na medida ern que os centros de tortura e"*ort" fãdiam ser eventualmente vistos) como era o caso daquele'daAeronáutica. Por isso. embora se saiba que sua vida é parte dessa prova. mas sua análise do campo de concentração. nem na retórica. e assim se Calveiro desvinculadesse senso comum cuja função nos anos da ser avaliada. um julgamento sobre as organizações guerrilheiras. submete a operâções interpretativas. e sim pelo dispositivo intelectual que os incorpora a seu texto. que funcio- nava num hospital. que indaga na experiência aiheia aquilo que poderia imaginar que sua própria experiência lhe ensinou. porém. o que mais impressiona no livro de Calveiro. Elas implicam. entre os quais sua experiência está silen8z moral particular sobre o leitor. nem no aparato de captação moraÌ do leitor. a comprovação de que as "histórias" sobre a repressão encontravam provas parciais nos aspectos visíveis da máquina repressora reforçava o terror social. e também urna idéia do caráter da repressão militar. se "qualquer um podia cair". que sabe que Calveiro foi uma presa-desaparecida. Calveiro afirma que amaioria deles era de militantes ou envol- desvincula da experiência direta de quem o escreve. A diferença é essencial: alguém investiga o que aconteceu com outros (embora exatamente isso the tenha acontecido). Calveiro está se referindo a fatos excepcionais. a repressão. A biografìa está na origem. Ao estabelecer essa diferença com o discurso mais difundido. mas intelectuais. Calveiro se afasta do senso comum elaborado durante os primeiros anos da ditadura. o desaparecimento ou a tortura de parentes. conseqüências podiam ser tão des- mobilizadoras como a acusação de arbitrariedade total que caía sobre os repressores. a urn só tempo novo e apoiado numa história.

ncia concentracionâtia argentina em objeto de hipóteses interpretativas. os torturadores usavam tentativa de fuga. E. Entro no banheiro. É isso que ela diz a |uan Gelrnan coioca no ii-lgar de quem dá urn testernunho. Susana Burgos e muitos outros sobreviventes relatam tentativas por vezes absurdas. Teresa À4eschiati.ïo afirma que os desaparecedores se imaginam deuses.Depois de anos de publicação de testemunhos. tentar fugir e perderse me na Rivadavia i.também siiencia a existência dessa fìlha de qua- recida. 85 . mas de morrer. o qual não ocupa em seu próprio iivro: "Pulo pela janenlrma reuoriagem. Alguns exemplos são muito evi. melevantam elevam para cima.dentes. c. isto é. porque significava um exercício proibido da e político. culdade. suas circunstâncias sacialporquefoi desapa- e conseqüências. Emvez de reparar o tecido de sua experiência. e não de uma circunstânração sobre a quai se apóiã e da qual parte. estarei em condições ffsicas cada'rez pioles. Eu me aventurava a duas coisas: a coÌn o objetivo de üansformat a experíë. Calveiro escreve:'? morte essas iripóteses. por isso. Calveiro se propôs a ser uma cientista social que tambémfoi uma desaparecida. Calvei. transformou-se no que não ela antes de sofrer a repressão e tornou-se cientista primeira.'O livro silencia fato. e fundamental. Do ponto de vista qüências rrais cruéis. . refere-se ao e ato suicida as decisão que enfurecia os desaparecedores tinha conse- moral e torturada. ç:: vontade. tentar suspender voluntariamente qualquer função vital. nas fontes que Calveiro pode analisar como material não autobiográfìco (embora sua vida seja um fundo sobre o qual esses dados tarnbém façam sentido. me davam mais tempo para que eu pudesse tirar o leite. Na verdade.uairdo se expressão'foi-se'para designar alguém que elestrnham matado dr-rrante a tortura. Ao a Em vez de sua tentativa de suicídio. jânão de viver. Pol isso a argument ação emais forte e extensa do que a nar- Calveiro. não como ex-militante presa cia terrível. ela faia como cidadã. Peço que 8+ res- pirar. Calveino não menciona slla própria podia parecer uila libertação. no entanto.. Essa consciência onipotente dos quê detinham o poder de decisão nesse âmbito explica a.literalesse mente aos pontapés". de primeira pessoa) opta por se separar do relato de suaexperiência. Seu direito ven de algo universal. mas desesperadas. Então penso que devo teagír' jâ'Eu tinha visto que a janela do banhelro não estava tï ancada. essa experiência foi apagada de um livro adequado a uma argumentação baseada nos relatos de outros. corn poder absoluto de vida inorte. nós.. O livro não prolonga no presente sua identidade de útima. que. tentava escapaï apresental à lógica totaX em que fora incluído. abro a janela e pulo. definitivo. em reportagens publicadas quando sai a edição argentina da tese rnexicana.] A segunda: e houvesse guardas lá fora eles poderiam me matar assim se acabava a história [. ficamos sabendo isso depois. renta dias. que então clescobria a difi- la do prirneiro andar da Ìv{ailsão Seré poÍqìle païa mim à é claro que. quarenta dias. ] Eles ouvem obarulho de minha queda. leitores. que foi interpretada coino suicídio e despertou uma série feroz de represálias. cólera que seniiam <iiante do suicíe como se ela se dissesse que o que experimentou produz algurnas de dio ou da tentativa de sr-ricídio cle um pïeso. perderei a iniciativa. Como dado pessoal. quando escreve como a e analisa. Morrer irão era fácil deniro de uin campo. De pé. embora ela possa persistir numa rernemoração calada. decidir a própria morte era uma das coisas proibidas ao desaparecido. mas não menciona sua experiência. . como estava amamentando minha Íìlha menor. Calveiïo' que possui os mesmos materiais vividos que os autores de narrações em me levem lá e. por esse camínho suas condições de leitura). ela se esforça em entendê-ia em termos que não dependam exclusivamente do seu vivido. deixar c1e medida que o tempo passal. para encontrar a morte: tomar água poluída. Nessa escolha expositiva as idéias não aparentam surgir do próprio solo do vivido.

a categoria com suas leis e produz em simetria a do desaparecido. O texto em primeira pessoa ofeB6 Calveiro não escreve uma "fonte". transformando-o em aigo que deve ser visto antes de analisado. que as condições do carnpo podem conduzir à tentativa de suicídio de Susana Burgos e outros: nessa curta enumeração. torturada. com os espaços entreglÌes ao impulso dos desaparecedores e os espaços regulamentados até nos detalhes mais insignificantes' outros presos. A máquina inexoriivel tinha se apropriado zelosamente da vida e da morte de cada um". rece um conhecimento que. A vítima não procura úma identidade em sua biografia. não poderia ocultar (seria não só impossível muitospresos gesto e que todos os desaparecedores reagem diante desse como absurdo) que foi uma detida-desaparecida. mas no dispositivo intelectuáfcom que rnonta seu argumento. A liberdade de leitura (uma liberdade intelectual e moral) se encontra mais segura nesse terreno do que no da primeira pesB7 . Teresa Meschiati. não vem dar seu testemunho. O tempo passado não é o do testemunho e de sua dimensão autobiogrâfr. experiência e as condições que a proYocaram. amiga querida. Pilar Calveiro. Calveiro não assume o lugar que lhe cabe para escrever seu Ìivro porque procura uma interpretação que é mais possível se suas fontes são outras. porque ela procuÍa ser reconhecida em outro lugar e por outros motivos) é recidos. mas recebê-lo de outros detidos-desapa- solidariedade nem a simpatia. mas Calveiro se recusa a citá-ia. Mas há umas poucas e mínimas inscrições autobiográficas: seu duz a do pensamento totalitário. a vicia cotidiana dos desaparecedores. mas não põe suaexperiëncia no centro. claramente indicada nas fontes testemunhais que o texto menciona e cuja procedência se esclarece em notas. como cita as iembranças de tor generahzado. Quer provar. Ela. Calveiro não se apresenta como uma testemunha. tanto pelo imediatismo da experiência como pelos princípìos morais que foram violados.Mas não era tão simples. mas exclui Calveiro {g9se dom.uraa dedicatória:'A Lila Pastoriza. sobretudo em suas hipóteses mais gerais. Essa mudança de lugares (gr1e não enfraquece a A dimensão autobiográÍìca quase ausente cede lugar à dimensão argumentativa: onde se devia falar em primeira pessoa. a lógica do campo' que reproEla constrói uma distância analítica com respeito aos fatos. que recupera como matéria de uma análise que ela mesmarealíza. Claro. Seu objetivo não é provar que o campo foi tão terrível que ela tentou se suicidar. mas como uma mulher em cuja vida houve o desaparecimento e a tortura. seu caráter extremo é uma espécie de blindagem que o cerca.47 . os passos da resistência e os da delação. Calveiro renuncia a essa proteção de uma auto-referência empírica.ca. Por isso é possível concordar ou discordar do que afìrma. perita na arte de encontrar brechas e disparar contra o poder com duas armas de altíssima capacidade de fogo: o riso e o deboche".mas o da análise daquilo qlre outros narrarailì e da elaboração de classificações e categorias: o tipo de tortura. jogando uma partida de truco que telrì como fundo solforo os discursos de Hitler. não quer usar seu corpo como base testemunhal. Analisa a último de liberdade com o exercício mais extremo da violên- cia. fala-se em terceira. a detida-desaparecida da ditadura. em vez do eu. Mas. a coexistência do legal e do ilegal. Suavida está ali. Se uma detida-desaparecida fala de sua experiência à carcerâria emprimeira pessoa.aolado do de Lila Pas- da quebra do segredo para induzir a urn terde subversivo que toriza. do completamente secreto e próprio nome e seu número de pr esa. sobre quem sesxerceram todas as violências do terrorismo de Estado. de modo mais amplo e intelectual. surgem os testemunhos de terceiros. de certo modo' tem caráter indiscutí- fazpafie dos outros. Calveiro vel. Uma sociedade concentracionária se desenha exceções. o discurso resiste discussão inter- pretativa (como assinalou Ricceur).

indiretamente. não sua experiência. aqueles presos que já não pertenciam ao mundo dos vivos porque tinharn abandonado toda pulsão de vida.em ieÍmos mais ampios que os da experiência sofrida. afinal. que ordena a exclusão do eu. Assinalou que a v et dade da Lager estal. cujarelação com os fatos é dificil de pôr em dúvida (deveria se demonstrar. que faltam à terceira pessoa. justamente pôrque â experiência intransmissível. Seu ro lugar no mais acadêmico dos espaços sem exceçÕes. C que Calveiro faz com suã âxperiência é original com respei- to ao espaço testemunhal. Calveiro sacrifica não apenas) como se poderia pensar. à idéia de Levi.Jo Lager afetavam os "muçulmanos". Nessa cessão da primeira pessoa. Ela"afirma que a vítima pensa.ão y iy a s. isto é. por exemplo. soble a i'erdade final do Lo. mas do exíiio no México.primeira pessoa tem um direito e uma capacidade impositiva. a riqueza detalhada e concreta da experiência. qr-re. cercada pelos que sobreviveram para falar e responder assim. que se trata das rnemórias de um vigarista) e em que é preciso muita desconfiança ou m â-féparadiscutirsuas asserções. onde ela pesquisou e incorporou os instrumentos intêlectuais paÍa escrevê-lo. Seus terics oclipan-r esse vazio rjeixado pela oo Bg . até em seus níveis físicos rnais elementares. de presença. mas como analísta do testemunho de outros. até mesmo quando está à beira da lducura. da típica vítima. sofrimento para ser justa.a Ítesses hornens n. Frimo Levi escreveu extensaìnente sobre como as condições .teriam i-rma palavra a dizei. mais Assiiralou tambén: qlre nas categorias de presos nas quaís ele mesmo se inscrevia.ger. irrecuperável.xa de ser vítirn a porque pensa. nos termos de uma disciplina social e de uma condenação moral e política que prescinde do próprio livro não decorre da prisão e da tortuïa. Renuncia à climensão autobiográfica porquequff escrever e entender. aqueles cujo testemunho jamais se poderá escutar. seu caráter. intratávei. situando-se em primeie no gênero mais pesadamente escolar: a tese de doutorado. incluir seu jul- gamento. pega outro cami- nho igualmente complexo: não falar em nome próprio. Afirma que a útima dei. mas sua autoridade imperativa. Calveiro não se apresenta como testemunha. Nessa posição ela pode se mover com alegitimidade de quem expulsou o próprio testemunho para soa. Também aqui há uma reticência: Levi se vê obrigado a falar em lugar dos que não falam.só os inor- tos. Diferentemente do eu de um testemunho . Calveiro.

identitária. Mari9o por de uma história contada ao vivo por seu protagonista ou 97 . como "lembrar" o que nãose viyeu. percoÍreu um longo caminho nos estudos sobre o século pelo que Young denomin a carâter vièârio da "lembrança". no começo de lembrança comemorativa e cívica dos "lugares de termos memória".'pergunta-se como "lembrar" aqueles fatos que não foram diretamente experimentados. Nas sociedades modernas' essas da escuta direta são crescentemente midiáticas. As aspas que sÍrquadram a palavr a lembrar indicam umüSb fi gurado: o que se "lembra" é o vivido. embora sejam fontes mais próximas no tetrtpo' o de Burckclássico de Fustel de Coulanges sobre os romanos ou fonhardt sobre o Renascimento. heróis fundadores e se tampouco At memory's edge. "Lembiar" se ãiferencia de lembrar James Young. Aqui me proPonho a examiná-la' Hirsch e Young assinalam que o traço diferencial da pós"lembranças"' memória é o carâter ineludivelmente mediado das direta Mas os fatos do passado que as operações de uma rnemória e estão ttnida experiêricia podem reconstituir sào muito Poucos mais remotas no tempo. que não designamos simplesmente com a palavra história porque queremos Ela dá salientar sua dimensão afetiva e moral. É impossívei (a não seÍ num processo de identificação subjetiva inabitual.5 . polítìca e até familiar (a lembrança em abismo: "lembro que meu pai lembrava". essa forma de história transformada em relato ou monumento.' Interessa a Hirsch salientar a especificidade da memória" não para se referir à memória púbiica. "lembro que na escola ensinavam". Esses fatos só são "lembrados" porque fazemparte de um cânone de memória escolar. A dupla utilização de "lembrar" torna possível o deslocamento entre lembrar o vivido e e "lembrar" narrações ou imagens alheias A idéia xx. Pós . Trata-se de uma dimensão mais específica em Como de tempo. Young assinala a carátet "vicárío" dessa meinória. desvinculadas tes monumento lembrava").menró ria. esse discurso. por outros. reconstituições "lembrança". anne Hirsch chama de "pós-memória" esse tipo de dando por inaugurada uma categoria cuja necessidade deve ser "pósprovada. "lembro que aquele dos vidas dos sujeitos e de seu entorno imediato' É pelo discuro resto dos so de terceiros que os sujeitos são informados sobre contemporâneos a eles. institucional. que ninguém consideraria normal) lembrar em termos de experiênciafatos que não foram experimentados pelo sujeito.lembrar" usos distintos dos que receberia no caso da ao verbo memória pública. antes. em suma.. por sua vez' pode estar às fatos em apoiado na experiência ou resultar de uma construção baseada como o fontes. . Alertado intermitentemente pelo marco que enquadra o lem- brado. não trata de lembrar como a atividade que prolonga a nação ou uma cultura específica do passado no pÏesenmonumentos. mais íntima e subjetiva ern termos de textura' pós-memória se designaria a memór íadagetaçã"oseguinte àqueia éa (quer dizer: a pósque sofreu ou protagonizou os acontecimentos memória seria a "memória" dos filhos sobre a memóriados pais). te através de seus textos' mitos.

para mencionar exemplos que têm quase um século. O resto são histórias recursivas: histórias de histórias r. embora muito próximo. irrlxir. que tem a memória etn seu centro. Nurna cultura caracterizadapela comunicação de massa a distância. Esse é o sentido restrito de memória.lembrança pública ou reconstituição memorialística da memória de fatos recentes não lrividos peio sujeito que os reconstitui e. algo dito rto conirecido aitavésde rrrediações. com fontes secundárias que não"vêin da experiência de quern ditadura argentina. televisão. Apresenta-se corno novidade algo que pertence à ordern do cvidente: se o passado não foi'zivido. fi1esmo se foivlvido. fotografia são meios de um passado tão forte e persuasivo como a lembrança da experiência vivida.r I ir:amente inencontrável. brastaria denominar memória a captura em relato ou em . . pela imaginação ou pelo conhecimento. A palavra pós-memória. como parecem acreditar alguns especialistas em comuni caçáa. r. seria a caso das vítimas do Holocausto (ou da cxcrce essa memória. maior a influência que terão sobre õ) essas construções do passado: os "fatos lugarãeumfato" O vicário irão é específico da pós-rnenória' Tampouco a mediaçã-o (ou "hipermecliação'] colno escre\re Ybung parafortalecer por hipérbole seu argurnento) é uina quairdade específìca.r rrlt cssidade de uma noção como a de pós-rnem órta.tente. mas não só nela. por isso. não marcam um traço específico que mostre . as rrtediao peso ções fazem parte desse relato.lhidas nos meios de comunicação ou distribuídas pelas instirrit. C prefixo pós indicaria o habitual: é o que vem depois da ineinória daqueles que viveram os fatos e qÌ. e muitas vezes se confundem com ela. como se fosse um traço inédito que pela prim eiravez caracterizasse os fatos de uma história recente. exceto sobre os fatos do mais estrito midiáticos" não são a última novidade. Iro t Ic todos os tipos de discurso païtiï dos quais a memória se . os discursos dos meios de comunicação sempre 93 . Mas mesmo caso Se admita a necessidade da noção de pós-rnem 6ria paru descrever a forma como uirì passado não vivido.tirliano. seu relato só pode vir do sujeitos qlÌe procurâm entender alguma coisa colocando-se. em Young. Por extensão. alé agota . empregada por Hirsch e Young. tnas da escuta davoz (dü-da visão das irnaqcrrs) dos que nela estão impiicacios. ao estabelecer corn cla essa relação de posterioridade. e. A pós-memória. r irs do narrador que Benjamin pensa que deixaram de existir) é r . Obviainente. as vítimas dos Young se estende acercados problemas colocados pelo caráter vicário da lembrança de um passado que não se viveu. A oralidade imediata (as histLrr .'.rllirrórn que ouviu seu protagonista.rlo:. Mas é óbvio que toda reconstituição do passado évícâriae hipermediada. é preciso aclmi- familiar de fatos auspiciosos ou trá- gicos. apoiados na memória deles. em Hirsch. rri{ rói. a .Young a qualifica c0mo "rricária". quanto rnaior dos meios de cornunicação na construção do público. também tem conflitos e contrad tir tambrém que tada experiência do passado é úcriria. e ssir rnernória pode se tornar um discurso produzido em segundo grn rr. já que se estendeu a esses fatos) descreve o caso dos filhos que reconstituem as experiências dos pais.. Jornais. no lugar dos que a viveram de fato. ou simplesmente seus contemporâneos estritos têm deles urìì. chega ao presente.r cxperiência direta (por mais direta que possa ser uma expeii'rrt ia). vídeo.r r lirrrnento desses fatos do passado que não ultrapassam a duração r r lt' rrrla vida. Éssa é a rnemória de segunda llcra ção. exceto a experiência que coube ao corpo e à sensibilidade de um sujeito. ocs. ou o regisa Revolução Russa e a Primeira Guerra Mundiai. Toda narração do passado é uina representação. mas a forma como foram conhecidas. no l.le. I Por isso a mediação de fotografias. Se o que se quer dizer e que os protagonistas. pois implica ições característicos do exame rntelectual de um discurso sobre o passado e de seus eíeitos sobre a sensibilidade.

nìjma história em quadrinhos. Victoria Ocampo começa sua autobiografia com o avô. Sim- subietivo nos plesmente se terá escolhido chamar pós-memória o discurso em ' fatos representados. o que parece completamente desnecessário para se compreender arelação complexa e conflituosa de Sarmiento com seu pai. ela não é necessariamente nem mais nem menos fragmentária. mos admitir) a formação disciplinar? Só a memória do pai. to justiça em termos gerais jetiva. que o< . será que é isso que as separa dos relatos da pós-memória? Se assim f. Hoje.osse. Desde o recimento do pai recónstituída pelo filho. devepartir de fontes familiares e uns poucos documentos. senão o que decorre da ordem da experiência subjetiva e da xx a Ìiteïatura autobiográfi ca abunda em memórias da memória familiar. já que se trata de sua própria família. os avatares específicos da construção de uma"his- deveria ser aplicado. ele o será não pelo esse ditadura examina fotografias.pergunto apenas se correspondem a uma necessidade conceitual ou século se segllem um impuìso de inflação teórica. por outro lado. Se se é a intensidade da dimensão sub_ quer dar o nome de pós-memória à história do desapa_ O gesto teórico parece então mais amplo que necessário. queháo envolvimento dasubjetividade de quem escuta o testemu- que diferencia.deumlado. Só a extremaprivação. além disso.abusca que os firhos fazemdos vestígios de um pai ou mãe desaparecidos e. Sarmienlo. à dimensão subjetiva e mo- ral. Se é para chamar de pós-memória o cliscurso provocado no firho. de outro. O que o diferencia do historiador ou de um promotor.nem mais nem rne_ nos mediada do que a reconstituição realizada por um terceiro. ajovem arqueóloga que chega da França para descobrir morte do pai não está de certo modo reduplicando os métodos da tese que foi realizar no planalto pampiano?'Se as condições da forte envolvimento da subjetividade parece suficiente para se denominar um discurso de "pós-memótia"..funcionam e não podem ser eliminados. Em princípio. quando descreve as etapas de sua 94 não terem sido traumáticas. esse nome só seria aceitável por duas características: o envolvimento do sujeito em sua dimensão psicológica mais pessoal e o caráter não . esses capíiulos de seu livro receberiam o nome de pósmemória. mas onde aparecem. mas o envolvimento é o carâter caráter lacunar dos resultados. o esteticismo e a vibração moral do retrato de sua rnãe e as operaçÕes de invenção. o que os distingue não "pós"daatividade que realizam. ou sobre eles.profissio_ nal" de sua atividade. mas dela se diferencia por ser perpassada pelo interesse subjetivo vivido em termos pessoais. que. por seus brasões. O fato de essas mernórias familiares de Sarmiento ou Ocampo tória oral" em q*e sua subjetividade está envolvida. muitos problemas do historiador?r E. o historiador percorre os jornais.para entender esse começo é perfeitamente inútil o conceito de "pós-memória". nem por seu caráter vicário.lhe permite afirmar-se como filho de uma linhagem. de sua mãe. o isolamento completo ou a loucura se subtraem a eles. nem mais nem menos vicária. a construção de um passado por meio de relatos e represen_ tações que lhe foram contemporâneos é uma modalidade da história. não uma estratégia original da memória. isso se deve à trama biográfìca e moral da transmissão. começap ela história de sua familiae a reconstitui (bem arbitrariamente. a prâtica de uma equipe de arqueólogos forenses no sentido do esclarecimene da o nho de seu pai. O que faz Art Spiegelman senão pôr em cena. não se trataria de uma noção que só serve para se referir a fatos terríveis do passado (o que implicaria a defini-la por seus conteúdos)? Tendo acte\ de preferência. Não tenho nada contra os neologismos criados por aposição do prefixo pós.recriação de uma família que. assim como o filho de um seqüestrado pela pesquisa. em Recuerdo s de prov incia. que era amigo de Sarmiento. e não só de suas obras. em teoria.

Corrio se viu. mas se dá através do público e da memória coletiva produzida institucionalmente. com capí- tuios em que assistimos à- análise cautelosa de fotos dela com a rnãe.ï { t I Ê i tcoria da pós-memória não ievou em contâ cla esses avatares clássicos l I l (pelo menos essa é a versão de Hirsch. que devem pertencer à geração imediatamente anterior e estão ligados ao pós-mernorialista pelo parentesco mais estreito. Mas os estudos de rnemória (nos últimos anos desenvolvidos memória: fundar um presente em relação com um passado. tanto na Elaafrrma que. aÌi se poderiam afirmar suas pretensões de especificidade. a segunda é que se trata de uma memória em que estão implicados dois níveis de subjetividade (esse é o algLurìento central de l-{irsch. autobiografra. No entanto. que se exibem não só no espaço trágico dos filhos do Holocausto. das experiências e da vida de outros. É essa a dimensão em que se movem os ensaios de Young.ais num aniversário importante (para a família Flirsch. que passa pelo centro exato do que aconteceu com sua própria família). que tende a acentuaÍ a dimensão biográfica com valor identitário das operações de pósmemória). como se os discursos sobre o passado não se definissem tarnbém por sua raclical incapacidade de reconstituir um todo. -. Se o que se quer aíìrmar é que as histórias ligadas ao Floiocausto o são ainda mais. uma observação de Hirsch. sem falar cla explicação de como Hirsch construiu o álburn de fotos familiares oferecido aos p. a pós-memória cumpre as mesmas funções clássicas da apresenta umarelação menos naÍcisista com as categorias. assiin. tiradas pouco antes poï um fotógrafo de imprensa que. é claro). A questão é se a quaiidade "pós" diferencia a memória de outras reconstituições. A noção foi pensada nesse espaço interdisciplinar. como no estilo co-memorativo das atividades que mantêm sua lembrança. a identidade judaica se constrói como conseqüência da Shoah. qualidade do fato rememorado.' rou à rnoda crítica por Lej eune cstudos culturais. inflaçãoteorica da pós-inemória se redr-lplica. em termos de famíiia e pertencimento. Nessa dimensão identitâria. na opinião de Fïirsch. A relação com esse passado não é diretamente pessoal. no fìnal de seu livro. madas pelos novos direitos da subjetivldade. não soube captaÍ a carâtet da relação que une mãe e filha.sobre o tema os quais se escreveram bibliotecas desde e <1ue foi inaugurado por Gusdorf Starobinski e se incorpo. tererrros de buscar 97 nãc E6 se refiram a corno integrar-se aos novos costltmes e rnodas . A primeira é que se trata de utna memórtavicínia e rnediada (esse é o argumento central de Young. oferecendo duas razões para a especificidade da noção. Egs-a noção setornou umdnovi- dade teórica sintonizada com outro apogeu d-isciplinar: o dos estu- dos sobre subjetividade e sobre as "riovas" dirnensões biográficas cleslocamento feito pelo próprio livro de Hirsch. que tende a considerar como um traço específico aquilo que é próprio do discurso sobre o passado). num armazém de banalidacles pessoais iegiti- memória do Holocausto e as estratégias de monumentalização (refutadas pelas estratégias simétricas dos contramonumentos). Ambos coincidem no aspecto fragmentário da pósmemória e o consideram ulrÌ traço diferencial. que discute apenas a pós- cm quantidades industriais. sobre todos os temas e identidades) citarn a noção de "pós-memória" (sobretudo tal como Hirsch além do fato de que sê a apresenta) como se elapossuísse algurna especificidade heurística trata do registro. toda lristória éftagmentária. ffÌas naquele inais amável de imigrantes centto-elrropelìs que se deram bem na Ainérica do Norte e encoiltram poucos traumas en-Ì seu passado qr-le Abandonando-se o ideal de urna história que atinja a totalidade por rneio de certos princípios gerais que trhe dariam unidade. os teóricos da pós-memória argumentam de duas maneiras. em termos memorialísti- cos. no caso dos judeus laicos e urbanos. especificamente naqueles que dizem respeito ao e só mas foi elaborada no quadro dos [:lo]ocausto.

o vazio de onde surge o enunciado. que limitam o campo do lembrável. na opinião deYoung. Mas. A teoria do vacuurn ignora o fato de que essevazio sempre marca qualquer experiência de rememor ação. seria preciso de-" monstrar a incompletude da memória sobre o Holocausto. e enunciá-la. nesse caso.essacorrente é verdade do Lagerestá nos mortos. hoje o Hoiocausto não é é designado umainterpretação de sentido riência. de urn Ìado. O aspecto fragmentário de toda memória é evidente. na medida em que defina outro espaço (entre o fato e sua memória) onde ocorra o discurso e se operem as condições de possibilidade. metodológicas e ideológicas. Só na vazio entre a lembrança aquilo que se lembra. subjetivas sociais do tipologias e os modelos narrativos da expe- transcendente e inflexão religiosa. otraumaque cria obstáculos à emergência dalembranjárealizados que incidem como guias de avaliaça. para produzi-lo como Presença discursiva com instrumentos que não são específicos do tra- momento em que entïaram em criseãs grandes sínteses des totalizações: desde meados do século xx Esse aspecto e as gran- tudo é fragmentário. as câmaras de gás e os crematórios só podem ser é cheio de retórica e de avaliação. que. trata-se de um sistema de defasagens e parece lacunar. é um reconhecimento exato de que a relnemoração opera sobre algo que não está presente. que jamais poderão voltar para mais sugestiva do que sólida. Arma-se assim urna espécie de corrente metoními- teoria do irrepresentável do Holocausto seria possível afirmar a prevalência d ovazto sobre a palavra. mas de muitos trabalhos de reconstituição do passado: em especial.temo direito de fazê-lo.u do e balho de memória. a menos que se pense que seu aspecto fr-agmentá- rio vem do fato de não se ter conseguido reconstìtuir cada umdas acontecimentos (pretensão algo primitiva em termos de método. de outro. O aspecto fragmentário não é uma qualidade especial desse discurso que se vincularia com seu "vazio" constitutivo. reconstituídos arqueologicamente. a outros "vazios". Filosoficam ente à la mode."Ou se deseja dizer algo mais que isso. mas uma característica do relato. os juÌgamentos ção.rïimplesmente se está jogando sobre a pós-memória aquilo que se aceita universalmente desde o O aspecto fragmentário do discurso de memória. Young passa sem a menor dificuldade por cima dovazio deixado pelo Holocausto. essa evidência se transfere. Se alguém quer cha- embora represente umvalormoralno sentido dequ e cadaumadas vítimas tem direito à reconstituição de sua história. embelezada por todos os prestígios teóricos. no aspecto pessoal. Ou também qlle o centro damâquina de morte. o vazia cuja iembrança é recortada com dificuldacle €tc. sem maiores exames. não se trataria de relatos lacunares. um acontecimento maciçamente cercado de interpret ação: aprópria palavra com que A"vazio" entre a lembrança relato da memória: as aquilo que se lembra e é ocupa- do pelas operações lingüísticas. E um vazio obviameíte única). etc. Mais que de um vazio. fora dessa convicção de Levi. até a mais banal. porque acredita que a as razões aidéiadevazio deixada pelo Holocausto. discursivas. a que se poderiam acrescentar o vazio constitutivo do sujeito. mais que uma qualidade a se afirmar como destino de toda obra de rememoração. a história oral e aquela que se apóia em registlos fotográficos e cinematográfÌcos. os princípios morais. e do caráter tnevitavelmente lacunar de suas fontes. Primo Levi avança por esse caminho. fragmentário decorre. o. e sim impossíveis. mar esse sistema de "v-azio".para admitir que sua memória tem mais lacunas do que outïas. Na verdade. e deveria demonstrar que essa extensão é des- critivamente adequada. 99 . Mas. religiosos. essa teoria não poderia simplesmente estender seu domínio. pontes teóricas. Como é iinpossível contradizer gB sobre morte e repressão. do vazio dos judeus na Alemanh a e do vazío que está no centro da experiência da lembrança. Em outros casos de discursos cadeumvazio para outro.

sentidos ao tentil não urn ícone fetiche que encerraria seus representá-los.Young recoïre à teoria do vacutnn. são irrepresentáveis porque a e. Mas Didi-Hubermân dedica sua análise a essas quatro imagens do crematório para.Young quer dizer que Libeskind não anulou o problema. imperfeitas. que a questão não ficou irresolvida e que há um cânone estético fìrme (de instalações e coniramonumeritos) que exerce seu poder simbóiico no presente. porque não tocou no núcleo assassino da verdade concentracionária. e Fora do Lager. têm condições de dar próprio projeto devia resolver. quase de imediato. mostraï que atrguém. uma noção de 'tç-cuttnt. Não há imagens de um crematório em funcionamento. e incompleto. tham a incompletude típica de toda lembrança do passado. aqueles sobre os quais se cumpriu devez o destino concentracionário. até quancio já se tl'ansformaram em tópicos clássicos. diante de proclucões discursivas ou estéticas contemporâneas. Mas se se quer dizer que. isso é uma verdade óbvia. Ì{ão se descarta sirnplesmente a resposta que impõe uma versão 100 :li'. como indica Primo Levi. porque teria"respondido ao problema a Didi-Huberman: "Custasse o que custasse. Os mortos. que essas imagens. apagadas. de representa- deixando-o sem solução". É notávei o conio1 . era preciso dar uma forma àquele inimaginável". o irrepresentável do Holocausto é a ausência daqueles documentos que foram sistematicamente destruídos. salienta a aporia dos trabalhos de - éa experiência da quai não é possível reconstituir a - memória (e de seus monumentos Se se e contramonumentos). exceto as quatro fotografias tiradas por um preso e analisadas por é necessário se precaver contra qualquer resposta que prodnza uma clausura indesejável. diz Levi.n uma fórmula tão atraente como nebulosa. quer dizer que uma questão estálite- testemunho. ao mesmo tempo que encontrou uma solução paÍa o projeto e a efetivou. são urna base à perpetuidade. de um lado. menos se pode pretender responder a elas. por defìnição. não o tornou invisível aos visitantes do novo ediftcio.:rãiiitr a teoria do vazio representacional e da mostram.'O que sabemos do Lager éfragmentário.'A fórmula paradoxal não signifi ca tanto como suas pretensões. de outro. e se transformaram em tóprcos (a Shoah. mas essetestemunho. já que será retomada de modo inevitável com novos instrurnentos teóri- cos e em novos contefios significativos.periência em que culmina o Lager a câmara de gás coisa alguma. tornou-as possíveis e. que afrrrna. Os exernplos trazidos do campo artístico que young analisa qualidadelacunar da reconstituição memorialístlca forma um sistema com outrolugarcomum contemporâneo. peÌa poesia de paul Celan. Salienta o que denomina a "irresolução perpétua".. com exclusão de outras.daquilo que não existe senão na ausência. conservou os dados que seu ção posterior. assim. por conseguinte. quanto mais irnportantes são as peïguntas. os desaparecidos) justamente porque não perrnanecerarÌ ir resolvidos. urn prisioneiro que arriscava tudo. euando analisa o projeto do museu judaico de Berlim. sobretudo porque houve urna decisão política e um espaço concentracionário que se propuseram liquidar toda possibilidade dq comunicação com o exterior e. Só os que se salvararn. longe do impacto qì-te pÍovoc ou o dictum de Adorno. emvez de apïesentaï esse argumento simples. e obriga-se a continuar ligado a ela só porque é quase sacríÌego afìrmar que os trabalhos da rnemórja coinparti- para imaginar o Lager. embora seu destino futuro seja o de ser revogável. deDaniel Libeskind. consideradcs em selr conjunto. Mas. o que se afirma é. mas Young recorre uma fórmula com a qual acredita deixar estabelecidos os méritos do projeto. mediante outro léxico.: :.I ï No entanto. urn só tempo obrigado e coer- ralmente aberta citivo (pois exeïce sua força potencial:sobre os sobreviventes).young recorïe ao paradoxo e. que. um problema está iro atual momento aberto à irresolnção.que. como demonstra urna análise brilhante de Georges Didi-Huberman. respondido.

a todo discurso não autoritário são atribuídos essestraços e. se definiram a . É dificit concordar com uma definição tão totalizante como taxativ a.longe de se afastarem datotalização. pela resistência àtotalização e por sua própria impossibilidade. devem estar em outra história que lhes garantisse sentidos e seguisse uma trajetória definiclaporumateleologia quelevava da queda à redenção revolucionária. os discursos da pós-memória renunciam àtoÍalização-não só porque nenhuma totalizaçáo é possível. Se há diferenças. E é notável como traste entre o discurso do "aberto".'iq&. não adianta identificar apenas uma forma invariável' As diferenças que são Se se política nos anos 1960 não foi dubitativo nem lacunar. segundo a tradição. jâ qt:e. mas a de jovens intelectuais. por conseguinte. a pós-memÓria tem um deci{logo Uma rápida observação do caso argentino posterior a 1955 indica que. eies procuraram uma memória histórica. Os fiihos dos quetinharnvivido naidadeadultasob o pero- nismo procÌrraram uma interprelação forte que unificasse os 103 102 . teve um centro bem estabelecido e uma direção que marcava origem e futuro. Não foi sua condição de fiIhos. com um protagonismo sólido ao qual foram atribuídas qualidades absolutamente estáveis. mais evidentes por seus vazios que por seus cheios. que definiu sua relação com o passado em que os pais tinham vivi- Parte' do. contextos e imaginários.: liderança de Perón eo protagonismo das massas popula- res. transcïeve memórias dos artistas em que as coincidências sobre o que se devefazer como pós-memória do Holocausto são de fato espantosas. osjovens radicais da geração posterior à queda do primeiro governo de Perón procuraram uma internacional unificado e fortemente criador de consensoHirsch também insiste no caráter inacabado e fragmentário que definiria. O discurso histórico com que vam à se único da "pós-memória" sempre encontra o que procura e'par conseguinte. o que lhe é atribuído como específico da pósmemória pertence a um universo generalizads. dia em que. é monótono em seu descuido programático das diferenças entre relatos."irresolde obras contravido" com queYoung acompanha um conjunto monumentais de primeira linha internacional.Aferidaaberta no corpo político do peronismo devia ser rcparada. màs porque elçs são destinados essencialmente ao fragmento. até de modas teóricas difundidas como tendências culturais.A-EXEMPLOS Convém evitar um discurso único sobre a memóri. pelo mediado. que atribuíram ao Povo ou ao Proletariado.longe de adotarem uma perspectiva exploratóúa e hipotética. depois da crise e da crítica das filosofias da história. as subjetividades que lembram e a memória que produzem' Esburacados. foi o fato-chave: traumático para quem não conseguiu enten- EXEMPLOS E CONTR. O desaparecimento do cadáver de Eva Perón configurou simbolicamente uma reivindicação do corpo que sub- jugou um vasto imaginário político. Caracterìzado pelo lacunar.até pela vingança. Eles montaram um discurso que princípios da época tanto no âmbito político como nas correntes ideológicas que prevaleciam no nacionalismo revocorrespondia a lucionário e na esquerda. do "fragmentário" e do ignoradas provêm de origens sociais. No campo artístico.longe de resistirem a encerrar alguns sentidos do passado.a e a"pósmemória". O diaTT de outubro de 1945. o discurso der seu significado. por sua próprìanatureza. Em vez de uma memória dos pais. {:r . identificaram os que chega- trata do modo como os filhos processam a história dos pais no ponto em que houve fraturas importantes. O corpo roubado se transfor- mou em palavrade ordem para jovens que não tinham chegado a conhecerEvita.

que não foi capaz de entender seu próprio presente. Martín Kohan escreveu: "Os amigos dos pais [da diretora. A experiência dos pais se ea chamada "pós-memória" dos filhos enfrentaram num cenário de conflito agudo. não há fragmeiifâção.] E. Não há vazio nesses discursos. não porque se sentissem diretantente afetados. muitos deles militantes desaparecidos e da geração para a qual o 17 de outubro foi um trauma e uma data assassinados pelo terrorismo de Estado.tt reírne todos os temas atribuídos à pós-memória de uma filha sobre seus pais assassinados.rma certezacompacta. seja porque não podem senão falar desse passado. tem cabimento. é notório que. como filhos. contra a interpretação que seus pais apresentavam. caso tivessem sido opositores. encerrada a ditadura militar os filhos desjovens dos anos 1960. Seja porque esses conternporâneos de seus pais ainda querem ditar as coisas a trabalhosa tentativa de reconsiituição.atos. falaram abertarnente do passado de seus pais e consideraram que eies tinham sido participantes equivocados ou espectadores que não entendiam os acontecimentos. ou mudando o sentido que os movera. mas admite-se isso como quem admite a confissão de uma culpa. para que os equívocos. tomam diante do passado dos pais posições bem diferentes. mas porque isso fazia parte de uma dimensão pública. ainda assim. Esses jovens. que precisou dessa solidez porque a história difundida entre os fìlhos devia ser um instrurnento ideológico e cultural da política nos anos i960 e na prirneira rnetade dos 1970" A época pensava desse rnodo e os jovens pensavafiì de acordo corn a época. claro sinal desses tempos. as fantasias ou as limitações ideológicas das quais eles foram culpados não se repetissem no futuro. uma correcão decidida da memória. Foram filhos que normas da época." Certamente. um Íilme de Albertina Carri. uma versão pessoal per- meada e mediada do período imediatamente anterior que não tinham vivido.Ì0 Os filhos criticaram à tória contemporânea juventude ou rnaturidade Ditado por esse espírito de época. ao cotidiano. sim. ao rnais pessoal da história de Roberto Carri eAna Vlaría Caruso [. para recuperar e privilegiar uma dimensão mais ligada ao humano.atêm-se igualmente a fundadora.f. A]bertina Carri] exibem uma visão demasiado política das coisas ('armam tudo poiiticamente'). sejaporque sempre relacionam a dimensão familiar privada à rniÌitância.. seria r. este.lhos ses Trinta anos depois. Ao fazê-lo. A "pós-mernória" seria. poderia levar a supor que los rubios vale insistir: o filme que uma filha de dois militantes políticos desaparecidos faz a partir do prefere postergar a dimensão rnais especificamente política da história. caso tivessem sirnpatizado com o peronismo. seus pais viveram o corrigirampolíticamenteo modo como reconhecem plena legitimidade a inflexões pessoais e situam a memória em relação a uma identidade não meramente pública. passaddpolítico para superá-1o. o filme de Carri rnostra pouco interesse pelo que dizern dos pais dela aqueles que os conhecerarn.. que valorizam a demonstração da subjetividade. Lo s rubio s. o testemunho no qual se admite que naquele tempo o político tudo invadia. em Los rubios. fi. primeiro governo peronista. e não urna munhos dos amigos de militância roçam ou transitam no registro da'semelhança humana' não são muito menos desconsiderados do que o resto do que dizem". Em vez de construírem. nesse caso. o fato é que para a diretora-fiiha de desapaÍeio5 ia4 . A respeito desse filme. partir de sua perspectiva política.os Ínomentos em que os testeque aconteceu com seus pais equívocos da geração anterior. que os acusaram de ter sevoltado com intensidade para o público e não ter captado a verdadeira natureza do movimento de massas. A mernória devia funcionar como "mestra cia política" para que não se repetissem os as e se a esse opções dos pais referiram A sensação de um exagero político. propuseïzÌm um relato compacto e global dessa hisde seus pais.

que recebia essas indicações no início. A esse campo. onde viveu depois da cap- tura dos pais. Ali já transformada em cavaleira. mas a da infância da dire- à morte. Essa voz em o7f ressoa sobre a imagem da atrtz que representa a diretora. cimentos finais. muito menos a tradução dessas "tazóes" pelas testemunhas a quem recorre. e mesmo a hostilidade. que dá à então meninaAlbertina Carri "a felicidade de ser mal-educada'Ì Como se falasse daquele lugar infantil. Identidade por subtração. O mal. o filme chama"Campinho". Distante das idéias políticas que levaram seus pais nada. o que interessa à diretoranão sim sua infância em outro campo. em of se escuta: "Custo a entender a escolha de mamãe. rnas No "Campinho" ro6 se passam uma cena do começo e as do final. ficarão definitivamente mudas. nos agradee. e por isso não consegue se concentraÍ nos motivos que os levaram à militância poiítica morte. de hostilidade. Na primeira cena. até quando testemunhas evocam cenas domésticas e familiares. reconstituir a si não está presente a lembrança dos pais. Mas acrescenta um dado: Ana María Caruso. pois o por conseguinte. mas cercada por uma família solícita. como o de umlmulher que se nega a ser filmada e foi companheira de cativeiro dos pais da diretora. cuidou da filha recém-nascida de quem dá o testemunho. e. O filme também não atinge a compreensão dos atos paternos. Na última imagem.além do desenhista Oesterheld) todos trabalhavam num livro "por encomenda". num gesto de grito desesperado. Por que não foi embora do país. esses nomes aparecem escritos. procura seus paisna abstração de uma vida cotidiana irrecuperável. que permanecem como imagens de desconhecidos. O colegas dos pais da diretora. ainda sendo assistida pela diretora. a da diretora. Não podia ser de outro jeito. até. graças aumcartaz que não se sabe se é irônico ou se indica um simples paralelismo. já que as razões desses dois militantes. dizem o que já é sabido: que no imagens correspondentes. e mações. as perguntas a que ela procura responder ficam inevitaveÌmente sêãr resposta. O filme começa e acaba no campo. mesma na ausência do pai (conforme o filme esclarece. a mãe deAlbertina Carri. mas ern Las rubios seu anonimato é filme não tem nada a dizer sobre essas duas inforê isso. uma história ilus- trada do Exército. Provavelmente porque se trata davida no campo de con- centração. Por que me deixou no mundo dos vivos". vê-se a atriz. Como as eà testemunhas que encontra são amigos de militânas cia de seus pais. diante do indiferene mundo de seus pais exacerba aos a distância que o filme mantém em relação ao que se diz deles amigos sobreviventes que dão seu testemunho. as testemunhas permanecem no anonimato.cidos as coisas perdem totalmente o interesse. um sinal de separação e. filme interrogâ pessoas que ela considera unilaterais ou equivocadas. ficamos sabendo que foram amigos. em que a diretora escolhe representar-se dupiamente' por si mesma e através de uma atriz que diz seu nome e diz que representará a diretora. ela procura. o que se evoca é a infância órfã. antes de mais tora. A ça. separados de suas Outros testemunhos. que a atïiz "custa" a entender. quando se filma esse campinho.parentes ou Sheratonlo centro de detenção onde esta- vam Roberto Carri e sua mulher. depois de citar uma frase de Régine Robin). embora mantenham com a diretora e com seu duplo uma relação afetiva indisfarçável.entendido é compreee_sível. Carri não procura as "razões" de seus pais. se não forem buscadas na poiítica de uma época. A operação de dupla afirmação da identidade deAlbertinaCarri contrasta com o severo despojamento do nome de outros. afinal. o de seus tios. Pelo que contam. que dá indicações de como estribar para andar a cavalo. Só em letras muito miúdas. Também são anônimos os amigos militantes que dão seu depoimento no filme: caras evozes que o espectador não consegue unir a um nome próprio. ouve-se uma voz em off. Em um filme sobre a identidade. como se tivesse ocorrido ulrì aprento7 ""iç" .

pela atriz que a representa e quando souber quem matou os pais de sua mãe. que substituiria a fracassada exploração da memória. mas fiquei sem minha mãe por seis anos e não tenho mais meu pai. você tem de ir atrás dessa bandeira'e eu dizia'Não. quero ele me dizia:'Não. É quando se ouve em offumdesejo seu não concïetizado: "Gostaria de fiÌinarmeu sobrinho deseis anos dizendo que. concretamente. pelo modelo dos óculos e pelo corte de cabelo. não. mudaram a cor do cabelo para disfarçar sua aparência. também morena. a aftiz que representa Carri diz:"Eramais que evidente que não éramos dali. evidenciam que os sibilidade. sujeitos que pura e simplesmente não estavam em con- dições de escolher. como mandato paterno. quando chegam ao bairro popular com suas câmeras. tal como na insolúvel perploddade destas perguntas: "Durante rnuitos anos pensei que eles lutaram por um país rnelhor. O que valia mais apena?. as pessoas*da equipe de filmagem se situam no lugar dessa identidade passada diferente. é inevitável. por favor. seja o qtre for. E têm razão emfazê-lo porque. Asimagens da diretora. "louros" ou. para os vizinhos.t' I Nesse relato de um sonho. não quero ir atrás de nenhuma bandeira. ou então que os Carri. e da atriz que a representa. não me importa. I-utar por utn país melhor ou formar uma famíiia? Tudo isso são contradições' ì{ão os julgo por seus atos. Minha irmã não deixa". como faziam muitos militantes. a política. toda a família é defiqi{a pelos vizinhos comb "os louros". de uma identidade (paterna/materna) não encontrada a uma identidade adotada como personificação e disfarce. em que talvez só haja um momento de equívoca identificação de Albertina Carri com seus pais. mas outro: um aprendizado de destrezas "normais". era médico. por motivos culturais. Antes desse final com perucas louras. da história não sti pessoal. o filme justificou seu título em vários testemu- SEM LEMBRANçAS Sentir-se abandonado. ro8 pai está desaparecido.ujeitos em condições de responder nem de se defender. me leve com voc ëparaonde você está. Envoltos nessa diferença fìzerarn o fìlme. no caso dos filhos de desaparecirlos. como d. meu vizinhos traduziam a diferença percebida entre eles e a familia Carri em termos ftlicos e de classe (ser louro na Argentin anão ê tão freqüente).iz urna frase do filme. e eu ficar com você. Tiinta anos depois. pelo automóvel ern que andarn. esses filhos de pais desaparecidos dão desses fatos testemunhos diferentes. Seja como for. não me importa. mais contrapõe-se à nada"'. Ao colocar perucas louras. ele vai matá-los. poÍque isso não passa pelo político. Há pouco sonhei com ele' Sonhei que me jogavam em cima dele e eu lhe dizia:'Ai. são coisas que pala mirn continuam penrlentes. 1t)9 . por suas roupas. Um sonho arriicula o exercício de "pós-memória" de Carri com a busca de uma imagem paterna ou materna e. louro. Devia ser parecido com o que aconteceu com meus pais". mas política. força do desejo. A diretora e a equipe do filrne. estrangeiro". As perucas usadas pela diretora. continuarn a ser. sujeitos que não tinham escolhido um destino que incluía a morte como pos- nhos de vizinhos que afirmam que a família Carri-Caruso e as fìlhas eram todas louras lrubias). quero ficar com você'. me leve para a ESMA. não aquele que o filme se propõe afazer. A tragicidade dos fatos tocou ali onde não havia i. não.dizado. desses desaparecidos: "Tenho dezoito anos. microfones e gravadores de som. e ele como que me dizia 'Não. morena. ande atrás dessa bandeira'. por sua aparelhagem técnica de câmeras. "branco. quero moÍrer ao seu [ado!'' E dizia'Não. por três membros da equipe de filmagem também são parte de um dispositivo de deslocamento de um lugar a outro.

que a criou dizendolhe que o pai a havia abandonado. A descoberta dos restos do pai desaparecido poderia se (a organização que reúne os que têr4 pais desaparecidos). na restauração desse homem em seulugarpolítico. viver com a mãe.mostram a outra face de uma reconstituição do pgssado. a nomes de pessoas que não têm um túmulo para que a gente diga que eles estão ali. eu tinha dois anos . anos depois María Laura retornou àArgentina e um sujeito que nãolembra: "É diffcil dar forma a algo que a. encontrou-os. não simplesmente aquilo que foi como pai e em relação às filhas. O filho levaria o pai ao lugar a que ele pertenceu: "Não sei como vou reagir se o encontraï. María Laura e sua irmã mais moça. parece possível chegar a entender a perda.t5 Mas muitos dostestemunhos de filhos de desaparecidos com- María Laura e Silvina não souberam nada do pai. Os utlos e Albertina Carri foram vítimas de acontecimentos históricos semelhantes: a ditadura inaugurada em I976 seqüestrou e assassinou seus pais. estae internacionais e. O filme de Carri e ram num meio em que a política e a miÌitância fossem consideradas um compromisso pessoal a merecer o respeito de uma escolha seu compromisso políti- política e moral. Ambos estariam no lugar de onde se constrói uma"pós-memória ] mas em relação a ela suas operações são diferentes.Tâmpouco eles têm ou tinham a resposta. Muitos testeflaco perdón de dios são de jovens que se sentem mais próximos do compromisso político dos pais ou fazem esfor- munhos de Ni el transformar. mas ço para entendê-lo. Pôs diante da avó as proos em seu vilarejo e reconstituiu. fragmentos de uma história de militante.rjo sofrimento lhes permitiu acreditar que conseguiram entender os pais e as idéias que moveram sua militância? A origem social dos desaparecidos pode ser parte de uma chave dessas diferenças. Poronde passao mainstreamdosfrlhos de desaparecidos: por Carri ou pelos rapazes mais modestos do filme de Guarini e pela compilação de Gelman belecer laços nacionais e La Madrid. que não vêen'l inconvenientes Muitos desses filhos estão sós na situação de reconstituir o passado: "Eles (a família) nem ficaram sabendo que me encontro com esse rapaz cujos pais desapareceram junto com os meus. foram para a França. em relação a quem haviam mantido uma distância entremeada de visitas àprisão. se o entenderem.assim como o filme de Carmen Guarini sobre Hrlos num sentido forte: recuperar aquilo que o pai foi como pessoa. Silvina. em contrapartida. que vivia no Brasil e 110 Í # . mal-entendidos. Sua colocação diante do passado é reconstitutiva áúm exemplo quase que repleto demais da forte subjetividade da pós-memória. tanto quanto lhe vas da ocultação em que transcoïreu sua infância. a uma busca da verdade que não exclui a figura pública dos pais co. lembro de foi possível. uma espécie de repúdio. não se recebe o perdido. no lugar vazio dos desaparecidos não hánem haverá nada." Evidentemente. nem vive- pilados por ]uan Gelman e Mara La Madrid em Ni elflaco perdón de dios correspondem. Não previram até onde chegariam os militares. poderão captar algo do que seus pais foram. no projeto do filho. não sei quais serão os motivos'1'u em se identificar com um grupo verdadeiramente existente. gente não conhece. o çlue se recupera é a morte e o que precedeu a morte.Vou velá-lo no sindicato. Depois de muitos anos. Ele tinha paixão pelo sindicato". esperando que voltassem". Não podiam saber'1'n Às vezes. Eles não têm consciência da história. digamos assim. entender significa pôr-se no lugar do ausente. quando eles desapareceram) não me lembro de nada deles. Outra história: MariaLatra foi enganadapela avó. Formada em paleontologia. os testemunhos de Ni el flaco perdón de dios. convencidos de que." Nesse e em outros casos. que a gente não sabe. excetoalembrança de não se lembrava dela. compor- tar-se como pessoas cr. mim olhando pela janela. Não se procurou os restos do pai desaparecido. enterrôu- pode pôr nome em algo que não se conhece.

. por isso está em condições de tratar seus e for) da primeira geração depois dos fatos. com a indiferen- rn pouco distraída com que escutamos duas tias cujas histórias jii ouvimos muitasvezes.Num lado. No caso dos desaparecidos. mas a forma como a Íì-atura se agïavou pelo silêncio.is com um afeto consolidado rn cxperiência política comum.. que não existiram quando as vítimas foram rnernbros dos setores populares. ressentidos com as escolhas dos fìlhos ou genros.a não ser que ele qual se reserve esse termo exclusivamente para o relato (seja rrrelhor das hipóteses. porque ali a fratura não foi só a da ditadura. rïìas a esposa? É outra realidade social. uma visão diferente da nossa sobre o desa- lrarecimento. estão os filhos de operários (uns 30% dos desaparccidos o eram): "Que aconteceu com esses rapazes cujo pai era delegado sindicai defáfúcae cuja muìher não eraacompanheira. A nossa talvez seja mais intelectual". Ì\4as todo pas113 . urna "pós-mernória'l sirn formas da memóa ria que não podern ser atribuídas diretamente são seus fiÌhos. Carri é parte r. a pós-memória é tanto um efeiio de discurso como uma relação particular com os materiais da reconstituição. com. na sado seria abordável somente por um exercício de pós-mem ória. durante toda a infância. que. Esses rapazes têm. As histórias detalhadas dos desaparecidoS"circularam em comunidades de amigos e familiares. Os íìlhos desses miiitantes estão desesperados com a história dos pais. sustentam algumas certezas. Basta percorrer os testemunhos publicados por Gelman iem aos olhos. É ciaro que ter uma divisão sime ples entre memória dos que viveram os fatos e mernória dos que vivido uïn acontecimento recons- tituí-lo através 7r2 de inforrnações não é a n-lesnea coisa. Liìa Pastoriza.i de uma comunidade tlrrc conheceu seus pais. roubaram até as fotografias. embora inevitavelmente o que permaneçam os vazios daquilo que não se sabe.AÌciraArgumedo \ iì r. no entanto. então. Eísa desatenção não é socialmenteveros- simil nem existe nos rapazes a quern.'e No outro cxtremo social e cultural estão os fiIl'ros crescidos em famílias que nao repudiavam a rnilitância e que conheceram amigos e compa- rrlrciros que podiam falar de seus pa. foi ncgada a história dos pais e de quem os avós. cujas farnílias em rrruìtos casos se esforçaram ern esquecer os desaparecidos. não é um efeito da memória de se desconhece conseqüência do modo como a ditadura administrou o e sim uma assassinato. e La Madrid para que e essas diferenças sal- Não há. em grupos inteiectuais ou classes médias.fieqüência no exílio. Mas isso segunda geração. com os mesmos materiais se fazem relatos decepcionantes e cheios de furos ou reconstituições precárias.cprcsentantes.

marcado pela estagnação econômica e pelabancarrotade centenas de empresas' O Cordobazo foi o prilreiro de uma série de levantes operários em várias cidades e da guerrilha urbana na do tenha por vezes imaginado uma sepaïação metodológica em tr4 l i . mas que se impõem atodos essa universalidade é e de hipo- tética e "depende de uma escolha de valores osvalores quenão uma relação com que atingiu sua existência mais teatral. mesmo que esse acor- popular ocorrida na cidade de Córdoba. Os testemunhos. Os relatos de circulação extra-acadêmica são escritos partindo da suposição de que existe o princípio valorativo. as mulheres) os marginais. pela ignorância ou pela destruição simbólica e materíal. afirmava que a $upo história tem valor universal. os subalternos. para citar dois exemplos clássicos. Só a curiosidade do anti- quário ou a pesquisa acadêmica mais obtusa e isolada da sociedade poderiam. urtãfuação valorativa " com o presente. mas que antes tinha conferido estilo aos primeiros anos da Revolução Cubana. RaymondAron. em maio de 1969. os submersos. as narrações em primeira pessoa' âs reconstituições etnográficas da vida cotidiana ou da política também correspondem às necessidades e tendências da esfera públi- ca. essa força intratável desafia o acordo institucional e acadêmico.r: . dos que não são letrados. (N. em repúdio ao regime do general-presidente Juan carios onganía. depois ao Cor- os homens e mudam de uma época paruoutra". dos traídos. Ném da experiência relação ao sistema devalores que definem o horizonte de onde se reconstitui o passado. A curiosidade tem uma'extensão limitada ao grupo de colecionadores. dos pobres. a juventude como etapa de healing. os jovens como força curativa da naçáo ou da classe. t A história argumenta sempre. Eles formavam o povo dos explorados.:: tugentina. uma história militante otganrzava seus protagonistas ao redor de um conjunto de oposições simples: nação-império. ' r. Por isso mesmo. hipoteticamente. da gente simples.*b. estética e política no Maio estudantil francês. povo-oligarquia.tema *Rebelião independentemente da vontade e darazão. suspend". o passado é inevitável e acomete dobazo* e a quase todos os movimentos guerrilheiros ou terroristas dos anos 1960 e 1970. Quando não se trata de autobiografias de escritores. que dificilmente poderia ser confundido com um relativista. também esses sujeitos contam suas histórias nos meios de comunicação. T') 115 ii. mas no presente. Os "fatos históricos" seriam inobserváveis (invisíveis) se não estivessem articulados em algum sistema prévio que fixa seu signi- ficado não no passado.6. Seu lugar é a esfera pública no sentido mais ampio. Numa signifìcativa coincidência. Hoje o elenco de protagonistas é novo ou recebe outros nomes: os invisíveis do passado. tomam primeira pessoa a palavra no testemunho e na narração em sujeitos até então silenciosos. e ali eles concorrem. Sua força não pode ser suprimida senão pela violência. dos que não governam. também os jovens. Há mais de trinta anos. Como se disse no começo. Sobre a pesquisa.

que o arielismo* do começo do século xx já tinha apresentado em toda a América Latina. e tam_ bém de muitas coisas em que ela. T.turiu . a ser vítimas (a metade dos desapa_ rccidos argentinos pertence a esse grupo). O primeiro detém a anáJise. que . o arielismo propugnavâ a defesa das tradições hispânicas como fonte primordiaÌ da cuÌtura latino-americana...'da história.o se coroca no ponto onde parece mover-se com mais naturalidade: o da verdade dessa experiência.. não é pos_ 1900. contexto dos anos posteriores a 196g. aos sem_voz. mas também não se pode deixar de problematizá-lo.uçuda pero cosmopoÌitismo e pelo materiaÌismo.Falo porque "Trata-se. não pode demonstrar a mesma autoridade. que teve inrensa repercussão e foi referênciaparaváriasgerações de inteiectuais. Eres se*dtaberecern em um. A própria idéia de verdade é um problema. de outro modo. rnas de urna curtura cie época que influi tanto nas Ìristórias acadêmicas corno nas que circulam no mercado. De todas as matérias com que se pode compor uma história. como se vê. A primeira pessoa é indispensável para restituir aquilo que foi apagado pela vioiência do terrorismo de Estado. Iá não é possível prescindir de seu registro. a primeira pessoa.luanJosé saer coioca a política como o rnotivo aparentemente secundário mas subterrâneo se tivesse de faiar (tao hostil a que 'ce uma ficção que transmite o que de mais exato ri sor:re a solidão 177 - . de uma dem ocratização dos atores da história. é uma questão de limites: onde passa a fronteira entre a experiência do sofrimento e outras experiências desse mesmo sujeito? Tentei explorar esses limites. que afirma: "Digo isso porque soube diretamen_ te". e> ao mesrno tempo. se projeta sobre outro (ou o mesmo) sujeito.teatro da memória" que foi desenhado antes e ondãêles encontram O que este -. E. Em Glosa. e ao mesmo tempo são os que se prestam menos abertamente à comparação com outras fontes.-. A enumeração coincide curiosamente com os novos campos cle pesquisa. pelo menos até que muito tempo tenha se passado. vcio depois iria inscrever da paÌavra. sob as ditaduras. os relatos em primeira pessoa são os que demandam maior confiança.. Base teórica da onda de pensaürento nacionalista que se estendeu por todo o contr'- primeira pessoa gera quand. nunca se saberia. la que indicasse como traçá-los de modo definitivo um espaÇo que não depende só de reivindícações ideológicas. mas também nog+neios de comunicação rádio ou tele_ vi53e que começam a solicitar cadavezmais o homem No sofri na própria carne o que conto'. produziu_se a guinada subjetiva: de prom"ssa de renovação os jovens passaram sível ignorar as interrogações que se abrem quando ela oferece seu testemunho daquilo que.ar_ tamente.. polí_ ticas ou identitárias. ou muitas vezes acompa_ nlrando-a como sua sombra. que dá a palavra aos excluídos. A demanda de crença exigida por quem pode dizer. Tentei assinalal alguns dos probÌemas que a primeira pessoa colocava na reconstituição do passado mais recente..) llíì por mirn. à dúvidas que o recurso "Enr nente. de certo modo.ique Rocló pubÌicou o opúsculo Ariel. diria que encontrei na liieratura se estabeleçam sobre ela limites de verdade) as imagens rnais exatas do horror do passado ïecente e de sua textura de idéias e experiências.. aos sern_título. mas o segundo não teria motivos para detê-la. contemporânea do que se chamou nos anos pìo e I980 a "guinada lingüística. sabendo não haver uma fórmue sabendo tamb'ém que devia lidar com idéias que iam em direções distintas: o potenciâl da primeira pessoa para reconstituir a experiência e as da rua. (N. embora a explicação não esgote o potencial cultural dos relatos de memória. o uruguaio José Enr. tïatou_se também de um ato político: Maio de 1968 foi uma gigantesca tomada esse fenômeno nas ciências hum"rrur. o que _ livro analisou pode ser explicado por essa guinada teórica e ideológica.

Há uma palavra que descreve isso bem: regados. A força da descrição sustenta algo que não pôde passar pela erperiência. nem pode explicá-los. Sebald mostra entre quais extremos se move qualquer empreendimento reconstitutivo: desde a perda radical da identidade até a alienação na lembrança empurrada pelo desejo. por essa paisagem de restos humanos dispersos. O comprimido de uma luta e é um talismã que repïesenta de fi.social do militante. poré que já passou o momento em que um retorno possível. É o final de quem não terá Em Duas ção do vezes a experiência da prisão nem da tortura. Essas breves linhas cercam a cratera. resultados do "sonho darazão" tepÍessoïa. em torno do qual mas não sobre se do oficial repressor e do soldado raso para organizar uma"figura- ele-se estenderá o romance. cidade. mergulhado no que Arendt chamou de banalidade do mal. Aquilo que não foi dito.camp o de concen tração. a força da cena não depende disso. No começo de Los planefas. obscena. A literatura. que se corresponde com o desaparecimento do amigo. A notícia abre um cenário de morte que nunca foi descrito desse modo. Membros regados. esse sujeito de quem tampouco há vestígio testemunhal: aquele que soube o que acontecia nos Chejfec se remete a uma dimensão autobiográfica. a perspectiva junho. comprimido deveneno que carregavam alguns combatentes gueïse rilheiros.rl- tudo ou nada dâàaçãoviolenta uma espécie gor metaftsico negativo: um Nada seguro. No romance de Saer. sobre o qual sobre o a fala muito pouco nos testemunhos. é claro. de uma memória onisciente. Congelada e ao mesmo tempo conservada pela narrativa "artisticamente controlada". Martín Kohan explorou torno do centro inequívoco. com a mesma unìlateralidade e o mesmo caríúer absoluto. suposições. é uma espécie de centro secreto. de nunca mais encontrar lembranças nem vestígios que forcem a memória de seu passado de criança que escapou dos nazistas e chegou sozinha à Inglaterra. e o soldado que o assiste com disciplina. Para qualquer lado que se fosse. mas nela um narrador sempre pensa de cativeiros clandestinos e considerou aquilo uma norrnalidade não submetida â exame (o ponto extremo dos que pensaïam que era melhor não se meter). totalmente imune à emoção. separados em pedaços e dispersos".'Um rigor formal extremo permite que o romance se inicie comumaperguntailegível:"4 partir de que idade se pode comessar Isic] a torturar uma criança?". aptos apenas para o epílogo: os corpos desfeitos depois de terem sofrido. o personagemde Austeilitzpassa. Da utopia do não saber. É desnecessário saber a - horror artisticaméãte controlada?'. daí em diante. ainda a centenas de metlos se podia topar com vestígios. não dissolve todos os problemas colocados. a explosão. que aliâs jânão eram mais que sinais mudos. por causa de Sebald. escolhe a morte. a ficção pode representar aquilo sobre o que não existe nenhum testemunho em primeira pessoa: o militar que se apropria de crianças. se apoderar do notícia falava de restos humanos espalhados por uma extensa superficie.fo rtalezab arro ca. sempre impossível. Sergio Chejfec escreveu: 'Aquela foradaexperiência. arrumados em círculos imaginários em u8 119 . O romance fica marcado. repartidos. o desaparecimento do amigo. à utopia da mais obsessiva reconstituição do passado. o vazio por onde ele se desloca com o automa- tismo de um desfecho previsto. essa pergunta inicial impediria constrüir qualquer história. de caminho seguro rumo ao domínio própria morte. Sem o controle artístico. como se os humanos pudessem pesadelo. porque a escalada do horror afgrnaria intransitável. Quando o guerrilheiro já não tem condições de escolher um caminho. mas sim pela imaginação que trabalhou sobre indícios mínimos. o e sua morte. e não apenas sofrê-lo. porque Visitei Terezin.

Einaudi. Routledge. Siglo l. La Découverte. o Holocausto passou a ocupar o centro da conflagr. young. memórías. por exemplo: |ames E. O Ììvro de PlriÌippe Lejeune. crítico literário e responsável acadêmico pelo arquivo do Holocausto da universidade deYale. Entrevista de Primo Levi a . Buenos Arres.aphies: L"ãíseignentent deNìetzsche qLLe etlopoh.43). Paris. em Conyersazioní e intervis- 3. At memory's edge After- Derrida.p.). 2002. EcE.ação e se xxt Editores.p.París. assim como os estudos de Georges Gusdorf e jean de assinalar o caráter porâneos" (Dan Diner.emElegias de Duíno. outono de 2003.Yalencia. Paris. I994.2000. 23-44] I. salvo indicação em contrário.idades.Lanúmoire collective. Comentário de Giorgio Agamben aos textos de Primo Levi ern Lo queda de Auschwitz. arteepolítica: Ensaios sobreliteraturaehistóriadacultura. 2001. tendeu-se a trataÍ o assassinato em ÌrÌassa dos judeus como algo mais periférico. diante da gigantesca confiontação miÌitar. 2002 119981. O mesmo acontece com a palavra "genocídio'] cujo uso extensivo aos mais diversos cenários já foi discutido o suficiente por Hugo Vezzetti em Pasaclo y preselxte..da segunda Guer ra Mundial. Buenos Aires. Escreve pos fixos'i arìs. com acrésci- Anselm Kiefer permite pensar numa inte'venção estética que tem o passado como objeto de uma perspectiva que não reproduz o discurso do artista sobre sua obra (Enbusca delfuturo perdido: cultura y ntemoria en tiempos de globalìzacìón. 15. op.74l). I 985. "Mencionei a cÌescente i'rpo'tância do Holocausto como acontecimerto fundacional da memór. Geoffrey Hartmann. p.I'oubli. New Gernnn Critíque.Walter Benjamin.). em ingÌês como T|te ear of the other. !997. subjetit.fr. Mas tanto Gusdorf como starobinski e não pertencem a ela./ dass wir nicht sehr verlâsslich zu Haus sind/ in der gedeutetenWelt" (RainerMaria Rilke. Nora CatelÌi oferece uma exposição clara dos escritos de Paul de Man sobre o tema. Penso no discurso mimétíco entre crítica de arte e monumentos e con_ tramonumentos. em La pensée as 68. Menschen es schon. reflexões. Durante várias décadas. Daqui em diante.ldentìdad. O artigo de Paul de Man. ComparatfueLìterature. exaustivo o panorama proe porcionado por Luc Ferry ni sm e contemp or ain. Le pacte autobiografrque.GalÌimard. images in conteffiporary art clnd ctrchitectrzr. cit. Á REróRrcA TESTEMUNHAL [pp.'Ach.p. Lumen. Seuil' emL9j5s no 5."Primeira elegia".Hannal. yale universitlz Press. Editora uFMG. apareceu pela Vezzetti:"fa memória] tende a ver os acontecimentos de uma a perspectiva única. Nation and narration.Setí1..es. wen vermõgen/ wir denn zu brauchen? Engel nicht. 1963-1987. pela 19.2003. nicht. I 1.. Delarecherche àI'enseignentent.. 45-65] ti.3a. no entanto. 12. 200 1 mos. se antecipam à moda contem- 14. Prometeo Libros. 12. 199 i ).no 90. por assim dizer. Ia Ínéntoire. Veja-se Leonor Arfuch. Não se pode deixar tornou o acontecimento nucÌear negativo do século xx. L'ère du témoin. a análise deAndreas Huysseu sobre a obra de du nom propre. ecastex@univ-tlse2. 8. Odilio A. é. I991. dezembro de 1979. GaÌilée.tArendt: DióIogos. Turim.BeIoHorizonte.Londres. Hoje o olharnos de outra perspectiva. Didier Guivarc'h. 5. Jean-Pierre le Goff. todas as traduções são minhas).I'histoit'e.Paris. São Pauio. Novayork e Londres. Brasilien se.226. 1998. I'hérítage impossible.p. rejeita ambigüidade e até reduz os acontecimentos a 6.'Autobiography arquéti- primeiravez em MLN. de Levi.ia não só eur opéia. O local da culturq Belo Horizonte. eleonor Arfuch (comp . Contrariamente. political cultures".Em EI espacio autobiográfico (Barcelona. Mai 68. Homi Bhabha. Essa percepção não podia se dar por evidente. um epiacontecimento. 722 r23 . cit. Z. Temos razões para du'idar que essa perspectiva correspoirdesse às percepcões históricas de seus conterr - pioneiro das pesquisas de Fhilippe Lejeune sobre o espaço e o pacto autobiográfico.). 17. Editora upuc.Pion. Veja-se. 13. "Pensamento e narração em Hannah Arendt. Essai sur I'antíhuma- 18.2000. op.lves Aguiar. Schocken Books. em e Leskov']em Magiaetécnica. Giobo. 16. Buenos Aires.tradução de Dora Ferreira da Silva. Com uma perspectiva crítica. Annette Wieviorka.94. P Alain Renault.NoiaYork. nrjetos.i em Homi Bhabha (ed. 2000 | 1998] i 0. e na série de seus artigos em Punto deVista. "O narrador: Considerações sobre a obra de Nikolai porânea starobiaski. 4. 1984. "Restitution and memory The Holocaust in Europea. São Paulo. assinala essa dimensão: "o dever de escutar e de restabelecer um di:ílogo com pessoas que foram marcadas por sua experiência de tai modo que a integração total na vida cotidiana é apenas aparente" (em Wievío rka./ und die findigen Tiere merken 3. narrative and the margins of the modern nation. foi publicado em Paris. Publieado no ãió seguinte. cRÍTICA Do rËsrEMUNHo: sutErro E EXIERTÊNcr [pp. 9. qu"e Marco Vigevani.2001. p.2. de-facemenC'. "DissemiNation: Time. Newton Bignotto e Eduardo Jardim de Moraes (orgs. otobiog. Groupe de Recherche cn Histoire Immédiate. ).Pretertos. Paul Riceur.222.vol.2003.desde os anos 1990.

Ricceur. H.. cambridge univer sity Press. op.Nos ultimos anos. "Cuando la política era joven l Punto deVista. Buenos Aires. 2003. como aponta christopher van Ginhoven Rey.TheLittle School:Tales ofdisappearance andsurvival. e Tempo e narrativa. Durham e Londres. nisme des images. assegura as transmissões e se condena a uma essencial impu- peruana. 3A7 -8' Didi-Huberman sugere que objetos nos colocam diante de um tempo que 6. Devant le temps: Histoire deI'art et anachro- finalidade" ( op. pp.dezembro de2000. Uma antologia de textos e um panorama histórico podem seÌ encontrados em Beatriz Sarlo. A memória coletíva" São Paulo. cit'Tambémos estudos de Andreas Huyssen para os casos Eduardo Ânguita. Duke University Press.P6S. I'histoire. a discussão sobre museu e monumento abriu outro capítulo. veja-se Diana Tayl or.1. 1997 e 1998. Companhia das Letras e Editora da urMc' 2005.pp.1996. Assim funcionam os detalhes num relato tão clássico que no a non fictíonoto romance documental de Miguel Bonasso. Buenos Aires. Em seu trabalho muito interessante sobre memória popular do fascismo (Fascivn in popular mentory. A verdade do que Cámpora diz ou olhares Aires. I' ouhli. Disappearing acts: Spectacles of gender and nationalism in Argentina's" Dirty War".. Riccur. Paul e alemão. S.2005)' 9. departamento de espanhol e dimensão memorativa da história sem aceitar. mimeo.Ijcc:ltr. 13)...no 58. no caso argentino: Graciela Siivestri. 1997 ' Por mais observações mínimas: o modo como Héctor Cámpora mastiga um bife. Vértice' 1990' Annette Wieviorka afirma qu-e o testemunho se desenrola de ângulos "que pertencem à época em que se realiza. anacrônica em seus efeitos de montagem. p. 126. I' oubli. e Reconciliação entrelaça suas fibras. La mémoíre.vol. Riceur. Essa capacidade constitui sua dimensão reflexiva originaÌ.Labatalla delas iàeas. Chego l2. 13.. atribuindo-lhe fins que dependem de apostas políticas ou ideológicas. que não é exatamente o passado. 5. Veja-se B. àeMarlín Caparós e Vista"r. tem um nome: é a memória [.l- sobre os deslocamentos de tempo e de interpretação. publicado em Punto de 2. que colocam enigmas e PergÌlntas memoría"Madri. Siglo xx1. preocupando-se especialmente em considerar a capacidade do relato de se desdobrar em duas temporaìidades. em que Car'- Altamirano escreveu o capítulo sobre as posiçÕes nacional-populares. Sigloxxr de Espanha Editores.200l. 2002. cit. ultrapassa os marcos de uma cronologia: "Esse tempo. junto com ela. El arte en los límites de Ia representación".Identìdades.Buenos los Wieviorka. 1995. 14. É muito interessante o caso da Conìissão da Verdade . agosto de 1997. P. em sua forma. Luisa Passerini trabalìa a português. EI presidente de seiscentas páginas se rePetem as /ue. na medida em que toda transição procura reconciliar não só a sociedade civil consigo mesll]a. Tempo e rtarrativa. Por exemPlo. Retomo algumas idéias de meu trabaÌho Á paìxão e a exceção. cit. que integram um "dispositivo de prova". 162 ss. 36-7' De acordo com Jacques Rancière. pp.2003. 1997. mas também a Iógica política com a 1ógica do Ìuto" ("La construcción delafuenteylosfundamentos de lareconciliación en el Perú:Análisis dellnforme Íìnal de Ia comisión de Iaverdad y Reconciliación". Paul 10.pp. EI tren de Ia vìctoria: Una memória é saga famillar. norte-americano 3. oP' cit. 16. a Sudamericana. Norma. Georges Didi-Huberman.p. seu terno enfeitado. Minuit.] q"e humaniza e configura o temPo. sua fixação no inconsciente e suâ dimensão anacrônica". Amemória é psíquica em seu Processo. Não se pode aceìÏar a' um'instrumento terapêutico' essencial para a reconciliação. Universidade de NovaYork. Elizabeth Jeiin escreve:'A uma fonte crucial para história. que contribuempara criar uma ouvárias memórias coletivas erráticas em seu conteúdo. Buenos Aires. Ben- Sobre Partnoy.75). Nesse artigo também se mencìonaLavolun' tad..San a este livro graças a Francine Masiello. 7. 15.AliciaPartn oy.Ariel. e verossímii como 1 1. a exPor uma experiência fictícia do tempo e. esses la z émoire' l'histoire. 1987).e reproduzido emL. reza 1. a ficar ligado ao tempo em que se escÌeve essa experiência' Cristina Zuker. a do momento de contar e a do tempo do narrado. faz na esfera política está apoiada na crença construída por esses detalhes. Midnight Editions. I92.Paris. op.no 6. : sujetos. PÌaneta.Arfuch (comp. Sabe-se que Riceurretoma veniste e aperfeiçoa as noções de história e discurso propostas por E. a partir de uma interrogação e de uma expectativa que também lhe são cónternporâneas. Francisco. assinalando que o testemuúo é ineludível na medida em que o objeto do historiador for recoustituir a íorma como uma colÌfiguração de fatos impactou os sujeitos contemporâneos a eles' 17. subjetividades. Veja-se. p. Maurice Halbwachs.Siglo nv deArgentina Editores. Weinrich.. 2000. seus para as muÌheres. de um Ìado. Papirus. em sua função e em sua mesmo (e especialmente) em suas tergiversações. A citação de Rancière é de "Le concept d'anachronisme er la vérité de I'historien I tlnactuel. Buenos Aires.Yezzetti. em seus deslocamentos e negaabertas à pesquisa" (Los trabajos de Ia ções. 4..canrbridge. de outro.204-5' B. que o habilita. a cvn "reconheceu desde o início que o testemunho'é também uma forma de processar um luto longamente postergado'. de reconstrução ou de'decantação' do tempo. clau- dia GiÌman estudou os debates intelectuais nesse período num livro excelente: Ia plumayla espada. 1986.). "Memoria y monumento. Campinas. Para uma perspectiva compara- L24 t25 . São Pauìo e Belo Horizonte.

op.Todo nada (Brenos Air:es. As negociações prosperaram) mas foram interrompidas pouco depois da renúncia de Cámpora.. em contrapartida. 1983. 9 Ì. formavam uma biblioteca política popular. por motivos administrativos e de pesquisa. 199 i ). Art Spiegelman. Pilar Calveiro. I9. viajou várias vezes a Santiago. Nueva 4.eda série de obras das rnais diversas linhas da tradição marxista surgidas nos Cuaclernos de Pasaào y Presente.an). a rracso manteve a sede em Buenos Aires como instituição privada.15. Carios el signo delas masas. 21. Há uma edição de Siglo xxl. Ariel Historia. Sudamerica. primavera-rrerão de 2003) estucla as memórias sobre a perseguição aos judeus e o Holocausto escritas por historiadores pÍofissionais.viajou a paris no final de 1977 ' Em março de 1978 juntou-se à sede mexicana da FLACSo.Aceitou Altamirano. ARcUMENTA-ÇÃO lpp. rlr. Ípola foi nomeado membro do comitê de Direção e professor. interrogado.Ahistórìa àe um sobreviyente. com maior participação dos historiadores profissionais. 1997.mas esse pedido podia ser negado). Em 1 970. quando exercia a docência na universidade de Montreal.são paulo.cap. Estudos sobre as ctrigens do peronismo. preliminar".rratìye and postne. mas fazia parte de um campo de publicações. Family frames. em 1 969. Bajo 20.2005.2. difereniemente do texto de"Labemba'l o-rr3 ] Young. Formado em filosofia pela Universidade de Buenos Aires. foi incluída e m Ideología y discurso popu/lsra" Buenos Aires. Paolo Rossi. Historias'Ìúemoir s".rÊNCrA E. |uan Gelman. "La bemba'l de Emilio de Ípola. por volta das duas da madrugada. parajuntar-se ao corpo de professores-pesquisadores. 2. Historia del sìndicalismo (dirigìda por Alberto Plá). e. nrory. por duas razões: Popkin só anaÌisa memórias e autobioglafiasno estrito sentido genérico. No diaT de abril de 1976. Residiu no México até março de 1984. B7-8. Página/ I 2. BrasiÌiense. exaustiva numa obla muito sensíveÌ também à representação de sensibiliáades revolucionárias. o partido socialista e o Movimiento de Izquierda Revolucionaria (r. recebeu um convite da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (rlacso). Entre 197 4 e i 976. Ficou pouco mais devinte meses na prisão. RECoÌ\TSrÌ rurçÕES [pp. Colihue. I .Buenos Aires. pa-ca do. no contexto do artigo 23 da constituição' modificado pela Junta Militar (a norma modificada autorizava o preso a transferido para A captação do clima ideológico é."Cristianos en elsiglo'l em Beatriz In batalla de las idcas. cit. Desde então vive na Ârgentina. i 998. el olvido. um estudo cujo eixo é a histór'ia das ideias. Mas se trata de uma história. foi preso em casa por um comando do primeiro corpo do Exército. que realiza. Poder y desaparición: Los campos de concentración en Argentina. Nessas viagens. em 1964. Hìstory o-nd Mentory. e estas. De toda maneira. Instalou-se em Buenos Aires em 1974. com sede em Santiago. Maus. 6S-BS] 5. a propósito do Maio de 1968 e dos anos seguintes. Cambridge (Mass. 1973. e mesmo Polémica. a FLACso iniciou negociações com o governo de Cámpora para criar uma sede em Buenos Aires (mantendo a princípio a de Santiago).tiva com o caso francês. rós -realróRrÀ. Corn_ foram escritas bem depois dos fatos que narram. importâncía de uma revi stacamo Pasadoy Presente. como o a biografia de Roberto Santucho e a história do pnr. Marianne Hirsch. no qual os fascícuÌos do Centro Editor de América Latina (que se vendiam em bancas de jornais às dezenas de miÌhares) 3.saiu"por opção". Buenos Aires. veja-se o já citado livro de Jean-Pierre le Goff.Buenos Aires. Jarnes E. pp. EXPER. nu 1. como Siglomut'rdo (dirigida por iorge-íafforgue). A respeito de Maus. São Paulo. em particular para o Movimiento de Acción popular obtinham a maior difusão em massa. e não de testemunhos.2001. Folios Ediciones. foi o trabalho de ]uan Carlos Portantiero e Miguel Murmis. "En ei campo de detención estás en otra dimensión'. 5. op. Aacìreas Huyssen assinaÌa que sua 726 114 .Veja-se o "Estudio SarÌo.) e Londres. que podia ser encontrada em toda Argentina. As coleções do Centro Editor.Yeja-se. d eMariaSeoane. a unitária obrero campesino (varu oc). uma história argentina dirigida por Haydée Gorostegui de Torres. Jererny Popkin ("Holocaust Memories. 2005. a superintendência de segurança. com fon- marino) e ies documentais de todo tipo. siilplesmente rle uma reconstituicão à base a saída do país. Depois do golpe de Pinochet. a pedido dos interessados costumava levar correspondência para membros de organizações de esquerda chilenas.vol. 2003. e doutor pela universidade de Paris. 1o de novembro de I 998. 3. 2. panhia das Letras. solicitar 22.para uma história das idéias sobre o peronismo. Harvard University press. la memorìn. 18. A em 1971. Pasado y Presente reptesenta o níveÌ intelectual mais sofisticado. A mais proeminente. 4. não é um dado isolado nem excepcional do período. dirigidos por José Aricó. photography. seguramente. na. Buenos Aires. Suas observações interessantes dificilmente podem ser projetadas no caso de um cientista social corno Ípola. El Visión. torturado (subfinalmente posto à disposição do ppN no dia 12 de abril.mudou-separao Chile.

. ibid. Para 10. do qual j á fazem parte. 7. Ni Planeta."Introducción" (1959) aMaxWeber. rr4-u9j El político y eI cien- l. 9. montagem: Alejandra Almirón. 4.Ibìd. 17 0."La apariencia celebrada". cit.p. charly García evirus. assis- n-4 tentes de direção: Santiago Giralt e Marcelo Zanelli. 187. numa palavra. Fernando. ibid. p. Hijos de desaparecidos. cit. oP. 2. 128 . Carlos Altamir ãno. StanfordUniversityPress. Madri.P'9a. 1 9. emPunto deVisfa' no de2004. 15. L9 67. op. produção: Barry Ellsworth.. James E.2L 8. i997' eI flaco per' dón de dios. trilha sonora: dezi cãmerat carmen Ryuichi sakamoto.] mas provém do desejo da segunda geração de conhecer o passado dos pais. intérprete: 78' abril 12.. In Editions de Minuit' 2003. oP. 128. Citado em Gelman e La Madrid.oP. oP' cit.92.mistura da estética de quadrinhos com elementos vindos da tradiSo modernista.. Um relato histórico qúe teve divulgação maciça e forte poder de construção imaginária e política a$oiou-se em obras e inteffenções de autores contemporâneos do primeiro peronismo. p. ages malgré tou'. 2003...p. como Rodolfo Fuiggrós.p' 65' 14. 3 8. som: |ésica suárez.p. tífco. Labatalla delasideas. antecedentes conceituais. OfeÌia. op. A. cit.. p. vejam-se. Didi-Huberman. 3. Young. ]orge Abelardo seus Ramos.. RaymondAron. Miguel DaÌmaroni. Hirsch. I6.28. Darío. 6. María Laura e Wieviorka. Arturo |auretche e Juan José Hernández Arregui.244. Georges cit'.BtenosAires. 17 menGuarini. queiram ou não: é um proj eto de aproximação mimética do trauma histórico e pessoal que liga vários níveis de tempo" (Present pasts. 123' Silvia (Córdoba)' ib íd. op.. 2003.. Patricia. 6.r27). Martín Kohan. Silvinai em ]uan Gelman e Mara La Madrid.19-32' Tâmbém o fìlme Hfos' de Caribià'' P. 5. Paris.P. argentino -mexicana.Direção: Albertina carri. p. Victoria. 136. (La histo ri a e s ésfrL documenI 3.pp.p.Stanford. 49. p.. ebeattiz Saflo.. op' cit'. fotoFfìa: CataÌina Fern:ínTorres.Young. desenho de produAaalía Couceyro' BuenosAires' 2003' ção: PaoÌa Pelzmajer. cit. cít. ibid. P.P' a9' Gelman e La Madrid. no 96. a"complexidade de sua narração não é só um procedimento estético [. urbanpalimpsests andthepolitics of mernory. "La moral de la historia: Novelas argentinas sobre la dictadura'l Hiqp am é ricq ano wxrr. arÉrr oe rxprnrÊNcrA Ipp.P'66. Nìanza. 18. James E. Los rubios. vinte anos tário de )orge Denti). 71.